Bolsas mais fartas não atraem pós-doc

Governo aumentou valor e quantidade de auxílio à pesquisa no pós-doutorado, mas políticas estão dispersas. Para especialistas, a pesquisa feita nesse nível de formação é a principal responsável pela produção científica.

A formação de 10 mil doutores por ano é vista como uma das principais vitórias do investimento em ciência no Brasil. Mas esse feito pode naufragar sem a fase seguinte: a do pós-doutorado. Para especialistas, os pós-doutores (ou pós-docs, como são conhecidos) são os grandes responsáveis por alavancar a produção científica nos países desenvolvidos. O Brasil, no entanto, ainda não reúne dados oficiais sobre quantos pós-doutores (com ou sem bolsa de agências que financiam pesquisa) circulam por aqui. O que se sabe é que Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) têm juntas 3.237 bolsistas no pós-doutorado espalhados pelo país. Mas a matemática é difícil de fechar. No Brasil, 66% dos doutores titulados em 2006 nos melhores programas de pós-graduação estavam empregados em 2008. Mas tanto esses quanto os 34% que não estavam formalmente trabalhando no período podem estar fazendo pesquisa no pós-doutorado. As políticas de incentivo à formação máxima do pesquisador, como aumento de bolsas de pós-doc e do seu valor mensal, são recentes.

ÍMÃ DE PÓS-DOC – Na Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo), a quantidade de bolsas nessa categoria dobrou entre 2006 e 2010 e o valor mensal é considerado atrativo: R$ 5.028. Capes e CNPq lançaram juntas um programa nacional para incentivar esse nível de formação na pós-graduação em 2007. “Os departamentos das melhores universidades do mundo exigem experiência como pós-doc e contam isso como item importante nos concursos”, analisa Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp. Como alguns concursos públicos no Brasil não pedem que o candidato tenha experiência de pesquisa no pós-doutorado, os candidatos podem acabar seguindo direto do doutorado para o mercado de trabalho. Para o pró-reitor de pós-graduação da USP, Vahan Agopyan, aumentar o número de pesquisadores no pós-doutorado é importante para ter uma ciência competitiva. “O pesquisador deixa de ser estudante e se torna um profissional no pós-doutorado”, afirma Agopyan.

CIÊNCIA PROFISSIONAL – Essa sensação de “profissionalismo” na pesquisa é descrita pela fonoaudióloga Keila Knobel. Ela deixou seu consultório no início do ano para fazer pesquisa no pós-doutorado na Unicamp. Bolsista da Fapesp, ela se dedica exclusivamente às suas atividades de pesquisa. “Hoje sou vista como cientista profissional. Tenho liberdade para escolher meus temas de pesquisa e os congressos dos quais quero participar”, conclui Knobel.