UFFS analisa situação hídrica da região de Chapecó

 

A região de Chapecó vive uma situação crítica em relação ao abastecimento de água potável, devido, principalmente, ao baixo nível de precipitação pluviométrica registrado nas últimas semanas. Dois professores do Campus Chapecó da Universidade Federal da Fronteira Sul, Fernando Grison e Aline de Almeida Mota, desenvolvem estudos a respeito da situação hídrica na região, no âmbito do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária.

Seguem as considerações dos professores:

Atualmente, está em andamento alguma pesquisa institucional envolvendo a situação dos recursos hídricos na região de Chapecó?

Fernando Grison – Sim. Atualmente, estamos no início de um projeto intitulado “Conservação de água e solo na região Oeste de Santa Catarina”, que tem por objetivo geral “avaliar processos hidrológicos e tecnologias no intuito de promover a conservação de água e solo na região Oeste de Santa Catarina”. O projeto é coordenado pela professora Aline de Almeida Mota e tem a minha colaboração e do professor Mauro Leandro Menegotto.

Aline Mota – Vinculados ao projeto referido anteriormente, existem outros subprojetos que estão em desenvolvimento. Um deles é o projeto “Interceptação da água da chuva em remanescente de floresta ombrófila mista e floresta plantada de eucalipto”, que tem como objetivo caracterizar a interceptação da água no processo hidrológico no qual obstáculos presentes na superfície terrestre interferem no seu trajeto, quando precipitada, antes dela alcançar o solo em floresta nativa e plantada de eucaliptos. Assim, ao final do projeto, esperamos ser capazes de prever como essas duas formações vegetais influenciam na quantidade de água que chega ao solo e, portanto, poderá escoar até o rio, afetando a disponibilidade hídrica no manancial superficial. Nesse projeto participam 4 estudantes (1 bolsista, 2 voluntários, 1 projeto de TCC) e 2 docentes (professores Fernando Grison e Aline de Almeida Mota).

Outro projeto no qual colaboro, intitulado “Avaliação de revestimento de talude com geossintéticos para controle de erosão”, está sob coordenação do professor Mauro Menegotto e tem como objetivo avaliar o desempenho do revestimento de taludes de solo residual de basalto com diferentes materiais geossintéticos frente à erosão superficial ao longo do tempo. Medidas estruturais no sentido de evitar a erosão e aumentar a infiltração de água no solo são fundamentais para contribuir com o armazenamento de água na bacia hidrográfica, bem como com a diminuição do assoreamento em reservatórios e mananciais superficiais. Então, entende-se que os resultados do projeto também poderão subsidiar as decisões e projetos para garantia de disponibilidade hídrica na nossa região. Nesse projeto estão envolvidos 1 professor e 1 bolsista.

Também estou orientando uma aluna do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária em seu projeto de TCC. A pesquisa dela poderá contribuir com a melhoria da qualidade dos projetos de captação e armazenamento de água da chuva na nossa região. O objetivo é elaborar modelos que subsidiem a adoção do coeficiente de escoamento superficial dos telhados mais adequado para projetos de captação da água de chuva em telhados cerâmicos.

E sobre o Lageado São José, que abastece Chapecó, algum estudo específico em andamento?

Fernando – Envolvendo o Lajeado São José, orientei o TCC de Mateus Luis Debastiani (ex-aluno do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da UFFS- Campus Chapecó) intitulado  “Estudo da evolução temporal do coeficiente de deflúvio no município de Chapecó (SC)”, o trabalho aborda a drenagem urbana . Esse coeficiente mostra a influência da impermeabilização da área urbana na infiltração de água no solo. O trabalho teve por objetivo analisar a evolução do coeficiente de deflúvio no município de Chapecó entre os anos de 1986 a 2014, e a relação desse coeficiente com o processo de urbanização em três bacias hidrográficas onde o município está inserido, sendo a Bacia do Lageado São José uma delas. A análise evidenciou que a urbanização interfere significativamente no aumento do coeficiente de deflúvio, acarretando impactos significativos no armazenamento de água nas bacias hidrográficas onde o município está inserido.

