Entidades de classe criticam cursos a distância, e especialistas defendem

Não é porque um curso é a distância que o aluno não põe a mão na massa. Aulas práticas, visitas técnicas e estágios fazem parte do currículo.

A diferença é que, em vez do professor, entram em cena tutores, vídeos e simuladores.

Algumas entidades profissionais questionam essa metodologia em áreas que exigem aprendizado prático.

O Conselho Federal de Enfermagem acaba de fazer um levantamento sobre os polos de ensino a distância do país. Os dados ainda não foram publicados, mas a situação é “seriíssima”, com vários cursos irregulares e polos precários, diz Manoel Carlos Neri, presidente da entidade.

“Esse modelo não é adequado para graduação em áreas de saúde”, afirma Neri.

Mesma opinião têm os educadores físicos. Eles levaram ao MEC (Ministério da Educação) pedido de mudança no ensino a distância. João Batista Tojal, vice-presidente do conselho federal da profissão, diz que a qualificação do corpo docente preocupa.

O MEC afirma em nota que os grandes desafios da modalidade passam por atualização do marco regulatório e “superação do estigma” de que só se aprende com qualidade de modo presencial. Diz ainda não haver limitação de áreas para cursos virtuais e lembra que a regulação de cursos é atribuição exclusiva do governo, cabendo aos conselhos a regulamentação profissional.

O Conselho Federal de Serviço Social também critica o formato virtual. “Somos a favor de ampliar o acesso à educação, mas os cursos devem incluir ensino, pesquisa e extensão. Isso é impossível a distância”, na visão da conselheira Erlenia Sobral.

Menos radical, José Geraldo Baracuhy, do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, diz que na mais recente audiência pública sobre o tema a maioria dos profissionais apoiou a modalidade.

“É algo novo, é natural a resistência. Mas não dá para ser contra, é uma realidade.”

Especialistas reconhecem problemas, mas dizem que o ensino a distância pode, sim, oferecer formação completa.

“Quem é contra pensa que esses cursos não têm aula presencial. Prática é prática, os alunos fazem presencialmente, da mesma forma”, afirma Wagner Corradi, diretor da Universidade Federal de Minas Gerais.

Alunos de engenharia ambiental da Universidade Federal de São Carlos, por exemplo, vão duas vezes ao mês aos laboratórios de física, química e biologia. E têm acesso a jogos e simuladores para praticar em casa.”Não deve nada a uma graduação de excelência presencial”, diz o coordenador Jorge Akutsu.

O curso que ele coordena exige 165 horas de estágio supervisionado. Essa carga horária varia dependendo da área e da instituição.

O curso de enfermagem da Universidade Anhanguera inclui 920 horas de estágio. Há aulas nos polos com bonecos e atividades em postos de saúde e creches, diz a coordenadora Bertha Lúcia Costa Borges. Há tanta aula presencial que os alunos batem cartão cinco vezes por semana.

Mas nem sempre é assim.

Gabriela Ramos, 40, aluna de tecnologia em gastronomia da Universidade Anhembi Morumbi, vai ao campus dois dias por semestre.

No resto do tempo, pratica sozinha. Assiste a vídeos gravados, depois executa os pratos. O processo é fotografado e vira um portfólio usado para avaliar o desempenho.

“Temos que usar dólmã [avental] de chef e fotografar o passo a passo da receita, depois o prato pronto”, diz.

No semestre passado, ela cozinhou 40 receitas. Gastou R$ 3.000 no mercado. “Ainda sai mais barato que o curso presencial: a parcela é menor [R$ 870 ante R$ 2.200].”

JULIANA VINES – COLABORAÇÃO PARA A FOLHA