Aprovar ou ensinar?

O Ministério da Educação acaba de criar o Ciclo de Alfabetização e Letramento, que substitui o sistema de ensino seriado e acaba com a reprovação de alunos nos três primeiros anos do Ensino Fundamental. O objetivo da medida é inquestionavelmente bem-intencionado: evitar que o insucesso escolar nas séries iniciais continue causando evasão e repetência, com os consequentes prejuízos para a autoestima das crianças. De acordo com o governo, a pesquisa que embasa esta decisão mostra que o país teve em 2009 um índice de aprovação de 94,9% no primeiro ano, o que significa a reprovação de cinco em cada grupo de cem alunos. o MEC acredita que a aprovação automática facilitará a alfabetização de todas as crianças até os oito anos de idade.

Não é, ainda, uma obrigatoriedade. As secretarias de Educação e escolas que não quiserem adotar a recomendação poderão continuar com o sistema seriado, que prevê avaliação ao final de cada ano, com a correspondente promoção ou permanência. Está, portanto, oficializada uma grande dúvida no ensino brasileiro: o que é melhor para o aluno que está ingressando no mundo das letras, o avanço automático ou cobrança de rendimento?

Infelizmente, o governo não apresentou argumentos convincentes para a recomendação adotada. Embora seja lamentável a reprovação de 5% dos aproximadamente 10 milhões de alunos que frequentam o primeiro ano do Ensino Fundamental, o levantamento não aponta as causas do insucesso, que podem oscilar da ausência continuada em sala de aula à incompetência da escola para efetivamente ensinar. O que existe de concreto são experiências esparsas de promoção continuada, nem sempre animadoras. Na rede municipal do Rio de Janeiro, por exemplo, a divisão dos nove anos do Ensino Fundamental em três ciclos revelou-se desastrada. Levantamento feito em 2009 mostrou que 13 mil alunos de 4º e 5º anos precisavam ser realfabetizados e outros 17 mil do 6º ano se encontravam na condição de analfabetos funcionais.

Cabe reconhecer, porém, que existem experiências positivas de promoção automática no ensino brasileiro. E também não pode haver dúvida de que reprovar é sempre pior do que aprovar sem o suficiente aprendizado para a promoção, pois esta segunda possibilidade pelo menos mantém a criança na escola por mais tempo. Mas reprovar ou fingir que a criança aprendeu não podem ser as únicas alternativas. O ideal é eliminar a reprovação ensinando efetivamente os alunos, por meio do comprometimento das autoridades e da escola com a educação e com a realidade das crianças, sem salas de aula superlotadas, com professores preparados, bem remunerados e, também eles, avaliados.

Simplesmente eliminar a reprovação pode passar a ideia de que ninguém precisa se esforçar e que o aprendizado chega ao natural. Pode, também, estigmatizar a avaliação como um processo prejudicial e traumatizante, o que não é correto. O desempenho dos alunos, independentemente do sistema adotado, tem que ser avaliado constantemente, para que os professores e a escola saibam quem está ficando para trás e adotem medidas corretivas antes que o problema se torne irreversível.

Não há fórmula mágica em educação. A mágica é ensinar.