A Crise Financeira e a Educação no Brasil

Por Maria Clotilde Lemos Petta*

Em geral, as crises financeiras – como a que está ocorrendo atualmente – propiciam oportunidades de mudanças. Essas mudanças tanto podem apontar no sentido da melhoria das condições de vida dos trabalhadores, como aprofundar ainda mais as grandes desigualdades sociais, características da sociedade capitalista. Face ao equilíbrio de forças existentes na atual conjuntura, e dependendo dos fins políticos com que a capacidade de intervenção do Estado for usada, o resultado poderá, sim, ser de regressões nos direitos e nas conquistas dos trabalhadores.

No Brasil, os defensores da velha cantilena neoliberal, no Congresso Nacional e na mídia, se apressam em defender medidas como a ampliação do superávit primário, alta de juros, mais liberdade e privilégios para o capital estrangeiro e corte dos investimentos e gastos públicos. Ressalvando, é claro, os recursos públicos para “salvar” as empresas atingidas pela crise.

Setores do governo já acenam com a possibilidade de redução de gastos públicos, colocando na pauta a possibilidade da revisão da proposta orçamentária para 2009, que tramita no Congresso. Neste contexto, considerando o descaso histórico com a Educação em nosso País, corremos por certo o sério risco de cortes de verbas nesta área de importância estratégica para o projeto de desenvolvimento nacional.

Em comparação com outros países, incluindo os da América Latina, o Brasil apresenta um atraso histórico na área educacional, tanto no que se refere à constituição de um Sistema Nacional de Educação, como no acesso e qualidade do ensino oferecido. Apesar do aporte recente de recursos para o setor educacional anunciado pelo governo federal, objetivado por programas como o Fundeb, o Reuni e, principalmente, o Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE), a situação em que se encontra a educação brasileira de acordo com os padrões internacionais demonstra que, contrariando o discurso dominante, no Brasil a Educação ainda não é considerada prioridade.

Segundo o estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) direcionado para o setor, o Education at a Glance 2007, o Brasil é um dos países que menos investe na área. O relatório, porém, não inclui as nações mais pobres do mundo, que não fazem parte da Organização. Apesar de subir em relação a 2000, o volume de recursos do PIB (Produto Interno Bruto) aplicados em educação pelo país em 2004, quando os dados foram apurados, fazia do Brasil o antepenúltimo entre os 36 países pesquisados, com 3,9%. Na ocasião, o País ficou em último lugar em outros dois aspectos importantes: o valor investido anualmente por aluno dos três níveis de ensino (fundamental, médio e superior) – US$1.303 – e a porcentagem da população entre 25 e 64 anos que completou o ensino superior, então, apenas 8%. Enquanto alguns dos países da OCDE com melhor desempenho no relatório investiam cerca de 20% do seu PIB per capita em cada aluno matriculado no período de um ano, a média brasileira, no ano de 2004, era de 13%.

Ainda que a divulgação de que o investimento público em educação tenha subido de 3,9%, em 2004, para 4,4% do PIB, em 2006 – como divulgou recentemente o Ministro da Educação, Fernando Haddad, os indicadores educacionais ainda atestam as péssimas condições da educação brasileira comparadas às de outros países e refletem também a forma como essa situação afeta o projeto de desenvolvimento do País a médio e longo prazos.

Segundo Haddad, o País, com a dívida educacional que tem, não pode se conformar com esse nível de investimento. “Neste sentido, o PDE deve agregar investimento em educação, como contrapartida federal, mas Estados e Municípios também precisam participar deste mesmo esforço para que possamos chegar a um patamar de sustentabilidade da reforma educacional", acredita o Ministro. Ele defende que a ampliação do percentual de investimento em educação deva atingir 6% do PIB.

Frente a isso, a notícia de que a equipe econômica do governo Lula teria pedido a parlamentares da base governista para segurar a tramitação da proposta de Emenda Constitucional que terminaria gradualmente com a Desvinculação da Receitas da União (DRU) na área da educação causou muita apreensão. A DRU, instituída pelo Governo FHC em 1995, permite à União usar como quiser os 20% de impostos e contribuições vinculados por lei a áreas como saúde e educação. O recurso já desviou, desde sua implantação, quase 100 bilhões de reais da educação.

O fim da DRU representaria cerca de R$2 bilhões a mais no orçamento de 2009 – recursos que poderiam ser usados no Plano de Desenvolvimento Econômico (PDE). Embora insuficiente, devido à gravidade da situação da educação no Brasil, essa verba possibilitaria uma avanço significativo na questão do investimento. Portanto, é inadmissível o questionamento de seu fim.

Nesse sentido, as entidades nacionais da educação estão em mobilização por meio do lançamento da campanha: “Educação é Prioridade, sempre”, que tem o objetivo de cobrar dos gestores públicos o compromisso de assegurar as verbas necessárias para a educação. Isso significa a imediata aprovação da PEC 96/03, em tramitação na Câmara dos Deputados, que trata da regressividade da DRU e significa também mais investimentos no setor de forma geral, a fim de atingir o patamar mínimo de 7% do PIB – contrapondo-se ao veto ao Plano Nacional de Educação – PNE.

Esta Campanha se insere no movimento em defesa da educação, pela participação dos trabalhadores na gestão do Estado, com a ampliação dos canais democráticos na formulação de políticas públicas. Não podemos admitir que áreas de essencial importância tenham seus recursos diminuídos. Ao contrário, a atual crise deve propiciar, por meio de um processo de revisão ampla do papel do Estado, o estabelecimento, ainda que tardio, da educação como fator estratégico para um projeto de desenvolvimento nacional. E, sendo assim, cabe aos movimentos sociais, às centrais sindicais e às entidades educacionais o protagonismo nesta luta.

*Maria Clotilde Lemos Petta é Secretária de Comunicação Social da CONTEE