MEC estuda novas mudanças na divulgação do Enem por Escola

Em entrevista ao iG, Malvina Tuttman avalia avanço no processo e anuncia criação de rede de universidades para acompanhar exame

Malvina Tuttman, ex-reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, assumiu o órgão responsável pela maior avaliação do País em um momento delicado. No ano passado, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi alvo de polêmicas judiciais, erros de aplicação e críticas da sociedade.

À frente do Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) desde o começo do ano, Malvina buscou apoio de seus pares – reitores de outras federais, que agora farão parte de uma rede para avaliar os processos de aplicação de exames do órgão –, criou fóruns para ouvir reivindicações dos servidores – que culminarão em uma reestruturação do órgão – e acaba de mudar a divulgação das notas do Enem por escola.“

A proposta da professora, que é pedagoga de formação, era evitar a criação de rankings entre os colégios. Por isso, eles foram agrupados por faixas de estudantes participantes das provas. Em entrevista exclusiva ao iG, ela afirmou que a mudança já foi um avanço e anunciou que os servidores estudam novas formas na divulgação, para tentar refinar ainda mais esses resultados.

Durante a conversa, Malvina admitiu que o Inep deve respostas à sociedade, como a interpretação das notas do novo Enem – ninguém sabe quanto significa tirar uma nota 500, por exemplo, em termos de conhecimento – e a distribuição de boletins pedagógicos com o desempenho detalhado dos alunos nas provas às escolas. Ela promete que os dados estarão disponíveis logo. Mas não há datas precisas para tanto.

Malvina Tuttman afirma que Inep estuda novas modificações para divulgar resultados do Enem e evitar rankings

iG: Malvina, o Inep mudou a divulgação dos resultados do Enem por escola para tentar evitar a elaboração de rankings. Eles foram feitos mesmo assim e a rede privada ganhou destaque, enquanto a pública continuou excluída. Foi melhor divulgar assim e por quê?

Malvina Tuttman: Os servidores do Inep querem estudar e aprofundar outras formas de apresentar os dados do Enem, mas eu considero que esse foi avanço significativo. Há muitas análises de estudiosos referendando que não se deve avaliar uma escola apenas por um instrumento, por mais qualificado que ele seja.

iG: Pode-se afirmar que, no caso das escolas que tiveram mais de 75% de alunos participantes, o retrato do desempenho é mais fiel?

Malvina: Existem outras variáveis que influenciam a decisão dos candidatos em participar. O caráter é voluntário. Não temos grupo amostral no Enem. Precisamos conhecer essa amostra e o Inep possui indicações de linhas de pesquisas para interpretar esses resultados.

iG: Há ainda uma grande diferença de participação no Enem entre os estudantes de escolas públicas e privadas. A senhora acredita que é difícil mobilizá-los para participar do exame?

Malvina: Há hipóteses, que precisam ser investigadas. As pessoas precisam acreditar nelas mesmas e, por outro lado, algumas podem não se estimular porque os pais não têm essa escolaridade, outras não têm pretensões de continuar os estudos.

iG: Há especialistas que atribuem à falta de professores, às greves e às diferenças de condições de ensino entre públicas e privadas o desânimo desses alunos. Com várias greves em andamento, o Inep espera desistências de parte dos 5,4 milhões de inscritos nos dias das provas do Enem 2011?

Malvina: Não temos essa expectativa. Esse é um exame que articula conhecimentos de quatro áreas e da redação com o cotidiano e a realidade dos jovens. Claro que é um direito dos estudantes aprender todo o conteúdo previsto e eles são importantes para o Enem, mas pela própria estrutura das provas, ele não precisa só dos conteúdos para fazer o exame. Ele precisa de outras habilidades.

iG: Malvina, a senhora havia dito que as escolas, após a divulgação dos resultados do Enem 2010, deveriam se comparar a elas mesmas. As escolas vão receber relatórios com detalhes do desempenho delas nesse Enem? Há previsão de data para isso?

Malvina: Vão receber em breve, mas não há como precisar data. Isso é importantíssimo. A avaliação só tem real sentido quando a comunidade escolar percebe o esforço que fez e o que precisa fazer para se superar e melhorar sua proposta pedagógica.

iG: O Inep ainda deve à sociedade uma interpretação da escala do Enem para que as pessoas entendam o que significa uma nota 500, por exemplo. O ministro Fernando Haddad disse que 600 seria a média dos países desenvolvidos. Quando esses números serão explicados?

Malvina: Essa é uma das nossas primeiras metas agora e está em estudo. Agora que podemos comparar dois anos, podemos interpretar essa escala. Isso não havia sido feito ainda porque não era possível. Vamos fazer uma força-tarefa para isso, em parceria com universidades e institutos de pesquisa, inclusive, mas não temos uma data para divulgação ainda. Mas nos interessa ter esses resultados o mais rápido possível.

iG: Por falar nisso, a senhora havia dito ao assumir o Inep que gostaria de fortalecer as pesquisas, que haviam ficado de lado no instituto. Como está esse projeto?

Malvina: Nesse momento, temos cerca de 170 pesquisas sendo realizadas com o apoio do Inep e vamos fortalecer outras. Essa é uma segunda fase do nosso trabalho aqui. No primeiro momento, eu precisava conhecer melhor o Inep e vice-versa. Eu priorizo gestões participativas e realizamos um fórum para conhecer as ideias dos servidores para o futuro do instituto. Ouvimos mais de 400 funcionários, elaboramos um projeto que será examinado em um segundo fórum para definirmos uma reestruturação do órgão, em novembro. Queremos apresentar ao ministro uma proposta de reestruturação que atenda aos princípios do instituto.

iG: E como estão as parcerias entre o Inep e as universidades, outras meta da senhora quando assumiu o cargo?

Malvina: Fizemos uma chamada pública para que as universidades pudessem elaborar itens para o Enem e isso será estendido aos outros exames. Antes, cada professor se apresentava individualmente e, agora, temos a chancela da instituição e dividimos essa responsabilidade com elas. Além disso, vamos criar uma rede com as universidades para utilizar a experiência delas na aplicação de exames, como já fizemos solicitando a elas o banco de aplicadores de vestibulares para serem aproveitados pelo Cespe e pela Cesgranrio no Enem, mas iremos além. Vamos criar uma rede nacional de acompanhamento de todos os nossos exames com o apoio dessas instituições. Ainda vamos definir como essa rede vai funcionar, mas queremos que as universidades acompanhem todos os processos, desde a distribuição das provas nas escolas até a volta delas ao consórcio. Queremos a análise crítica dos processos. Isso será um avanço.

iG: Além das universidades, o Inmetro e a empresa Módulo também foram contratadas para acompanhar esse processo. Os estudantes podem esperar uma edição mais tranquila este ano?

Malvina: Eu acredito nisso. O Enem é um instrumento importante para democratização do acesso ao ensino superior. Alguns obstáculos foram detectados, todos os cuidados estão sendo tomados para que eles não existam mais, mas tenho consciência de que outros podem vir. Estamos preparados para esses desafios.