Em trabalho inédito, arquitetos resgatam história das ocupações urbanas no Rio de Janeiro

Durante as décadas de 1980 e 1990, a Região Metropolitana do Rio de Janeiro assistiu ao surgimento de movimentos organizados de ocupação de áreas urbanas que resultariam na formação de bairros populares, hoje integrados à cidade formal. Passadas mais de três décadas desde seu surgimento, essas ocupações ganham, pela primeira vez, um estudo dedicado a suas singularidades, no livro “Barbante, ripas e lutas: ocupações organizadas de terras urbanas no Rio de Janeiro, 1983-1993” (Eduff, 2016, 96p.), dos arquitetos Gerônimo Leitão e Elane Frossard.


No livro, os autores traçam um breve histórico das políticas de habitação no Brasil desde a década de 1960, para então contextualizar o avanço das ocupações urbanas que tiveram início nos anos de 1980, momento pelo qual o país passava por um processo de redemocratização e vivia intensa crise econômica que se traduzia em taxas elevadas de inflação, índices significativos de desemprego e ausência de políticas habitacionais que suprissem as demandas da população mais pobre. Apoiadas pela Igreja Católica e por partidos progressistas, centenas de famílias fugindo do aluguel ou de habitações precárias das favelas buscavam um modelo estruturado de moradia.

A Vila Getúlio Cabral, em Duque de Caxias, e o Parque Esperança, no município do Rio de Janeiro foram selecionados como objetos do estudo da produção informal da moradia no Rio de Janeiro. A escolha dos bairros se deveu a estratégias de organização prévia utilizadas nos dois casos, além do planejamento do uso e ocupação do terreno escolhido, às negociações com o Estado e à implantação da infraestrutura urbana necessária.

De acordo com Gerônimo Leitão, o que chama a atenção nesses movimentos são a organização e o planejamento das ações antes e após as ocupações das áreas. Da escolha do local onde iriam se estabelecer até a infraestrutura de saneamento e o acesso a transporte urbano, cada passo era pensado para a criação de um bairro de fato. “Ao contrário do que ocorria no surgimento das favelas, esses movimentos procuravam criar bairros populares com planejamento prévio no que se refere à configuração do espaço dos lotes, das áreas reservadas à produção de equipamentos urbanos e uma preocupação de integração ao entorno para que não houvesse o estigma de surgimento de uma nova favela, era a luta pela construção de um bairro popular”, explica Leitão, que destaca ainda o que ele aponta como um “construir com as próprias mãos” uma política de habitação, quando o Estado brasileiro era incapaz de apresentar alternativas de acesso à moradia.

“Com este livro, pretendemos trazer a história não escrita desses ?urbanistas? anônimos e daqueles que assumiram, na ausênciado Estado, o papel de protagonistas da construção de uma política de habitação social”, trecho da Introdução de “Barbante, ripas e lutas”