Depois da greve

Radicais perdem na USP; não há crise aguda na instituição, e sim males crônicos, como o modo de financiar suas despesas

Chegou ao fim a greve parcial da USP. Anteontem, funcionários e professores, que paralisaram apenas algumas unidades da instituição, decidiram voltar às aulas sem que suas principais reivindicações houvessem sido atendidas. Pediam, por exemplo, reajuste de 16%, mas obtiveram apenas o que lhes era oferecido desde o início: 6%.

Apesar do previsível desfecho, a reitora Suely Vilela não pode se proclamar vitoriosa. Teve sua capacidade de liderança e de gerenciar conflitos internos questionada por parte da comunidade acadêmica, e não apenas pelos defensores da paralisação.

O movimento seguiu o roteiro desgastado de outras greves. Foi iniciado por uma minoria que faz do radicalismo seu principal instrumento de pressão. A nota positiva é que atingiu níveis inéditos a repulsa explícita, por parte de estudantes e professores da própria USP, aos métodos desse pequeno grupo truculento, o principal derrotado no processo.

O auge dos protestos ocorreu no início do mês passado, quando a polícia foi chamada para evitar o bloqueio do acesso a prédios e proteger o patrimônio da universidade e entrou em lamentável confronto com manifestantes. A partir dali, muito se debateu sobre a situação da universidade, e o diagnóstico de que a instituição passava por uma grave crise não resistiu aos fatos.

Entre 2005 e 2008, a USP viu seu orçamento aumentar 38%, mais que o dobro da inflação apurada no período. Sua posição de liderança absoluta na produção científica brasileira tampouco foi afetada.

Se não há mal agudo, há problemas crônicos. Mesmo com o aumento constante do orçamento, a USP é uma máquina asfixiada pelo pagamento de salários. A folha de pessoal, ativo e inativo, absorve 87% de sua verba. Sobra quase nada para investimentos, e o reitor tem pouco a administrar, além da escassez.

As principais prejudicadas são as unidades com menor capacidade de buscar recursos de fontes financiadoras fora do governo estadual. É preciso que a USP, em seu conjunto, encontre uma solução para diminuir essa desigualdade, mas sem que, para tanto, saque ainda mais recursos do contribuinte paulista.

Durante a greve discutiu-se muito a suposta falta de representatividade da reitora, eleita por um colégio numericamente restrito, com peso determinante para professores titulares. Esse, no entanto, não é o ponto principal. O fundamental numa direção universitária -como o demonstram os exemplos de prestigiosas instituições internacionais- é a sua capacidade de administrar um corpo científico-burocrático de alto nível.

O reitor, portanto, precisa ser eficiente no que faz. Não tem de ser necessariamente "representativo" do corpo docente e discente -os cidadãos paulistas, vale lembrar, são mantenedores da USP e, se representatividade fosse critério obrigatório para a escolha do reitor, deveriam ter peso preponderante no processo.

O fato é que o atual modelo de escolha do reitor da USP não assegura que esse requisito básico para o cargo, a aptidão para tarefas administrativas numa grande instituição acadêmica de excelência, será privilegiado ao final.

Folha de São Paulo, 02/07