Analise: MP de Bolsonaro sobre reitores pressiona volta às aulas e fere autonomia de universidades – Por Mozart Neves Ramos

Não é de agora que o Governo Bolsonaro tenta intervir na autonomia das instituições federais de ensino superior (IFES). No fim do ano passado, editou Medida Provisória (MP), alterando o peso dos três seguimentos (professores, alunos e funcionários) que elegem os candidatos a reitor, vice-reitor e diretores dos centros acadêmicos quando da consulta à comunidade acadêmica. E mais grave: deixou explícito que não respeitaria necessariamente o resultado desta consulta em termos do candidato mais votado.

Fui reitor eleito e reeleito da Universidade Federal de Pernambuco, nos períodos de 1996 a 1999 e de 1999 a 2003. Aprendi que autonomia casa com legitimidade. E sem esta última, pouco ou nada se pode fazer. A primeira coisa de um líder universitário é ter o respeito da sua comunidade.

Aproveitando a pandemia, o Governo Bolsonaro, edita mais uma MP proibindo as IFES de realizar processos de seleção para a escolha de reitores e vice-reitores por meio virtuais. Estima-se que 16 instituições serão afetadas por essa MP, com destaque para a federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Estima-se também que esta MP deve vigorar por 60 dias, prorrogáveis por mais 60.

É não só um mecanismo de pressão para que as instituições retornem às atividades presenciais em plena pandemia, mas também uma afronta direta ao artigo 207 da Constituição Federal, que prevê a autonomia das universidades federais. Pelo visto, o Governo Bolsonaro não quer mesmo construir uma agenda positiva com as IFES. Quem perde é o País, especialmente num momento em que mais precisamos da ciência, da tecnologia e da inovação para a soberania do Brasil.

*Mozart Neves Ramos, é titular da cátedra Sérgio Henrique Ferreira, da USP Ribeirão Preto.

*Artigo originalmente publicado no Jornal Estado de São Paulo.