O maior adversário da revolução sigilosa que é o Enem é o Ministério da Educação

O Enem é sério candidato a virar o grande vilão dos estudantes. Faço um pedido ao Ministério da Educação: por favor, me ajudem a defender a importância do exame para a melhoria da educação.

O novo Enem deveria servir como indutor das mudanças do ensino médio, que hoje ministra muitos conteúdos que não fazem sentido nenhum para o aluno. Ensiná-lo a conhecer, a fazer, a ser e a conviver são funções que a maioria das escolas não inclui em seus currículos.

Desta vez descobrimos que o Inep, o responsável (?) pelo exame, deixou os dados de milhões de pessoas disponíveis na internet. Uma rápida pesquisa permitia que qualquer pessoa soubesse o número de documentos, dados pessoais e até o desempenho de um candidato.

Listar as possibilidades que pessoas de má-fé poderiam ter acessando os dados demoraria horas.

O MEC foi claro em dizer que os dados só eram disponíveis para pouco mais de 200 instituições que usam a nota do Enem. Era só entrar com a senha para ter acesso.

Convido o MEC a pensar: Será mesmo que estamos respeitando os direitos individuais cedendo, de forma organizada, dados pessoais de milhões de pessoas para uma universidade que tem 10 mil candidatos às suas vagas?

O presidente do Inep acha tudo muito natural. Para ele, os dados eram “reservados”, e não sigilosos. Equívoco.

Nossa Constituição garante serem invioláveis a intimidade e a vida privada. É por causa disto que todos os editais do Enem até hoje apontavam que a nota só seria acessada por uma unidade de ensino quando “expressamente” autorizada pelo aluno.

No meio de tanta confusão, o Inep propôs auditoria completa nas 231 instituições que hoje podem ter acesso aos dados. Mais um erro. Não se acaba com a febre quebrando o termômetro. O ministério precisa entender que não tem o direito de disponibilizar os dados.

O novo Enem, como forma de seleção para universidades públicas e indutor da reforma do ensino médio, tem muitos adversários. Mudar o ensino médio no Brasil é fazer uma revolução silenciosa. Hoje o maior adversário disto chama-se Ministério da Educação. Sem trabalhar, incansavelmente, com competência e sensibilidade, o MEC pode fazer o novo Enem transformar-se em pó.

MATEUS PRADO cursou sociologia e políticas públicas na USP. É presidente nacional do Instituto Henfil, autor de livros didáticos e presta assessoria pedagógica sobre Enem para escolas particulares