Dilma entre livros e protestos de estudantes

Na Bienal, presidente anuncia incentivo a mercado editorial; alunos e professores de institutos federais pedem verba para educação

Para um anúncio que visava a democratizar o acesso à leitura, nada mais apropriado do que uma manifestação democrática de estudantes. Na cerimônia de abertura da 15ª Bienal do Livro do Rio, realizada ontem, a presidente Dilma Rousseff falou, num auditório fechado, para uma plateia formada basicamente por integrantes do mercado editorial, sobre o programa Livro Popular, uma iniciativa de incentivo à cadeia de produção de livros cuja meta é baratear as publicações. Já do lado de fora, cerca de 400 alunos e professores de institutos federais de ensino (IFEs), em greve nacional desde agosto, se aglomeraram protestando por reajustes salariais para o magistério e por 10% do PIB para a educação. O protesto foi pacífico e não atrapalhou o andamento da Bienal, cujos corredores receberam um bom número de visitantes em seu primeiro dia.

A cerimônia começou às 16h30m, com uma hora de atraso. Os manifestantes se reuniam em frente ao Pavilhão 5 do Riocentro desde as 15h. “Dilma, cadê você? Eu vim aqui só pra te ver!”, gritavam, antes de a presidente chegar. E foram embora sem vê-la: ela falou apenas no discurso de abertura e saiu sem conversar com a imprensa.

Presidente do Snel lembra Lei do Direito Autoral
Com cornetas e cartazes trazendo frases como “Estudantes na rua. Haddad, a culpa é sua” e “Abre o bolso, Dilma”, a manifestação contou também com representantes de sindicatos como o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFF (Sintuff), além de pais de alunos.

– Estamos sem aula desde 15 de agosto, e não acho justo, porque também o governo congelou o salário dos professores. Os alunos se comoveram e a gente decidiu se manifestar – contou Larissa Magalhães, de 15 anos, aluna de ensino médio do IFE de São Gonçalo.

Segundo Pâmella Passos, professora do IFRJ Maracanã e integrante da coordenação da greve dos IFEs, os grevistas exigem 14% de reajuste salarial para professores e técnicos, enquanto o governo decidiu dar 4%, e apenas para os professores. Pouco antes do início da cerimônia, uma comissão de dez manifestantes foi recebida pelo ministro da Educação, Fernando Haddad. O grupo saiu da conversa reclamando:

– Foi só balela. Ele nos recebeu, mas não quis negociar nada — disse Luciana Zaneti, mãe de Pedro, que cursa o 3º ano do ensino fundamental do Pedro II de São Cristóvão.

Na mesa de abertura da Bienal, além de Dilma e Haddad, estiveram o governador do estado do Rio, Sérgio Cabral; a primeira-dama do estado, Adriana Anselmo; o prefeito do Rio, Eduardo Paes; as ministras Ana de Hollanda (Cultura) e Helena Chagas (Secretaria de Comunicação Social); o vice-governador do estado do Rio, Luiz Fernando Pezão; o presidente da Academia Brasileira de Letras, Marcos Vinicios Vilaça; e Sonia Machado Jardim, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livro (SNEL), instituição que organiza a Bienal.

Primeira a discursar, Sonia aproveitou a ocasião para lembrar de dois pontos caros para o setor: a Lei do Direito Autoral, cuja revisão foi interrompida por Ana de Hollanda no início do ano para ajustes; e a Lei das Biografias, que acabaria com a exigência de um autor necessitar da autorização de seu personagem para evitar problemas na Justiça.

– Uma das questões que exige mais atenção no momento é a mudança na Lei do Direito Autoral. Nós observamos a revolução que ocorreu na indústria fonográfica e não podemos ter isso acontecendo nos livros. Apoiamos a ministra Ana de Hollanda em rever as mudanças na lei. A obrigatoriedade da numeração de exemplares, por exemplo, seria bastante onerosa para os livros de papel e impossível de se implantar para os livros digitais – afirmou Sonia. – Outro projeto importante é a Lei das Biografias. Hoje, com a necessidade de aprovação prévia de um biografado ou de seu herdeiro, grandes histórias estão deixando de ser contadas.

Nenhum dos presentes comentou publicamente os projetos abordados por Sonia. Pouco depois, em seu discurso, a presidente Dilma destacou o ambiente de cultura e conhecimento que é a Bienal e falou da necessidade de se baixar o preço dos livros no país. O projeto Livro Popular será lançado oficialmente na semana que vem, com um edital de R$35 milhões para bibliotecas que queiram adquirir obras a um preço de no máximo R$10. A intenção do governo é que editoras e pontos de venda diminuam os preços de olho na possibilidade de venda para as bibliotecas e que isso, por consequência, chegue ao consumidor.

– A história da Bienal parece aquelas histórias infantis. Era uma vez um evento que reunia expositores e que foi crescendo, crescendo e a cada biênio alcança um final feliz. A principal estrela aqui é o livro, esse companheiro extraordinário que nos permite mergulhar no mundo das ideias – disse a presidente. – O acesso ao livro, seja o livro clássico, seja o digital, tem que ser garantido à população. Isso implica em preços adequados para aumentar a circulação e incentivar o mercado. Queremos uma ação que fomente a produção e comercialização de livros baratos. O programa Livro Popular pretende ser um estímulo à toda cadeia, mas sobretudo ao brasileiro que pode amar os livros. Devemos assegurar o acesso para o livro em papel, aquele que de eu mais gosto, e também para os digitais. Estou superando minha barreira em relação a eles.

Haddad: “O que foi possível fazer, nós fizemos”

Mais tarde, o ministro Fernando Haddad participou da palestra “A educação no Brasil” dentro da programação da Bienal. Após o evento, o ministro falou sobre a manifestação dos grevistas, afirmando que “o que foi possível fazer, nós fizemos”:

– Recebi a comissão (de manifestantes), e havia um pouco de desinformação sobre o PL (projeto de lei 2134/2011) que foi enviado ao Congresso na semana passada e que criaria 70 mil cargos por concurso público, e sobre o acordo que o Planejamento fez com os sindicatos de docentes – disse o ministro, ironizando ainda o fato de que o PL geraria críticas. – Você pode anotar que, daqui a poucos dias, haverá pessoas criticando o governo por ter encaminhado um PL com tantos cargos. Vai ter editorial reclamando de inchaço da máquina.