A multiplicação das cotas

A COMISSÃO de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados deu um passo temerário ao aprovar, sem passar pelo plenário, projeto que reserva 10% das vagas em universidades públicas -inclusive as estaduais e municipais- para portadores de deficiência. A deliberação tem caráter conclusivo, e a matéria, que abrange também escolas de ensino médio, será agora examinada pelo Senado.

O percentual fixado para a nova cota parece arbitrário, antes de tudo. O projeto original previa 5%, mas a reserva foi duplicada na Comissão de Educação.

Segundo o IBGE, 14,5% da população apresenta algum tipo de deficiência, num conceito mais amplo que o da incapacitação para o trabalho. Este deve ser o critério para identificar os beneficiários dessa forma de ação afirmativa: incapacidade atestada por laudos de médicos credenciados pelo poder público.

Já existe no país uma cota para portadores de deficiência no mercado de trabalho. Empresas com mais de cem funcionários estão obrigadas a destinar-lhes 2% a 5% de suas vagas. Faria mais sentido que a regra para universidades se mantivesse dentro desses padrões.

O projeto padece ainda de um defeito comum, a tentativa de aplicar norma única para realidades diversas. O perfil e a proporção da deficiência física podem variar de região para região. Além disso, a lei colide com a autonomia universitária.

Há por fim que considerar outro projeto de lei já aprovado na Câmara, ora em exame pelo Senado, que destina 50% das vagas em universidades federais a alunos da rede pública. Somadas as cotas, 60% das vagas de universidades federais ficariam engessadas e alijadas da seleção pelo estrito mérito acadêmico, que precisa ser preservado como principal requisito para dar acesso ao ensino público de nível superior.

Folha de São Paulo, 01.05