TCU adia novamente vigência de restrições a fundações de pesquisa

O Tribunal de Contas da União (TCU) fixou até 31 de dezembro o prazo para cumprimento do subitem 9.4.1 do Acórdão 2.731/2008, que determina a proibição a repasses de verbas federais “com objetivos de fomento à pesquisa científica ou tecnológica, diretamente para fundações de apoio a Ifes (instituições federais de ensino superior)”.

 

A decisão foi tomada na Sessão Plenária do TCU desta quarta-feira, 26 de maio. A ata, porém, ainda não foi publicada. A medida deverá ser oficializada nos próximos dias.

 

No mesmo dia, pouco antes de sessão solene de abertura da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), os presidentes da SBPC, Marco Antonio Raupp, e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis Jr., entregaram ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva um anteprojeto de Medida Provisória (MP) para criar um regime jurídico especial para a realização de licitações e estabelecimento de contratos por instituições de ciência e tecnologia (ICTs) e agências de fomento.

 

Impasse

 

No início do ano passado, por solicitação dos ministérios da Educação e da C&T, o TCU havia concedido 360 dias para início do cumprimento da determinação do item 9.4.1 do Acórdão 2.731/2008. O prazo, dado para que as Ifes pudessem se adequar às novas regras, terminou em 26 de março último.

 

Com a prorrogação aprovada pelo TCU, há mais tempo para resolver o impasse. A saída está sendo buscada agora por dois caminhos. No fim de março, decidiu-se aproveitar a tramitação da MP 483/2010 (que trata de alterações na organização da Presidência da República e dos Ministérios e na contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público) para incluir uma emenda tratando da questão do repasse de verbas para as fundações de apoio a pesquisa das universidades. Isso foi sugerido no lançamento da Frente Plurissetorial em Defesa da Ciência, Tecnologia e Inovação, em 24 de março.

 

Segundo o ministro Sergio Rezende, diante da demanda dos deputados, o MCT trabalhou na elaboração dessa emenda e entregou o texto à Câmara. Dessa forma, a Emenda 36 à MP 438/2010, de autoria do deputado Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), foi apresentada em 31 de março. Esse caminho, porém, sofreu um revés: outras 37 emendas foram inseridas na mesma MP – de assuntos diversos, “contrabandeados”, segundo jargão do Congresso – e o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, rejeitou todas.

 

Após a rejeição da Emenda 36, continuou Rezende, o MCT entrou em contato com o relator da MP e pediu à SBPC para conversar com Temer, iniciando um movimento reivindicatório. Além disso, o deputado Rollemberg apresentou recurso contra a decisão do presidente da Câmara. Embora não tenha falado com Temer, Rezende disse ter recebido a informação de que “ele [Temer] disse aos deputados que vai aceitar só essa emenda [sobre as fundações]”.

 

A emenda à MP 483/2010 “diz exatamente isto: Finep [Financiadora de Estudos e Projetos] e CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] poderão celebrar convênios com as fundações”, nas palavras do ministro Rezende. O texto solucionaria o problema acrescentando um artigo na Lei 8.958/1994, que dispõe sobre as relações entre as instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio. (Veja a Emenda 36 em http://www.camara.gov.br/sileg/integras/753230.pdf)

 

Presente à reunião entre Raupp, Palis Jr. e o presidente Lula, Rezende reconheceu que o anteprojeto de uma nova MP sugerido pela SBPC e pela ABC é uma solução mais abrangente. A proposta busca autorizar as instituições a efetuar suas compras e contratações com base em regulamento próprio, elaborado de acordo com as normas da administração pública, e não mais pela Lei 8.666/93 (Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos), considerada um entrave à pesquisa no Brasil.

 

Segundo o ministro Rezende, o presidente Lula entregou ao MCT a tarefa de trabalhar no anteprojeto. “Passei para o meu chefe de gabinete e pedi para examinar com cuidado e ver se nós podemos ampliar a emenda que já está lá [no Congresso], para que ela já tenha isso [abrangência das propostas da SBPC e da ABC] de uma vez”, disse Rezende.

 

O ministro informou ainda que, diante do impasse, a Casa Civil começou a achar que, se o presidente da Câmara insistir na rejeição a todas as emendas da MP em tramitação, pode ser melhor ter uma nova MP só para esse tema, seguindo a proposta da SBPC e da ABC.

 

No entanto, o conteúdo do anteprojeto das duas entidades ainda será analisado. “Temos que ver se realmente [a proposta] é factível, se tudo o que está lá pode ser feito, se não contraria outros preceitos maiores”, completou Rezende, lembrando que a mobilização da comunidade científica é fundamental. “O poder de convencimento da comunidade científica é muito grande, principalmente em época de eleição”, disse.

 

Ainda na noite da quarta-feira, dia 26, o presidente da SBPC informou que as duas entidades científicas pediriam audiências com Temer e com o presidente do Senado, José Sarney.

 

Histórico

 

As restrições ao repasse de verbas federais para as fundações de apoio das Ifes impostas pelo TCU arrastam-se desde 2008. Detonado em fevereiro daquele ano, o escândalo da Finatec, a fundação da Universidade de Brasília (UnB) – segundo investigação do Ministério Público do Distrito Federal, verbas repassadas pela fundação foram usadas na reforma do apartamento do então reitor, Timothy Mulholland – acelerou a atuação do TCU.

 

Em março do ano passado, o Acórdão 510/2009 ofereceu os 360 dias para que as Ifes se adequassem ao item 9.4.1 do Acórdão 2.731/2008, prazo findo em 26 de março passado. Nesse mesmo dia, foi publicado no Diário Oficial da União o Acórdão 1.255/2010, que analisa contas do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e reafirma as restrições impostas pela norma de 2008.

 

Em 3 de maio passado, a “Folha de SP” publicou reportagem informando que o TCU havia retomado as ações contra as fundações de apoio. “No início do mês, o ministro Raimundo Carreiro apresentou relatório de irregularidades nas contas da Fundepes, ligada à Universidade Federal de Alagoas”, diz a reportagem.

(Vinicius Neder, do Jornal da Ciência)