Aline – Orientei alguns TCCs que têm relação com o manejo de recursos hídricos e, por consequência, com o abastecimento de água em Chapecó. A seguir, descrevo um pouco melhor dois trabalhos elaborados a partir desses TCCs e publicados em revistas.

Nesse trabalho foi feito o mapeamento da vulnerabilidade, do perigo e do risco de contaminação do sistema aquífero Serra Geral (SASG) no município de Chapecó, por meio da aplicação dos métodos GOD, POSH e cruzamento de mapas, respectivamente, viabilizando o planejamento territorial sustentável.

As águas subterrâneas são utilizadas para diversos fins no município de Chapecó, incluindo abastecimento doméstico, industrial, animal, na irrigação e em atividades de lazer. Sendo essa exploração quase que totalmente no SASG. Então, é fundamental ter um planejamento adequado para perfuração de novos poços e proteção de áreas onde o risco de contaminação do aquífero é mais alto. Entre os resultados do trabalho, concluímos que, apesar de o SASG no município de Chapecó possuir, predominantemente, baixa vulnerabilidade à contaminação, ou seja, ter boas condições naturais de proteção relativas, principalmente, ao confinamento e à profundidade, o risco de contaminação é alto, devido às atividades antrópicas realizadas.

Assim, é fundamental que a ocupação do município de Chapecó seja planejada, para que os riscos de contaminação não se elevem. “Para isso, recomenda-se que as novas instalações de fontes potencialmente poluidoras, ou seja, atividades que apresentem algum tipo de perigo de contaminação do aquífero, como é o caso de novas indústrias, sejam feitas com atenção ao mapa de vulnerabilidade do SASG de Chapecó (SC), sendo que devem ser localizadas preferencialmente nas áreas de baixa vulnerabilidade, evitando áreas de média e alta vulnerabilidade”.

Nesse estudo aplicamos a equação universal de perda de solo (USLE) para avaliar o potencial atual de produção de sedimentos da bacia hidrográfica do Lajeado São José, principal manancial de abastecimento de Chapecó-SC, e a influência, em um horizonte de 30 anos, de alterações no uso do solo da bacia permitidas pelas diretrizes do Plano Diretor do Município de Chapecó. A estimativa média de produção de sedimento para a bacia em 2016 foi estimada em 3,88 t.ha-1.ano-1, o que equivale a aproximadamente 25 mil toneladas de sedimento por mês na bacia.

Esse tipo de estimativa é fundamental, pois o sedimento produzido pode chegar aos rios e reservatórios de água, ocasionando assoreamento.

Como os efeitos de períodos de estiagem podem ser amenizados?

Fernando – Os efeitos de uma estiagem podem ser amenizados por um conjunto de alternativas. Podem ser feitas obras para preservação da água do rio, manutenção dos reservatórios (incluindo dragagem), desenvolvimento de projetos para melhorar a infiltração e o armazenamento da água na bacia hidrográfica (rural e urbana), campanhas de educação ambiental para conscientização sobre racionamento de água pela comunidade, entre outras.

Recentemente, temos observado nas calçadas das ruas de Chapecó a construção de pequenas áreas com gramado que podem servir como um espaço para ajudar na infiltração da água, minimizando o impacto da impermeabilização do solo na cidade. Porém, é preciso projetá-los como estruturas que potencializem a infiltração e armazenamento da água como, por exemplo, as trincheiras de infiltração. Nesse sentido, várias outras medidas sustentáveis podem ser desenvolvidas na área urbana para proporcionar o armazenamento de água e minimizar futuros períodos de estiagem, seguindo o conceito das “cidades-esponjas”. Essas cidades buscam o desenvolvimento urbano sustentável, incluindo controle de enchentes e alagamentos urbanos, conservação de água, reutilização da água da chuva, melhoria da qualidade da água e proteção natural do ecossistema.

