Projeto de lei que impede censura a manifestações artísticas divide opiniões

Religião e liberdade de expressão foram o centro de debate da Comissão de Cultura (CCULT) a respeito de projeto (PL 3291/15) que acrescenta no Código Penal (Decreto Lei 2.848/1940) dispositivo que deixa claro que manifestações artísticas não podem ser tipificadas como apologia ao crime.

O autor do projeto, deputado Bacelar (Pode-BA), argumenta que a Constituição prevê como direito fundamental do ser humano a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

Na audiência pública, sugerida pelos deputados Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), Flavinho (PSB-SP), Diego Garcia (PHS-PR) e Jean Wyllys (Psol-RJ), foram discutidos casos recentes de exposições e manifestações artísticas acusadas por líderes religiosos de promover apologia à pedofilia e ofensas à Igreja Católica.

Em uma das exposições, a Queermuseu, foi aberta ao público dia 14 de agosto, no museu Santander Cultural, em Porto Alegre (RS). A mostra causou polêmica e seus realizadores acusados por grupos religiosos de fazer apologia à pedofilia, zoofilia e desrespeitar objetos e símbolos religiosos ligados ao cristianismo. A exposição acabou suspensa pelo Santander em 10 de setembro – e depois cancelada pelo Museu de Arte do Rio (MAR), no Rio de Janeiro, onde seria apresentada.

Jean Wyllys, relator do projeto na Comissão de Cultura, apresentou parecer favorável à aprovação da proposta que impede a criminalização de manifestações artísticas, o que causou polêmica na audiência pública.

Arte e crime

O advogado Paulo Fernando, vice-presidente da Associação Nacional Pró-vida e Pró-família, defendeu que manifestações artísticas que promovem ofensas religiosas e ferem o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ao expor crianças, podem ser consideradas crime. “O que quer esse projeto é um vale tudo: permitir ofensas e apologia ao crime sob o pretexto de manifestações artísticas que de artísticas não tem nada”, disse.

Ele exibiu imagens de outros eventos culturais e obras artísticas que, segundo ele, ofendem religiões e incentivam crimes, como a performance de um artista nu no Museu de Arte Moderna (MAM), em São Paulo, e a exposição de Pedro Moraleida, em Belo Horizonte.

No MAM, performance do artista fluminense Wagner Schwartz causou polêmica depois da divulgação de fotos em que o artista interagia com uma criança. Já a exposição de Pedro Moraleida, em Belo Horizonte, foi acusada de incentivar a pornografia e a pedofilia.

A criminalização dessas manifestações artísticas foi criticada por Lívia de Meira Lima Paiva, representante do movimento Teatro pela Democracia. Segundo ela, a censura atinge o direito de expressão de minorias que são ameaçadas, sub-representadas e oprimidas no país.

“São expressões minoritárias que estão sendo atacadas por essa repressão moralizadora”, disse. Ela apresentou manifestação do Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul que recomendava a reabertura da exposição Queermuseu e o apoio oficial à mostra.

O músico Manno Góes, representante da União Brasileira de Compositores (UBC), também criticou a criminalização de manifestações artísticas. “Em nome da moralidade foram feitas coisas muito ruins. Não podemos ferir liberdades em nome de um senso pessoal”, disse.

Estado laico

O deputado Jean Wyllys defendeu o projeto e criticou ações voltadas para proibir e criminalizar artistas por meio de argumentos morais e religiosos. “O Estado é laico. Se o Estado tiver paixão religiosa vai agir contra religiões minoritárias e minorias sexuais”, disse.

Wyllys provocou polêmica ao afirmar, na comissão, que pessoas ficam escandalizadas com exposições como o Queermuseu, mas não se incomodam com a presença de pedófilos na Igreja Católica e com isenções fiscais concedidas às igrejas.

Os deputados Flavinho (PSB-SP) e Diego Garcia (PHS-PR) defenderam a Igreja Católica e criticaram o projeto que impede a criminalização de manifestações artística. Os dois apresentaram votos em separado contra a aprovação da proposta e contra o parecer de Jean Wyllys a favor do projeto.

“Tem padre que rouba e é pedófilo na igreja católica, como tem artista que é pedófilo e vagabundo. A igreja Católica promove a maior rede de ação social do mundo e usar isso para defender esse tipo de ofensa às famílias e à fé das pessoas é chamar todo mundo de idiota”, disse Flavinho.

“O respeito tem que se dar de ambas as partes. E aqui houve ataques à igreja Católica, o que é um desrespeito. Em uma das exposições chegaram ao ponto de colocar a imagem de Nossa Senhora fumando maconha. Isso não é arte. É falta de respeito e é violência”, disse Diego Garcia.

ÍNTEGRA DA PROPOSTA:

PL-3291/2015

Reportagem – Antonio Vital

Edição – Roberto Seabra

Agência Câmara Notícias