Pente-fino para recuperar R$ 6 bi

Auditoria na folha federal tenta identificar benefícios indevidos pagos por decisão judicial

Após aumentar o contingente da máquina pública com 57,1 mil servidores desde 2003, o governo vai fazer agora uma grande auditoria nos gastos da folha de pessoal, para identificar pagamentos indevidos recebidos por servidores civis do Executivo, da ativa e aposentados.

A ideia é corrigir distorções incorporadas indevidamente por força de decisões judiciais, para reduzir em até 5% a folha de R$ 121 bilhões (em 2009). Essa meta geraria uma economia de R$ 6 bilhões ao ano.

A auditoria já começou, e uma das primeiras ações foi levantar as sentenças judiciais que elevaram os vencimentos de uma parcela do funcionalismo.

Descobriu-se que dos mais de 1,13 milhão de servidores civis, 223.369 ganharam ações que elevam a folha em R$ 1,725 bilhão ao ano, ou R$ 132 milhões ao mês. O que se busca são ganhos indevidos repassados ao longo dos anos a funcionários que não teriam direito aos benefícios confirmados pelas decisões judiciais.

A premissa do Ministério do Planejamento, que coordena o processo, é que, por terem transitado em julgado (até a última instância), boa parte desses aumentos é legal e não pode ser mais contestada. Mas será feito um pente-fino em todas as decisões dadas para incorporar aos salários perdas com planos econômicos, gratificações e adicionais (como insalubridade e periculosidade).

Os técnicos da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento pretendem implantar ferramentas para cruzar dados e verificar discrepâncias, numa auditoria permanente.

Se o sistema identificar elevação súbita de pagamentos ou variação inadequada da folha, será gerado um alerta. O Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU) deverão ser incorporados a esse processo de controle.

— Haverá um sistema de inteligência para que toda a folha possa passar por um filtro — diz um técnico.
universidades são alvo na 1ª etapa
O principal alvo do primeiro levantamento são as universidades e instituições federais de ensino. São 56 órgãos e 8,5 mil servidores que estão ganhando mais do que seus colegas, com base em ações judiciais. Dos R$ 132 milhões de gastos adicionais por mês, essas instituições levam R$ 80,8 milhões. As universidades foram alertadas de que terão sua folha auditada pelo Ministério do Planejamento.

Entre as instituições que concentram os maiores valores estão as universidades Federais do Rio de Janeiro (UFRJ), do Ceará (UFC) e de Brasília (UnB). No caso da UFRJ, constatou-se que 31.483 servidores foram beneficiados por decisão judicial. Mas a média mensal fica em R$ 560 por funcionário.

Por isso, ela não aparece entre os dez órgãos que mais pagam valores acima de R$ 10 mil por servidor.

Mas é nesta relação — de adicionais acima de R$ 10 mil mensais — que aparece a UFC, onde 3.905 funcionários recebem R$ 8,2 milhões a mais por mês, amparados pela Justiça. Isso representa média de R$ 2.103 por cabeça.

Na universidade cearense, o levantamento do governo apontou que 153 professores — na maioria, aposentados — recebem salários médios de R$ 17,9 mil por mês. É lá ainda que estão os maiores adicionais de salário, que variam de R$ 28 mil a R$ 43 mil.

Foi incorporada uma gratificação chamada de Função Comissionada/ Cargo de Direção (FC/CD), dada a partir de 1989, a título de complementação salarial por cargo de chefia, a funcionários das universidades.

Essa gratificação eleva a folha em R$ 30 milhões mensais e suspeita-se que são indevidos até 30% do que é pago. Foram identificados 32.631 servidores que recebem complementações acima de R$ 1 mil. Somados, representam acréscimo mensal de R$ 87,2 milhões à folha. Desses, 854, chamados de marajás, ganham adicionais acima de R$ 10 mil por mês.

Gustavo Paul – O Globo, 19/10