Hospitais universitários em Minas terão redução de até 19% no orçamento

Os orçamentos dos hospitais universitários mineiros irão sofrer cortes drásticos em 2018, em meio à política de restrição financeira implementada pelo governo federal a partir deste ano com a Emenda Constitucional 55, mais conhecida como a Lei do Teto dos Gastos. De acordo com o Projeto de Lei Orçamentária (LOA) enviado à Câmara, o orçamento do Hospital das Clínicas da UFMG, um dos mais importantes do Estado, com 504 leitos e atendimento prioritário em alta e média complexidade, terá uma queda de 7,51%.

A previsão é a de que o orçamento da unidade de saúde caia de R$ 280,32 milhões, em 2017, para 259,26 milhões, no ano que vem. O valor é o mesmo que foi autorizado para os gastos de 2016. No entanto, de lá pra cá, a inflação acumulada chega a mais de 8%.

O temor dos servidores da instituição é o de que, após um processo de estabilização financeira dos últimos anos, os hospitais universitários restrinjam os atendimentos devido à política de contingenciamento de gastos. “Neste ano, no Hospital das Clínicas, já houve suspensão de cirurgia e fechamento de leitos por falta de recursos”, afirma Cristina del Papa, diretora do Sindicato dos Servidores e Técnicos Administrativos da UFMG.

Além da falta eventual de insumos básicos, como papel, papel toalha e sabonete, servidores afirmam que oito leitos da UTI estão fechados por falta de profissionais suficientes na enfermagem – o que interfere na realização das cirurgias, cujos números caíram em 2017, ante 2016.<EM>

Tesoura

Dentre os hospitais universitários mineiros, a maior tesourada deve ser no orçamento da unidade hospitalar da Universidade Federal de Juiz de Fora, na Zona da Mata. O montante repassado no ano que vem pode ser até 19,12% menor do que o registrado em 2017 – despencando de R$ 70,09 milhões, neste ano, para R$ 56,69 milhões, segundo a proposta do governo.

Também há queda de 1,54% no valor previsto para o Hospital da Federal do Triângulo Mineiro, em Uberaba (de R$ 150 milhões para R$ 147 milhões).

O único reajuste (6%) ficou por conta do Hospital da Federal de Uberlândia, cujo orçamento saltará dos R$ 293 milhões previstos, em 2017, para R$ 311,8 milhões, em 2018.

De acordo com a Lei do Teto, a partir do ano que vem as despesas nas áreas de educação e saúde devem ser corrigidas pela inflação (IPCA). Leva-se em conta o valor registrado entre junho do ano anterior e julho do ano em que o orçamento do ano seguinte é produzido. No caso do orçamento de 2018, por exemplo, deveria ser considerado a inflação de 3,16% registrada entre junho de 2016 e julho de 2018. A regra já estava valendo para outras áreas do governo a partir deste ano.

Pressão da inflação médico-hospitalar é preocupação extra

Um professor da Faculdade de Medicina da UFMG, que atua no hospital e pediu para não ser identificado, afirma que a situação financeira do Hospital das Clínicas está estável, com uma dívida que vem sendo paga de forma administrável. Ele pondera, no entanto, que os índices de inflação médico-hospitalar tendem a ser muito superiores à inflação padrão, o que, com o contingenciamento de recursos previsto no orçamento do ano que vem, pode ter sérios reflexos no atendimento.

A leitura sobre a pressão inflacionária no setor de saúde é a mesma do presidente da Associação dos Reitores de Universidades Federais (Andifes), Emmanuel Tourinho. “A rede dos hospitais universitários presta serviços de alta complexidade. São serviços que não estão disponíveis para os cidadãos em outros hospitais, principalmente para aqueles de baixa renda. Os recursos desses hospitais não são suficientes para acompanhar as inovações tecnológicas e científicas que esse tipo de atendimento por vezes requer”, afirma Tourinho, que também é dirigente da Universidade Federal do Pará (UFPA).

No caso do Hospital das Clínicas, os funcionários muitas vezes se referem ao hospital como de atendimento “quaternário”. Esse nível de gravidade não existe formalmente (a escala vai até o nível terciário), mas devido ao tipo dos casos que chegam à unidade o termo foi designado informalmente para se referir aos pacientes “que não são aceitos em lugar nenhum”, e que muitas vezes buscam auxílio dos professores da Faculdade de Medicina da UFMG.

Outro lado

A Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) afirma que a proposta inicial do orçamento para 2018 ainda está sendo analisada, podendo haver alterações nos valores previstos para os hospitais. A empresa diz trabalhar junto aos órgãos responsáveis pela aprovação de um orçamento que atenderá as necessidades dos hospitais.

Ainda de acordo com a empresa, as informações sobre fechamento de blocos do HC-UFMG e suspensão de cirurgias por falta de insumos são improcedentes. “As salas cirúrgicas funcionam normalmente, com a compra regular de insumos”, diz, em nota.

Segundo a Ebserh, de janeiro a agosto de 2016, os atendimentos ambulatoriais somaram 7.792 procedimentos cirúrgicos e 242,9 mil consultas e acompanhamentos. No mesmo período de 2017, ocorreram 11.845 procedimentos cirúrgicos e 320 mil consultas e acompanhamentos – com registro de aumento nos números, numa média de 40%.

Além Disso

Desde 2011, a gestão dos hospitais universitários deixou de ser responsabilidade das universidades (que continuam tendo usufruto dos espaços para formação acadêmica) e passou a ser da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).

A medida foi tomada para evitar a contratação de servidores temporários via fundações, que vinham sendo alvo de questionamento jurídico. No caso da UFMG, por exemplo, muitos profissionais eram contratados por meio da Fundep. Com a transferência da gestão para a EBSERH, a empresa estatal assumiu boa parte da folha de pagamento dos hospitais, os desafogando financeiramente.

No Hospital das Clínicas da UFMG, houve concurso para cerca de 1.700 servidores em 2014. Os aprovados foram paulatinamente contratados até o início deste ano. O processo de transição foi polêmico, com a troca dos antigos funcionários pelos novos.