Investigação no Cespe: Ex-diretores fora do serviço público

Quatro pessoas que dirigiram o órgão da UnB, entre elas Romilda Macarini, foram condenadas em processos disciplinares por irregularidades

O Ministério da Educação (MEC) e a Controladoria Geral da União (CGU) expulsaram do serviço público quatro ex-diretores do Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe), vinculado à Universidade de Brasília (UnB). Dois ainda tiveram maior penalidade, não podendo mais ocupar cargo algum na administração do Estado. É o caso de Romilda Macarini, que teve a exoneração convertida em destituição por improbidade administrativa. A conclusão do processo disciplinar contra ela é contundente. Foi expulsa “por não manter conduta compatível com a moralidade pública, por valer-se do cargo para lograr proveito próprio. E facilitado para que terceiros se enriquecessem ilicitamente”, aponta a decisão publicada no Diário Oficial da União, anteontem (leia fac-símile).

Os processos disciplinares foram abertos em decorrência da Operação Campus Limpo, deflagrada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público para apurar denúncias de irregularidades, entre 2001 e 2005, no Cespe. Segundo a CGU, o montante de gastos indevidos na gestão de Romilda chegou a R$ 200 milhões. Ela era a diretora-geral do Cespe no período investigado. Outra ex-diretora-geral, Créa Antônia de Almeida recebeu a mesma punição. As duas não eram concursadas, apenas exerciam função comissionada — estavam em cargos de confiança indicados pelos ex-reitores Lauro Morhy e Timothy Mulholland.

Augusto Pinto da Silva Neto e Raimundo Cosmo de Lima Filho, servidores concursados da UnB, foram demitidos. Perderam seus direitos como funcionários públicos, mas não estão impedidos de retornar por convite para assumir cargo de confiança ou por novo concurso. A punição foi mais branda, porque a comissão disciplinar avaliou que eles não estavam ligados diretamente às práticas de corrupção, mas teriam sido omissos. Todos já estão fora do Cespe.

Os processos foram iniciados em 2008 com base nas denúncias do MP, da PF e análises da CGU. A Comissão Disciplinar foi composta por servidores da Controladoria Geral da União e o parecer deles foi acompanhado pelo Ministério da Educação. Contra Romilda e Créa pesou a constatação de pagamentos a empresas tercerizadas sem amparo legal e burla de licitação. Segundo a comissão, Romilda recebeu remuneração indevida, beneficiou parentes, realizou pagamentos sem critérios legais ou técnicos a pessoas físicas com ausência de comprovantes. O relatório da CGU foi encaminhado ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério Público Federal e ainda poderá resultar em diversas ações judiciais.

Passada a crise da Operação Campus Limpo e também o escândalo da Máfia dos Concursos, o Cespe se reestruturou e está sob novo comando. Não há mais funcionários ligados à gestão anterior. O Correio não localizou os quatro ex-diretores. Ainda cabe recurso da decisão.

Habeas corpus para ex-reitor
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) concedeu ontem um habeas corpus a Timothy Mulholland, ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), ao determinar que sejam retirada as alegações que foram inseridas no processo após o contato da defesa. Mulholland foi denunciado pelo Ministério Público Federal em 2008 por um suposto desvio de verbas da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec). Ele é acusado de gastar quase R$ 500 mil em móveis de luxo com preço acima do mercado para decoração do apartamento funcional que ocupava enquanto era reitor da UnB. Os bens do ex-reitor permanecem bloqueados.

Entenda o caso
Denúncia de desvios

O Ministério Público Federal apresentou denuncia à Justiça em setembro de 2008 por desvios de dinheiro. Nela, Romilda Macarini estava entre os acusados de irregularidades na gestão de recursos de um convênio entre a UnB e o INSS. Um dos resultados da Operação Campus Limpo, realizada pela Polícia Federal e pelo MP. Houve busca e apreensão na casa dos dirigentes do Cespe.

As investigações começaram em 2005 quando houve a primeira operação dentro do Cespe e da UnB (foto) para apurar crime de não recolhimento de contribuições previdenciárias. Após a análise dos documentos coletados com autorização judicial, surgiram indícios de mais irregularidades, igualmente graves, que se referiam a contratos, licitações, despesas e atos administrativos. Com isso, foi aberta outra vertente de investigação. Os indícios foram confirmados e reforçados por relatório preliminar da CGU, que apontava crimes contra a administração pública praticados pelo Cespe, conforme revelou reportagem do Correio, em outubro do 2008, do jornalista Renato Alves.

Mauro Rabelo isento de punição

O então diretor acadêmico do Cespe, Mauro Luiz Rabelo, foi o único da direção envolvido no caso a não ser condenado no processo disciplinar. Rabelo receberia uma advertência ou afastamento temporário, mas tal sanção prescreve em dois anos a contar do fato denunciado. Por isso, no Diário Oficial, o Ministério da Educação declarou “extinta a punibilidade” de Rabelo.

Entre 2003 e 2005, Rabelo foi responsável pela elaboração, revisão e impressão das provas aplicadas pelo Cespe. Em 2006, assumiu a direção-geral do Cespe, sucedendo Romilda. Mas saiu desgastado com as irregularidades cometidas na gestão dela, a quem esteve subordinado quando era diretor acadêmico. A Comissão Disciplinar formada pela CGU e pelo MEC avaliaram que Rabelo não teve participação direta em atos de corrupção, mas que teria cometido falhas administrativas ao não impedir a realização de procedimentos indevidos.

Rabelo afirma que não tinha conhecimento algum das irregularidades administrativas. “Não era a minha área. Eu ficava concentrado na elaboração das provas”, disse ao Correio. Rabelo sentiu-se “aliviado” com a decisão do MEC, apesar de avaliar que não haveria motivo nem para sofrer uma advertência. “Sofri muito com toda essa situação. Me senti injustiçado. Meu trabalho sempre foi pautado pela correção. Trabalhava de domingo a domingo”. Rabello é professor do Departamento de Matemática da UnB, o que ele pretende continuar sendo, sem querer ocupar cargos semelhantes ao do Cespe. “A cicatriz deixada é profunda. Mas fiquei feliz com as manifestações de apoio que recebi com a publicação da decisão”, desabafou. (SS)

Samanta Sallum – Correio Braziliense, 03/02