Mais verbas, mais qualidade

O reitor Ronaldo Pena fala do destaque da UFMG entre as federais.
Por Luiz Antonio Cintra

Depois de um longo inverno de verbas escassas e promessas descumpridas, as universidades federais finalmente saíram das cordas, salvo algumas exceções. O fôlego renovado explica o fato de as federais terem se saído bem no ranking divulgado recentemente pelo Ministério da Educação. Ocupam as três primeiras colocações – a Unifesp e a Fundação Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre ficaram em primeiro e segundo lugar, respectivamente.

Terceira colocada no ranking geral, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) festeja ser a primeira da lista entre as instituições com cursos e pesquisas consolidados em humanas, exatas e biomédicas, quando se considera que a expansão da Unifesp para além da saúde ainda é recente. As duas primeiras no ranking tiveram apenas três cursos analisados, enquanto a federal mineira teve 42.

Aos 82 anos, a UFMG surfa na boa onda dos orçamentos crescentes. Aproveita o que o reitor, Ronaldo Pena, considera uma nova forma de a sociedade – e os governantes – encarar o ensino universitário. “Antes, os reitores das federais iam a Brasília buscar verbas para fechar o custeio básico, as contas de luz, telefone. Agora, continuamos indo, mas para conseguir mais investimentos. A ideia da educação superior pública está se entranhando na sociedade.” Com mais recursos vindos de Brasília, mas também do governo do tucano Aécio Neves, a UFMG planeja ampliar as vagas – das atuais 25 mil na graduação para 33 mil em cinco anos – com participação crescente de alunos saídos do ensino médio público.

CartaCapital: O que diferencia a UFMG?

Ronaldo Pena: A UFMG é uma universidade muito orgânica, um corpo de fato vivo que cresce sempre em qualidade e profundidade de seus projetos, na relevância social de seu trabalho, na inclusão de estudantes e sempre com uma certa homogeneidade que não é comum em todas as universidades brasileiras. Somos de bom para cima em todas as áreas. Temos 25 mil estudantes de graduação, mas o Reuni vai nos levar a cerca de 33 mil estudantes em cinco anos. Na pós, temos cerca de 12 mil, dos quais 6 mil em mestrado ou doutorado.

CC: As federais oferecem hoje melhores condições de ensino e pesquisa. No caso da UFMG, a que se deveu essa melhora?

RP: A situação geral das universidades melhorou muito no governo Lula, é inegável. Houve a recuperação dos orçamentos e dos investimentos, que atingiram um patamar muito significativo. Antes, no tempo em que eu era pró-reitor, os reitores tinham dificuldade para fechar as contas, para pagar a energia, água, o chamado custeio básico. Eles iam a Brasília buscar verba para tapar esses buracos. Hoje, a gente continua indo a Brasília, mas para investimento, a conta básica não nos preocupa. E, no caso da UFMG, também porque o governo de Minas tem feito, ao longo dos anos, investimentos muito significativos. Tudo somado, no ano passado, o recurso disponível para pesquisa por pesquisador foi maior do que em São Paulo, com uma contribuição significativa do governo estadual.

CC: Por muitos anos, a educação foi prioridade apenas no discurso político. Agora, os investimentos na área estão saindo do papel?

RP: É uma coisa que tem a ver com o momento do País, com as preocupações tanto do governo estadual quanto do federal. Embora sejam de partidos diferentes, ambos têm uma visão muito boa da importância do conhecimento para o desenvolvimento do País. Hoje, a ideia de educação superior pública está se entranhando na sociedade.

CC: Qual o impacto do Reuni no orçamento da UFMG?

RP: Expandir as vagas no sistema público sempre foi uma pauta progressista. Então as universidades estavam expandindo, mas na base de primeiro fazer o buraco e depois ir buscar recursos para tapar. Com o Reuni, o MEC fez uma proposta que dá às instituições total autonomia para aderir e se expandir do jeito que quiserem. Com duas metas como contrapartidas: 18 alunos por professor e um índice de sucesso em termos de formação das pessoas de 90%. Ou seja, ter desistência inferior a 10%. Para a UFMG, que já tinha antes do Reuni 85% de sucesso, temos de trabalhar para atingir esses outros 5%. E ainda crescer, no mínimo, 20% na graduação, uma vez que crescemos 45% na graduação e vamos crescer um pouco na pós também.

CC: Há garantias de que esses recursos serão perenes?

RP: Uma das críticas que se fez ao Reuni é exatamente essa: e se houver cortes? Bom, se houver cortes, vamos ter problemas, mas a vida é assim. Este governo ofereceu e cumpre rigorosamente o combinado. O fato é que o Reuni traz recursos para custeio e para investimento. Recebemos para investimento 72 milhões de reais e para custeio algo em torno de 95 milhões ao ano. Desses 95 milhões separamos mais ou menos 40 milhões para ser despesa com pessoal e contratação de professores e funcionários. Isso fica no orçamento da universidade. O nosso orçamento era de 80 milhões para custeio anual e só o Reuni traz para o custeio alguma coisa em torno de 50 milhões de reais. É uma coisa muito significativa.

CC: Cabe às federais se concentrar na ampliação das vagas de graduação ou investir em pesquisa de ponta?

RP: Uma universidade como a nossa tem de ter atividades amplas de formação e também de pesquisa. Tínhamos cerca de 50 cursos diferentes de graduação. Com o Reuni, passamos a oferecer 75 cursos. Isso significa articular conhecimentos inclusive para profissões que não existem hoje e outras que são muito necessárias, caso da engenharia ambiental. Ou da aquacultura, que será uma espécie de engenharia de pesca. Mas a pesquisa também é fundamental porque, se você não tem geração de conhecimento, não tem como haver progresso econômico, não há como o País avançar. Temos 732 grupos de pesquisa registrados no CNPq com 2.540 linhas de pesquisa. Publicamos cerca de 12 mil artigos por ano. Somos a instituição, incluindo privadas e laboratórios da área de fármacos de biotecnologia, com mais patentes licenciadas e geradas no Brasil na área de biotecnologia.

CC: Como a UFMG lida com as cotas?

RP: A UFMG entende que o sistema de cotas não é o melhor. É possível atingir os objetivos de inclusão social por processos mais sofisticados do que simplesmente separar um número de vagas. Criamos um sistema de bônus que não compromete a qualidade. Em vez de separar um tanto de vagas, dá um porcentual de 10% sobre a nota do estudante que fez escola pública por sete anos. E se, além disso, ele se autodeclarar preto ou pardo, que é a forma que o IBGE define, ganha mais 5% e fica com um bônus de 15%. No caso da medicina, tínhamos 30 alunos vindos de escola pública. Com tal processo, esse número subiu a mais de 100.

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