Alunos e instituições se queixam de falhas em financiamento estudantil

Estudantes afirmam que estão sendo obrigados pelas universidades a pagar a mensalidade integral porque elas alegam que não têm recebido o valor acertado com o governo federal; Ministério da Educação diz que problemas no novo Fies são pontuais

Estudantes e instituições de ensino superior estão enfrentando problemas com o novo Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). Os casos mais graves são de alunos participantes do programa que têm sido obrigados a pagar as mensalidades do curso porque as instituições alegam que não recebem os títulos acertados com o Ministério da Educação (MEC). Para o MEC, os problemas são pontuais.

O Fies é um programa do governo federal criado em 1999 para financiar a graduação de alunos em faculdades particulares, em parceria com a Caixa Econômica Federal. Para se candidatar, o estudante deve estar regularmente matriculado em um curso com avaliação positiva pelo governo, de uma instituição que participe do programa. Em troca do financiamento ao aluno, as faculdades recebem do governo títulos que podem ser usados para abater impostos.

Um documento do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), obtido pelo Estado, reúne uma série de dificuldades enfrentadas pelas faculdades para oferecer o financiamento. Segundo o Semesp, cerca de 1.250 instituições foram afetadas por problemas do novo Fies – o programa foi modificado neste ano (mais informações nesta página).

O relatório do sindicato foi enviado ao MEC no dia 4 de agosto. No texto, o Semesp afirma que, além dos quatro meses de atraso para abertura do sistema do Fies, o número de reclamações tem sido tão alto que foi organizado um seminário para esclarecer as dúvidas do setor. Entre os problemas estão dificuldades no atendimento do telefone 0800 do MEC; problemas para salvar e enviar documentação; instituições inativas que constam no sistema; alunos que perdem o período de rematrícula semestral por conta de obstáculos sistêmicos; e agências bancárias que desconhecem o processo.

“São, basicamente, problemas de tecnologia da informação e de pessoal mesmo, porque a Caixa não sabe informar sobre as mudanças no programa”, afirma o diretor executivo do Semesp, Rodrigo Capelato. “As instituições não receberam os títulos desde o começo do ano, quando tudo mudou. Assim como aconteceu com o Enem, o MEC faz a propaganda do programa, mas, na prática, ele não funciona.”

O MEC nega que o sistema do Fies esteja com problemas. “Emitimos R$ 235 milhões em títulos no início do mês. Eles já estão em mãos. Pode ocorrer um ou outro problema em determinados cursos que não se encaixam, mas isso é de responsabilidade da faculdade”, diz José Henrique Paim, secretário executivo do MEC. “Não há nenhum problema generalizado.”

Segundo o ministério, até agora foram computados 43 mil contratos em 726 mantenedoras, que estão operando normalmente o sistema. O MEC afirma que a instituição não pode de forma alguma impedir que um aluno do Fies faça sua rematrícula. Procurada pela reportagem, a Caixa afirma que quem responde pelo Fies é o MEC.

Dificuldades. O estudante Luiz Fernando Nanô, de 19 anos, é um dos prejudicados. Por conta de problemas nos sistemas de informação da Caixa, ele não conseguiu efetivar seu contrato de rematrícula no curso de Relações Internacionais da PUC-SP.

“Fui ao banco com minha fiadora diversas vezes e em todas elas deu algum tipo de problema. Com isso, o documento que comprova que estou apto a entrar no Fies venceu e agora não consigo renovar a matrícula”, afirma ele, que está no primeiro ano do curso e tinha financiamento de 100%. Seu pai, o produtor cultural Paulo Nanô, de 56 anos, está pedindo dinheiro emprestado a parentes para Luiz Fernando não perder a vaga. “É uma situação constrangedora. Ninguém sabe informar nada.”

Segundo a PUC-SP, a Caixa informa quem concluiu o processo e qual o porcentual de bolsa. E também afirma que não cobra mensalidade integral de indicados como bolsistas.

F. B., de 19 anos, passa por problema parecido com o de Luís Fernando. Ela estuda medicina em uma universidade particular na zonal sul de São Paulo e participa do programa com financiamento de 50%.

No entanto, desde junho sua mãe tem efetuado o pagamento da mensalidade integral, de R$ 4,2 mil, porque a instituição afirma que não recebeu os títulos do MEC e, portanto, deve cobrar o valor total. “A gente não tem a quem recorrer”, lamenta a dona de casa R. B., de 55 anos.

Magnitude
1.250 – instituições foram afetadas por problemas no novo Fies, segundo o Semesp

150 mil – é o número estimado pelo Semesp de estudantes que estão no programa

3,4% – é a taxa de juros cobrada pelo programa após as mudanças anunciadas neste ano

43 mil – contratos do novo Fies foram firmados em 2 meses de abertura do programa, segundo o MEC

32 mil – contratos foram realizados no ano passado

PARA ENTENDER
Novas regras são deste ano

De acordo com as novas regras do Fies, publicadas neste ano, quem se candidatar ao programa terá de participar do Enem. O prazo para quitar o financiamento aumentou para três vezes a duração do curso, em prestações fixas. A taxa de juros caiu de 6,5% para 3,4% ao ano. O aluno pode solicitar o Fies a qualquer época, já que agora o programa tem fluxo contínuo. Dois tipos de fiadores serão aceitos: a fiança tradicional e a fiança solidária.

O MEC anunciou que o Fies seria operado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e não mais pela Caixa Econômica Federal.