A educação entre o MEC e o MCT

Transferir o ensino superior para a pasta de Ciência enfatiza a preparação só para o mundo do trabalho, em detrimento da política, da filosofia e das artes

O senador Cristovam Buarque é autor de um projeto que propõe a transferência das instituições federais de ensino superior do Ministério da Educação (MEC) para o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). As justificativas apresentadas pressupõem vantagens em direcionar o foco do MEC para a educação básica. O MCT ficaria responsável por gerir o ensino superior.

Segundo o autor, a mudança produziria um desejável equilíbrio entre o MEC e o MCT em termos de importância orçamentária e de estruturas administrativas. Ele afirma ainda que não existiriam gastos públicos adicionais, bastando remanejar funcionários entre os dois ministérios já existentes.

A proposta foi discutida e amplamente rejeitada pelos participantes do seminário “Ciência e tecnologia no século 21”, que foi realizado em Brasília, em novembro. O Sindicato Nacional dos Docentes de Ensino Superior (Andes-SN), que organizou o evento, também já havia analisado o projeto e levantado várias objeções.

A nosso ver, o espírito do projeto reflete uma concepção estreita da educação. Ela enfatiza a preparação do homem para o mundo do trabalho, em detrimento de outras dimensões da vida.

Assim, se for aprovado, o projeto irá contribuir para ampliar o já grande viés tecnológico das universidades brasileiras. Por causa dele, estão sendo formados profissionais de nível superior que são até competentes tecnicamente, mas que, em geral, têm formação ruim em outros campos do saber, como a política, a filosofia e as artes.

Esse tipo de “carência educacional” faz com que a contribuição da tecnologia para o desenvolvimento econômico seja anulada pela deficiência ética de engenheiros, médicos, políticos e até mesmo professores e magistrados -os juízes que vendem sentenças também saíram das melhores universidades e passaram em disputadíssimos concursos públicos.

Uma das funções mais importantes que as universidades brasileiras podem exercer é formar docentes qualificados para os ensinos médio e fundamental. Será que tal função seria mais bem exercida se ela estivesse sob responsabilidade do MCT?

Por último, cabe lembrar que onde não há boa educação não pode haver boa ciência e tecnologia. Que país hoje bem servido em ciência e tecnologia não priorizou antes a educação e a cultura?

O que é preciso para colocar o país na rota do desenvolvimento, como muita gente abalizada sabe, é uma revolução na educação. É assim que se acaba promovendo a ciência e a tecnologia.

Mas, para isso, é preciso implantar algo que nunca existiu no Brasil: um sistema de planejamento integrado dos três níveis de ensino, distribuídos entre os entes federativos de acordo com os dispositivos constitucionais vigentes, mas sob a coordenação e a rigorosa supervisão do governo central. Não é “esvaziando” o MEC que se vai chegar lá, muito pelo contrário.

José Maria Alves da Silva, 59, é doutor em economia e professor da Universidade Federal de Viçosa