Andifes realiza análise da conjuntura política e econômica em seminário com representantes de diferentes setores

Como já ocorre anualmente, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) promoveu um debate sobre as perspectivas políticas e econômicas para 2018. Para tanto, reuniu o colegiado das universidades federais brasileiras, representantes do Ministério da Fazenda, Universidade de Campinas (Unicamp), Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), da Gradual Investimentos e convidados.

De acordo com o presidente da associação, reitor Emmanuel Tourinho (UFPA), as exposições de diferentes visões produziram um rico conteúdo e diretrizes sobre o enfrentamento dos desafios que o Brasil ainda terá nesse e nos próximos anos.

O secretário de Acompanhamento Econômico (SEAE), do Ministério da Fazenda, Mansueto Almeida Júnior apresentou uma análise do Brasil no médio e longo prazo. Ao afirmar que o País está saindo da grave recessão enfrentada nos últimos dois anos, ele citou sérios desafios que irão definir o Brasil dos próximos 40 anos. “Acabamos de sair de uma grande recessão.

Mansueto frisou a capacidade de recuperação brasileira, com base no que ele chama de estado de bem-estar social. “Nenhum outro país na América latina ou qualquer outro país emergente tem a rede de assistência social que o Brasil criou, e que permite que a gente passe por uma crise tão séria sem precisar enfrentar nenhum grande conflito social. Para mensurar o tamanho dessa rede tão ampla, posso dizer que o Brasil investe 26% do PIB nessa rede, sendo 5,5% para educação; 4,5% para saúde pública 4,5%, 13% para a previdência, 0,8 % para a LOAS e 0,5% para o Bolsa Família.”

O secretário afirmou, ainda, que o País vai passar por uma “mudança radical” na estrutura demográfica nos próximos anos. “O cenário demográfico brasileiro está se tornando semelhante ao do Japão. A população vai envelhecer e, em determinado período, os idosos serão uma parcela muito grande dos brasileiros. Naturalmente, teremos elevação dos custos com previdência e com saúde e redução da produção e do crescimento. Hoje, o Japão tem ¼ de idosos, e o Brasil já gasta mais PIB com previdência do que os japoneses.”

Para o professor da Unicamp, Mariano Laplane, é possível ter uma percepção de que “aos pouquinhos, estamos saindo da crise”. Ele elencou sinais que considera positivos, como “a previsão de crescimento do PIB de 2,5 a 3,5 para 2018; a produção industrial voltando a subir; e, nos setores que ainda estamos caindo, a queda está mais lenta. Além disso, o investimento começou a crescer, ainda que de forma modesta, no final de 2017.”

O professor ainda explicou que, como em períodos de crise as pessoas diminuem as aquisições para conseguir manter o compromisso com as despesas, levando à recessão. Algumas ações contribuíram para o País começar a sair da crise. “A liberação do FGTS e do PIS, que estimulou um pouco o consumo das famílias sem onerar as contas fiscais, são mecanismos que indiretamente ajudaram o Tesouro e a reativação da economia. Houve cinco refinanciamentos das dívidas tributárias: para municípios – e ainda bem que houve, pois estavam à beira de um colapso, empresas, produtores rurais, a isenção para participantes de leilões, como o do pré-sal, e, ainda renúncias fiscais, como cobrança de dívidas.”

Laplane ainda disse estar otimista de que, nos próximos três a cinco anos, o Brasil terá uma trajetória de recuperação com crescimento, e destacou que as universidades têm um papel fundamental para que isso ocorra. “O Brasil tem, seguramente, capacidade de se recuperar. A gente não pode se acomodar nessa situação, e as universidades são muito importantes nesse processo. É importante ter inteligência para levar adiante esse debate. As universidades federais são as poucas instituições que têm legitimidade, e até obrigação, para dar continuidade a esse debate. Certamente, serão questionadas e enfrentarão um campo de batalha. Mas, a solução não virá dos economistas, do Estado, do Governo, do Congresso e muito menos da Justiça. A solução precisa vir da sociedade civil.”

Para o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, a discussão deve focar em por que o Brasil viveu dois anos de recessão? “Há duas crises simultâneas para enfrentarmos em 2018. Uma é a das eleições. As pesquisas mostram que a população não quer mais reformas, por vários motivos. Seja porque não tenham sido perfeitamente comunicadas, seja porque está insegura. 2018 não será um ano fácil. A aparente estabilidade internacional causa muita preocupação, pois, historicamente, esses períodos são sucedidos por turbulências.”

André destaca que, como consequência da estabilidade econômica, trazida pelo Plano Real, os salários tiveram ganho, e isso levou ao aumento do custo das empresas. “O setor financeiro brasileiro tem o papel importante de organizar a relação entre poupança e investimento, mas ainda não aprendeu a ganhar dinheiro com baixas taxas de juros, como ocorre no mundo todo.”

De acordo com o diretor-executivo do IEDI, Júlio Gomes de Almeida, em tempo recorde, irá acabar o formato atual de emprego. “Junto com a reforma trabalhista, teremos uma revolução tecnológica, que será impactante na saúde, educação, nos bens capitais e serviços. Não sabemos a que nível de desorganização vamos chegar. Só temos certeza de uma coisa: será tudo em tempo histórico, instantâneo.”

Júlio manifestou preocupação com as instituições e defendeu incentivo à pesquisa e à inovação. “O tripé para garantir o futuro está pedindo socorro: universidades, pesquisa e inovação. Tudo isso precisa ser aperfeiçoado. O Governo precisa fazer um esforço grande e dedicar energia para preservar esses setores. Não se pode desistir do incentivo à inovação. Eu gostaria de ver o BNDES abrindo um pouco mais a perspectiva das empresas, do agronegócio e das novas tecnologias”, idealizou.

O diretor-técnico do DIEESE, Clemente Ganz Lúcio, acredita que “2018 será um ano para nós não nos esquecermos”. “O Brasil vive um cenário de crescimento da intolerância social, não há clima político para o diálogo. Para termos um padrão de desenvolvimento compatível com a necessidade de entrega de condições para perseguir qualidade de vida à sociedade, nós precisaríamos crescer 5%, por 15 anos, seguidamente.”

Assim como o diretor do IEDI, Clemente afirma há um processo global de mudança no mundo do trabalho. “Vivemos algo que desconhecemos. Uma coisa é enfrentar a inovação tecnológica nos anos 90. Outra coisa é mudar o padrão de 70% do emprego formal e informal. Nós vamos observar isso em várias frentes, inclusive na saúde, na educação e no serviço. Não estamos falando de uma tecnologia que substitui um braço, mas da substituição da cabeça, do pensamento e da criação. A mudança é profunda.”

Além disso, o diretor comentou a recente reforma trabalhista, considerada por ele a mais profunda já realizada desde a criação da CLT. “Houve uma mudança na estratégia capitalista para garantir segurança jurídica para as empresas, com facilidade para contratar, para demitir e segurança para não acumular passivo trabalhista. Mas foi feita sem o profundo debate, sem que ninguém tivesse profundo conhecimento do texto e do alcance das 300 mudanças que foram feitas.”

Por fim, Clemente defendeu propostas permanentes de modernização do sistema de previdência e seguridade. “O principal problema para a previdência é que essa reforma trabalhista destrói a capacidade de financiamento previdenciário. Esse é o problema de curto prazo e, de médio prazo, a questão demográfica. O país devia ter um conselho nacional de previdência e seguridade social com atribuição permanente de apresentar propostas de modernização do sistema de seguridade e previdência.”