Taxa de analfabetismo recua pouco no país

Índice caiu de 9,9% para 9,8% entre 2007 e 2008; em números absolutos, total de analfabetos adultos subiu de 14,14 mi para 14,25 mi

Entre os dados positivos, IBGE registrou queda no percentual de jovens de 15 a 17 anos fora da escola, que recuou de 17,9% para 15,9%

Nos indicadores da educação, um dado do IBGE destoa das boas notícias econômicas: a taxa de analfabetismo recuou só 0,1 ponto percentual na comparação entre 2007 e 2008.

Os dados mostram que chegou até mesmo a haver um pequeno aumento no número absoluto de analfabetos adultos, que passou de 14,136 milhões para 14,247 milhões, mas, como a população de 15 anos ou mais aumentou, a taxa acabou caindo 0,1 ponto.

Em compensação, a pesquisa registrou avanço em uma taxa que há cinco anos dava sinais preocupantes de estagnação: o percentual de jovens de 15 a 17 anos fora da escola, que caiu de 17,9% para 15,9%.

Analisando a série histórica da taxa de analfabetismo, se percebe que o Brasil não consegue mais reduzi-la no mesmo ritmo da década passada. De 1992 a 1999, a proporção de adultos analfabetos caiu de 17,2% para 13,3%, redução de 3,9 pontos percentuais em sete anos. De 2001 para 2008, o recuo foi menor: 2,5 pontos percentuais, de 12,3% para 9,8%.

Um dos maiores entraves para a redução do analfabetismo é que ele se concentra nas populações mais velhas, já que entre 15 e 24 anos, o percentual de analfabetos é de apenas 2,2%.

Como os idosos estão vivendo mais, a redução do analfabetismo entre crianças tem tido impacto menor na taxa total. Outra explicação para essa queda lenta é que, apesar das campanhas lançadas pelo governo para reduzir o analfabetismo adulto, os programas não conseguem atrair para a sala de aula essa população mais velha.

Prova disso é que a Pnad mostra que apenas 3% dos analfabetos diziam estar frequentando uma sala de aula em 2008.

Bolsa Família
O ministro da Educação, Fernando Haddad, comemorou os resultados de aumento da escolarização divulgado pelo IBGE, mas reconheceu que os dados de analfabetismo preocupam.

"Precisaremos analisar melhor a Pnad para entender por que houve esse aumento no número absoluto de analfabetos. Por se tratar de uma pesquisa amostral, não se pode descartar que isso seja resultado de algum ajuste estatístico. Não dá para entender como o número de analfabetos aumenta na população de 25 anos ou mais se os dados mostram que as gerações mais jovens têm taxa bem menor", afirmou Haddad.

No caso da queda na taxa de jovens fora da escola, Haddad comemorou a notícia porque, segundo ele, esse segmento populacional é o mais difícil de ser atraído para a escola. "No caso dos jovens, não basta construir escolas. É preciso torná-la atraente, e os dados indicam um movimento positivo de volta à sala de aula."

Ele também disse que pode haver relação entre a ampliação do Bolsa Família e o aumento de matrículas entre os jovens de 15 a 17 anos. Em março do ano passado, as famílias inscritas no programa federal passaram a receber R$ 33 por filho dentro dessa faixa etária matriculado na rede de ensino. O benefício é válido por até dois jovens por família.

"O Bolsa Família, tendo sido estendido para a faixa de 15 a 17 anos, pode ter repercutido na melhoria do atendimento. O aluno volta à escola porque, caso contrário, perde o benefício", afirmou o ministro.

Analfabetismo funcional pode ser conceito traiçoeiro

Embora muitos educadores prefiram trabalhar hoje com a noção de analfabetismo funcional, em vez do mais academicista analfabetismo absoluto, o conceito pode ser traiçoeiro, em especial se utilizado em comparações internacionais.

Depois de 20 anos de ásperos debates ideológicos, a Unesco decidiu em 1978 reformular sua definição, passando a considerar funcionalmente alfabetizado o indivíduo inserido de forma adequada em seu meio e que é capaz de desempenhar tarefas em que a leitura, a escrita e o cálculo são usados para o seu próprio desenvolvimento e o de sua comunidade.

No papel faz sentido, mas, como o leitor já deve ter antevisto, medir esse tipo de coisa em censos não é trivial. A "solução" encontrada foi utilizar substitutos mais objetivos, como os anos de instrução formal.

O problema é que, como a definição pressupõe a boa integração da pessoa a seu meio e esta varia de acordo com nacionalidade, classe social etc., não se estabeleceu nenhum critério uniforme. Enquanto o IBGE considera analfabetos funcionais os brasileiros maiores de 15 anos com menos de quatro anos de estudo, o Canadá exige nove anos de escolaridade.

Nos EUA, o Departamento de Educação desenvolveu um método mais preciso. Ele criou um teste que mensura a capacidade de compreensão do indivíduo em três níveis -textos em prosa, documentos (mapas, tabelas) e cálculos- e o submete a amostras representativas da população. Por esse sistema, os índices de analfabetismo funcional dos EUA para 2003 são 14% (prosa), 12% (documentos) e 22% (cálculo).

Assim, embora os 21% de analfabetos funcionais registrados no Brasil não pareçam um escândalo diante dos números dos EUA -nação bem mais rica e educada-, é preciso ter em mente que estamos comparando coisas bem diferentes. Pelos critérios norte-americanos, só 13% da população é proficiente nas três áreas.

Hélio Schwartsman

 

Folha de São Paulo, 19/09