Falta mão de obra especializada para o pré-sal

Governo e empresas correm contra o tempo para formar 285 mil trabalhadores, do nível básico ao superior, em cinco anos

BRASÍLIA. As dificuldades técnicas e políticas de se concluir e aprovar os três projetos do marco regulatório da exploração do petróleo da camada do pré-sal não são os únicos obstáculos à transformação do Brasil em grande produtor mundial.

Governo, Petrobras e demais empresas do setor estão correndo contra o tempo para sanar um dos mais expressivos gargalos que devem surgir nos próximos anos: a falta de mão de obra técnica para transformar esse sonho em óleo. Estimativas do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp) apontam que a demanda por trabalhadores especializados continuará em ritmo crescente e será preciso qualificar 285 mil pessoas nos próximos cinco anos.

Parte desse pessoal já está empregada, mas uma boa parcela será contratada no futuro.

Esses números, porém, devem ser revistos, pois fundamentamse exclusivamente na estimativa de produção dos próximos cinco anos. À medida que a exploração do pré-sal for deslanchando, a demanda do setor por profissionais provavelmente crescerá.

O Plano Decenal de Energia 2008-2017, lançado no início de agosto, adverte que “haverá um vertiginoso crescimento da demanda por profissionais, de nível básico, técnico e superior, para atender projetos de construção de equipamentos de exploração e produção”.

Um dos principais problemas é a falta de mão de obra técnica básica. Para contornar essa situação estão sendo destinados R$ 14,1 milhões, só este ano, para cursos de qualificação de pessoal de construção civil em nove estados, apenas com foco na ampliação e modernização de refinarias da Petrobras. São 18.120 vagas em todo o país.

O maior volume de trabalhadores a serem qualificados (5.920) será no Rio, onde se constrói o Complexo Petroquímico (Comperj) e será modernizada a Refinaria Duque de Caxias (Reduc).

— Não há mão de obra qualificada para atender às demandas do setor de petróleo, principalmente eletricistas e mestres de obra — admite o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, que garante que o trabalho de qualificação será permanente nos próximos anos.

Programa de formação prevê pagamento de bolsa Para a qualificação de construção civil, que são cursos de nível básico, foi realizada uma parceria entre o Prominp e o Ministério do Trabalho, que tem um programa de inserção de trabalhadores desempregados, o Plano Setorial de Qualificação (PlanSeq). Em agosto começou um amplo programa de seleção para atender a esse pessoal, nas áreas de construção e montagem, construção civil e manutenção da operação.

— O Prominp precisa de gente e equipamentos, e qualificar profissional. Fornecimento de material e equipamentos — diz o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, que destaca algumas das vantagens dos cursos que serão oferecidos: — A pessoa estuda de graça e ainda recebe uma bolsa de R$ 300 para nível básico, de R$ 600 para nível médio e de R$ 900 para nível superior. Treina para ser mecânico, engenheiro disso e daquilo, gerente disso e daquilo. A Petrobras é a que mais gasta nesse programa, mas também tem o FAT (Fundo de Amparo do Trabalhador) e o Fundo Social de Petróleo e Gás, do Ministério da Ciência e Tecnologia — lembra Lobão.

Além disso, a preocupação são os estados do Nordeste, onde devem ser construídas refinarias em Pernambuco, Maranhão e Ceará. Na região, inexistem profissionais com experiência nesse tipo de empreitada.

Segundo dados do Prominp, serão treinadas 5.500 pessoas até o ano que vem para exercer profissões como as de carpinteiro, pedreiro e pintor.

Os técnicos do Prominp, porém, depararam-se com outro problema. Uma parcela das vagas não chegou a ser preenchida por falta de profissionais com os requisitos mínimos de escolaridade. Por isso, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) está promovendo cursos de reforço escolar para elevar a aprovação da mão de obra local no processo seletivo.

Serão dadas aulas de Português, Matemática e Raciocínio Lógico em 12 estados, para formar 40 mil pessoas.

— Infelizmente nosso sistema educacional foi falho nos últimos anos. A qualidade do ensino ficou aquém do necessário — diz Ronaldo Coutinho, secretário de Políticas Públicas de Emprego do MDS.

A necessidade de evitar a evasão desses profissionais forçou a abertura de uma brecha nas regras. Foi eliminada a exigência de experiência mínima para fazer os cursos.

O trabalhador poderá frequentar as aulas sem saber quase nada — terá aulas práticas durante o período de aperfeiçoamento.

Mão de obra também atenderá do PAC à Copa Na Bahia, o MDS, numa parceria com o governo do estado, realizou um projeto-piloto nas cidades de Maragojipe, Laura de Freitas e Salvador.

O reforço escolar foi voltado especificamente para beneficiários do programa Bolsa Família, com o objetivo de aumentar a chance de qualificação e perspectiva de geração de emprego e renda.

— A Petrobras e as empresas de construção civil estão se antecipando a uma demanda que vai ficar cada vez maior — diz o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (Cbic), Paulo Safady Simão, que lembra que o setor vai ter de gerar mão de obra para atender também aos programas Minha Casa, Minha Vida e de Aceleração do Crescimento (PAC), bem como às obras para a Copa do Mundo.

O horizonte de qualificação é mais amplo e envolve profissionais de nível médio e superior. No ano que vem, por exemplo, o Prominp vai qualificar seis mil pessoas para trabalhar nas 40 sondas que vão perfurar o pré-sal.

Serão seis centros de treinamento no país, para formar operadores de sonda.

— Se não treinarmos esse pessoal agora, corremos o risco de não ter gente para trabalhar nos próximos anos — alerta José Renato Ferreira de Almeida, coordenador-executivo do Prominp.

Gustavo Paul – O Globo, 16/08