Após nova falha, Inep admite fragilidade de sistema e anuncia auditoria interna

Um dia depois de o “Estado” ter alertado que os dados pessoais dos 12 milhões de inscritos nas últimas três edições do Enem haviam vazado na internet, o presidente do instituto afirma que Polícia Federal só entrará no caso se for constatada má-fé

Um dia depois que o Estado revelou o vazamento de dados pessoais de 12 milhões de inscritos nas últimas três edições do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Joaquim Soares Neto, admitiu que o sistema da instituição tem “fragilidades”.

Mesmo sem informações precisas de como dados dos inscritos como RG, CPF e nome da mãe vazaram no site do Inep, Soares Neto afirmou que só acionará a Polícia Federal se a auditoria interna constatar que houve má-fé. Ontem, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, disse que a PF está à disposição do Ministério da Educação para investigar o vazamento.

O instituto tem enfrentado problemas na organização do Enem desde 2009. Após o vazamento da prova – também revelado pelo Estado – houve problemas na divulgação dos gabaritos e na inscrição para as federais. A avaliação é que a estrutura do Inep não acompanhou a dimensão que o Enem tomou. “Nossa estrutura conceitual era fazer avaliações, mas agora temos esses exames cada vez com mais consequências nas politicas públicas. Minha vinda para o Inep é no sentido de tornamos a estrutura operacional compatível. Isso é um processo”, diz.

O presidente do Inep afirmou que trabalha com a tese de que os endereços eletrônicos estavam no conjunto de informações protegidas, disponíveis a apenas 231 instituições de ensino superior. Entretanto, não pôde confirmar que os links – que não precisavam de senha de acesso – foram retirados do diretório protegido. “O trabalho está sendo feito para levantar todas as possibilidades, mas acreditamos que só poderia ser acessado por senha”, afirmou.

Os links davam acesso aos arquivos com todos os inscritos das edições de 2007, 2008 e 2009. O Inep admite a fragilidade de os endereços não terem senha individualmente.

As listas já estavam fora do ar às 17 horas de terça-feira. Na tarde de ontem, o MEC também bloqueou a opção de acesso à nota dos candidatos por meio dos dados vazados, ao suprimir a ferramenta de recuperação de senha. Agora, se um candidato perder a senha, não consegue recuperá-la.

Além de encontrar as notas dos candidatos no Enem, a divulgação dos dados dava margem a atos criminosos. Com informações pessoais, é possível cometer uma série de crimes – da confecção de documentos falsos à tentativa de abertura de empresas fictícias, contas bancárias e pedidos de financiamento.

O Inep ainda não tem informações de quanto tempo os dados ficaram abertos na internet. Os técnicos de uma escola de ensino básico da Grande São Paulo encontraram os links há cerca de quatro meses, sem a necessidade de senha. A escola alertou a reportagem e pediu anonimato.

O ministro da Educação, Fernando Haddad, não quis comentar os vazamentos e, segundo Soares Neto, pediu apuração dos fatos. Ao ser questionado por que uma instituição precisaria ter acesso à base de dados de todos os inscritos desde 2007, disse que a seleção pelo Enem é complexa e as instituições podem precisar de informações diferenciadas, de acordo com o processo seletivo adotado. “As universidades que usam o Enem como primeira fase podem precisar acessar a base na segunda etapa.” As instituições, porém, só puderam utilizar o Enem como vestibular a partir de 2009.

Os tropeços
23 setembro/2009
Alunos são informados dos locais onde devem fazer a prova do Enem. Há casos em que a distância entre casa e local de prova chega a 50 quilômetros.

1º de outubro/2009
“Estado” revela vazamento da prova do Enem e Ministério da Educação cancela o exame.

7 de outubro/2009
Com o adiamento, USP, Unicamp e outras universidades desistem de usar o Enem como parte de seu processo seletivo.

6 e 7 de dezembro/2009
Estudantes fazem a prova. Inep divulga gabarito errado.

19 de dezembro/2009
Reynaldo Fernandes, presidente do Inep, pede demissão.

29 de janeiro/2010
Congestionamento em site dificulta inscrição de usuários para o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que seleciona candidatos a vagas de institutos e universidades federais.

3 de fevereiro/2010
MEC corrige as notas de 900 estudantes que estavam erradas. Pelo menos três estudantes que não tiveram a nota divulgada ganharam liminares na Justiça para obter vaga.

2 de março/2010
A última etapa de inscrições no Sisu começa com quase metade das vagas ainda disponíveis.

14 de março/2010
Problema técnico no Sisu fez com que estudantes não classificados aparecessem como convocados para matrícula.

3 de agosto/2010
“Estado” mostra que falha no site do Inep permitiu acesso aos dados pessoais de 12 milhões de inscritos nas últimas três edições do Enem.