Projeto que trata de crimes eletrônicos pode comprometer desempenho das universidades

A Câmara dos Deputados realizou na quinta-feira, 13, audiência pública sobre a tipificação de crimes e delitos cometidos na área de informática, para debate e análise do Projeto de Lei nº 84/1999 (PLC 89 de 2003, no senado). Organizada pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, a audiência reuniu representantes e especialistas dos setores da sociedade envolvidos com tecnologia de informação e segurança pública.

Foram convidados a participar dos debates o Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, Fernando Botelho, o delegado da Unidade de Repressão a Crimes Cibernéticos da Polícia Federal, Carlos Sobral, o representante da comunidade Software Livre, professor Sérgio Amadeu, o diretor-presidente da Abranet, Eduardo Parajo, professores e pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas e o advogado especialista na área, Renato Opice.

O Projeto de Lei 84/1999 trata da tipificação e punição dos crimes de informática, ou seja, as condutas mediante uso de sistema eletrônico, digital ou similares, de rede de computadores, ou que sejam praticadas contra rede de computadores, dispositivos de comunicação ou sistemas informatizados. O projeto define crimes como o roubo de senha pessoal, a difusão de vírus e o acesso não-autorizado a qualquer tipo de informação por meio da internet.

O projeto estabelece mudanças no Código Penal, acrescentando 11 crimes. Também altera o Código Penal Militar, incluindo mais 9 tipificações. Além disso, estabelece regras para o combate ao racismo e à pedofilia eletrônica. Há também definições penais dos elementos eletrônicos e dos aspectos processuais e administrativos.

O grande questionamento levantado pelos debatedores é de como disciplinar a conduta criminal na internet, sem comprometer o ambiente de liberdade de comunicação e informação proporcionada pelo meio. Ao mesmo tempo deve-se garantir a eficiência dos instrumentos e procedimentos de investigação dos crimes cibernéticos.

Avaliação do impacto do projeto nas universidades

Um estudo da Andifes avalia o impacto desse projeto de lei nas instituições de educação e pesquisa, considerando que há pontos críticos que poderão comprometer a produção científica e tecnológica de universidades, centros de pesquisas, agências de fomento e museus entre outras organizações ligadas à educação e pesquisa. Atualmente a produção acadêmica está baseada em tecnologia da informação e comunicação.

Do ponto de vista da Associação, o entrave do projeto se concentra no artigo 22, quando este estabelece que o responsável pelo provimento de acesso a rede de computadores mundial, inclusive do setor público fica obrigado a uma série de procedimentos.

Dentre as obrigações do administrador está a de realizar denúncia sigilosa direta, à autoridade competente, de atos criminosos que tenham ocorrido no âmbito da rede de sua responsabilidade, além de sujeição à multas que variam de R$ 2.000,00 a R$ 100.000,00. Isso poderá comprometer o ambiente de colaboração institucional e coloca em risco a privacidade das informações de alunos, professores e gestores. Além de atribuir ao administrador o papel de delator.

Dentre outros pontos questionados está a identificação compulsória de acessos e o controle central. Na avaliação da Andifes, esses procedimentos irão prejudicar o caráter inovador das universidades. A imprecisão das regras propostas para a coleta de informações, presente no artigo 22, também gera controvérsias. Não estão previstos os tipos de informações que deverão ser entregues em possíveis investigações. Desse modo o administrador da rede não tem como assegurar que irá poder fornecer a informação solicitada, correndo o risco de violar as garantias fundamentas da privacidade e da liberdade de comunicação.

A proposta dos deputados e especialistas é que o debate seja ampliado e que o texto seja revisto, para que não haja restrição de liberdade, nem prejuízo a entidades empresariais e públicas na responsabilização de crimes, que atualmente se configuram como procedimentos corriqueiros dos usuários. Na opinião dos participantes, a definição dos crimes está muito ampla. Além disso, há receio que a lei dificulte a implantação de projetos de inclusão digital.

Tramitação do projeto

De autoria do ex-deputado Luiz Piauhylino, o PL 84/99 foi aprovado pela Câmara e enviado ao Senado, que o aprovou na forma de substitutivo do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e o devolveu à Câmara. Agora o projeto está sendo analisado pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Mas o PL pode ser votado pelo Plenário a qualquer momento, pois tramita em regime de urgência. Como veio do Senado, o projeto não pode ser modificado. Os deputados podem apenas aceitar ou rejeitar o que foi incluído na proposta pelos senadores.