Greve dos professores vira drama de participantes do Enem

Quase 2.000 quilômetros separam o potiguar Pablo Medeiros do mineiro Guilherme Agostinho. Mas uma preocupação toma conta dos dois estudantes, ambos concluintes do ensino médio: a greve prolongada de professores do sistema público em ano de Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Assim como Pablo e Guilherme, milhares de jovens em todo o Brasil estão apreensivos quanto a seu desempenho na prova, que pode garantir uma vaga em uma universidade pública ou assegurar uma bolsa de estudos em uma instituição privada por meio do Programa Universidade para Todos (ProUni).

 

Em Minas Gerais, onde vive Guilherme, a paralisação dos docentes do sistema público estadual durou 113 dias, comprometendo cerca de três meses letivos. O estudante lamenta. “Desde o começo do ano, venho me dedicando ao Enem, mas a greve atingiu em cheio meus planos de conquistar uma vaga na universidade”, conta o aluno da Escola Estadual Darcy Ribeiro, que deseja cursar design na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

 

O governo estadual convocou professores substitutos para minimizar o prejuízo, mas, para Guilherme, não foi suficiente. “Muitos deles não estão acostumados com o ritmo de aula ou são academicamente despreparados para o cargo. Há quase quatro meses, dependo apenas de mim mesmo para estudar”, diz.

 

Camila Diniz, de Belo Horizonte, também sentiu os efeitos da greve. Na Escola Estadual Governador Milton Campos, a paralisação começou em agosto e as aulas só foram retomadas na última semana de setembro. Durante os dois meses, Camila teve que estudar em casa, por conta própria. “Peguei as apostilas de uma irmã mais velha que tinha feito cursinho e tentei me disciplinar para não perder o ritmo de estudo. Além disso, buscava ajuda de amigos que estudam em escolas particulares para tirar dúvidas”, diz. “Mas já considero real a possibilidade de não entrar na universidade neste ano.” Camila disputa uma vaga no curso tecnólogo em radiologia, também na UFMG.

 

Para Maria de Fátima Furlanetti, professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a disciplina de Camila é fundamental para mitigar os efeitos da ausência do professor. “O prejuízo para esses estudantes é, sem dúvida, muito grande. A única forma de minimizar os prejuízos é manter a rotina de estudos em casa ou com a ajuda dos amigos”, diz a especialista. “Quem conseguir manter essa postura se sairá melhor nos processos seletivos.”

 

O governo de Minas já anunciou a reposição das aulas perdidas. Os estudantes terão de enfrentar uma maratona de estudos até março de 2012, para que todo o conteúdo previsto no currículo seja reposto. A Secretaria de Educação já adiantou que até os sábados serão usados para aulas. Isso não animas os vestibulandos. “A matemática não fecha: foram mais de 100 dias em greve e falta menos de uma semana para o Enem”, ressalta Guilherme. Camila não está mais animada. “Além de estudar, eu trabalho. Se as aulas forem respostas fora do horário escolare, não poderei comparecer.”

 

Também em Minas Gerais, na cidade de Salinas, as amigas Lorena Iza e Joelia Alves estão igualmente apreensivas com a proximidade com o Enem. Elas estudam no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais. Por lá, os professores ainda não sinalizaram o fim da paralisação.

 

“Esses dois meses sem aula representam um prejuízo inestimável”, diz Lorena. “Só o fato de estar há 60 dias sem ir à escola já é desesperador. Quando penso que em uma semana farei o Enem, entro em pânico”, relata a estudante, que batalha por uma vaga em medicina na UFMG e na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Joelia, que quer estudar direito, levanta outra dúvida. “Se eu for aprovada em uma universidade, temo não ter o certificado de conclusão do ensino médio em mãos a tempo de efetuar a matrícula.”

 

Em Currais Novos (RN), Pablo Medeiros, estudante do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, buscou uma saída que tem sido escolhida por muitos alunos afetados pela paralisação de mestres. Há mais de dois meses sem aula, ele recorreu a aulas de um cursinho particular. “O conteúdo que preciso revisar para o Enem e os vestibulares é grande. Por isso, eu não podia depender só dos meus próprios estudos, precisava da ajuda de e resolvi me matricular”, diz o potiguar. “Mas tenho amigos que não dispõem desse dinheiro e dependem da retomada das aulas.”

 

Para Isabella Pessanha, estudante do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense, em Campos dos Goytacazes (RJ), as aulas foram retomadas na semana passada, após dois meses de paralisação. “Estudei em casa, mas não é a mesma coisa. Com o professor na sala de aula, é mais fácil tirar dúvidas e absorver o conteúdo”, afirma. “Infelizmente, vou para o Enem com uma defasagem grande.”