É preciso ressaltar que, do ponto de vista do gerenciamento dos recursos hídricos, todas essas alternativas precisam ser desenvolvidas com base em estudos técnico-científicos. Então, o primeiro passo é a instalação de um sistema de monitoramento hidrológico nas bacias hidrográficas, para a formação de um banco de dados hidrológicos, principalmente dados de chuva e de vazão dos rios. Somente com essas informações é possível o desenvolvimento de projetos adequados na gestão da água nas bacias hidrográficas.

Também é preciso ressaltar que as atividades antrópicas, nas mais diversas formas de uso e ocupação, têm sido consideradas como o principal fator da degradação ambiental sobre a água e solo. Os cursos d’água das bacias hidrográficas refletem os impactos do uso e ocupação dos solos pelas atividades humanas, incluindo a diminuição da quantidade de água e a degradação da qualidade da água dos rios. Por isso, no meu entendimento, é urgente que a comunidade entenda um pouco mais sobre a dinâmica da água na natureza. Só assim, poderemos ter a contribuição de todos os habitantes na preservação da água e minimização dos problemas de estiagem.

Aline – O manejo dos recursos hídricos deve compreender diversas atividades distribuídas, principalmente, em duas frentes: racionalização do consumo e manutenção da disponibilidade nos mananciais.

No sentido de otimizar o consumo, as atividades devem compreender educação ambiental da comunidade e setor industrial para valorizarem a água e utilizarem com consciência. E no segundo aspecto, entendo que as principais medidas para o município de Chapecó avançar na solução do problema que enfrentamos seria investimento em armazenamento de água na bacia, incluindo captação e uso de água da chuva nas edificações, manutenção e criação de áreas que favoreçam a infiltração e permanência da água no solo e aquíferos.

 

Como o problema é complexo, as medidas devem ser tomadas conjuntamente para terem efetividade.

Outra forma de colaboração dos docentes da UFFS nos estudos relacionados à situação dos recursos hídricos na região é a participação no Comitê da Bacia Hidrográfica (CBH) dos rios Chapecó/Irani e contíguos, órgão deliberativo e consultivo de gerenciamento das águas nessa Bacia. No momento, a UFFS tem representação com os professores Fernando Grison e Larissa de Lima Trindade.

Conforme Trindade, “os CBHs têm um papel muito importante nas discussões e na proposição de melhorias da gestão hídrica, principalmente pela representatividade que possuem e devem, entre outras ações, arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos, inclusive em casos de estiagem, como a que a RH2 (Região Hidrográfica dos Rios Chapecó e Irani) vem enfrentado. Com esse intuito, o CBH criou uma câmara técnica permanente para discutir a estiagem na RH2, que conta com diversos membros. Seu objetivo principal é acompanhar e propor estratégicas para minimizarmos o efeito da estiagem na região. Trata-se de um trabalho contínuo e que poderá repercutir não somente quando da falta de água potável, mas também para conscientizar a todos da importância de economizar e reter a água, mesmo em tempos de abundância”.

De acordo ainda com Larissa, “todas as universidades da região tem uma cadeira no Comitê, especialmente porque é no ambiente das universidades que são desenvolvidas pesquisa, inovação, ensino e extensão sobre o assunto. Trata-se de uma maneira de aproximar a academia e a ciência da sociedade. Muitos dos projetos que são operacionalizados para melhorar a qualidade, a quantidade e a gestão das águas são desenvolvidos nas universidades, inclusive na UFFS. Temos projetos no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), em fundações, redes e em outras agências de fomento que acreditam na pesquisa e financiam diversos projetos dentro das diversas regiões hídricas do Estado. Por isso, a UFFS tem sempre professores de diversas áreas do conhecimento auxiliando nos CBHs, e essa participação deve ser potencializada com a participação e colaboração de mais colegas dentro do CBH. Precisamos compartilhar com todos o que pode, o que é feito e como podemos melhorar a gestão das águas na nossa cidade e região, e o Comitê nos ajuda nesse compartilhamento