UFRGS – Evento repercute a CRES 2018

Imbuídos em dar continuidade aos desafios lançados pela III Conferência Regional da Educação Superior (CRES 2018), realizada em Córdoba, Argentina, no último junho, estão reunidos na UFRGS reitores de universidades públicas do país e gestores do ensino superior da América Latina e do Caribe para o seminário “A educação superior no pós-CRES 2018”. O evento ocorre durante o dia de hoje, 25, e tem por objetivo discutir o plano de ação que definirá objetivos, metas e indicadores para as instituições da região, direcionados pelo resultado do evento ocorrido em solo argentino.

A CRES 2018 transcorreu de 11 a 15 de junho de 2018 na Universidade Nacional de Córdoba e foi promovida pelo IESALC (Instituto Internacional para a Educação Superior na América Latina e no Caribe). O evento produziu uma Declaração Final em que são reafirmados os princípios da Educação Superior como um bem público social, um direito humano e universal, e um dever dos Estados, além de reunir os principais avanços nas discussões realizadas em sete eixos temáticos. Os debates foram impulsionados pela comemoração dos 100 anos da Reforma de Córdoba – mobilização estudantil que defendia, entre outras pautas, a democratização do espaço universitário.

O coordenador-geral da CRES 2018, ex-reitor da Universidade Nacional de Córdoba, Francisco Tamarit fez uma avaliação do trabalho desenvolvido pelos participantes da Conferência, reforçando as construções anteriores ao evento e a continuidade dos debates para colocar em prática nas instituições da região o conteúdo expresso na Declaração Final. Segundo ele, a Conferência ocorreu em uma época em que a Universidade está sendo questionada na sua essência mais profunda e foi uma oportunidade de falar forte para a nossa sociedade em defesa dos princípios do Ensino Superior. “A decisão que tomamos era que deveríamos falar não dos problemas da Universidade, mas dos problemas da América Latina: da falta de sustentabilidade do desenvolvimento; da difícil governabilidade; da falta de integração regional; do não respeito à diversidade; da falta de políticas públicas que ataquem problemas como a exclusão de milhões e milhões.”

Francisco Tamarit foi o coordenador-geral da CRES 2018 – Foto: Gustavo Diehl/ UFRGS

Tamarit não se absteve de uma autocrítica sobre os resultados alcançados diante das expectativas geradas sobre o evento em que foi coordenador-geral. O ex-reitor apontou que os eixos temáticos não conseguiram transpor a temática da universidade para falar dos problemas do subcontinente. Esperava, também, que o evento tivesse maior participação estudantil e de trabalhadores do setor. “Outro fracasso importante foi a ausência de diálogos entre os governos e as universidades”, ressaltou, contando da impossibilidade de realizar uma reunião com ministros da educação dos países da América Latina e do Caribe, com vistas a definir políticas conjuntas. Tamarit tinha a expectativa de ter na CRES um ponto final sobre a temática do reconhecimento de diplomas entre os países, com a formulação de um acordo.

O grande salto destacado pelo coordenador do evento foi dado pelos povos negros e indígenas que, articulados, estão conseguindo abrir espaços para seu reconhecimento. “Gosto desse exemplo de articulação, que é o que temos de fazer perante um mundo que deprecia nossa cultura e muitas vezes tenta nos submeter”, pontuou. O professor afirmou que a Declaração Final da II CRES, realizada em 2008, em Cartagena, Colômbia, ficou engavetada, enquanto o sistema de educação superior da Região se mercantilizava. “Uma característica nossa: conviver com as coisas ruins que passam a nosso redor sem nos mover. Mas essas problemáticas têm que vir para nossa preocupação”, avaliou Tamarit, enfatizando a necessidade de as instituições de Ensino Superior se imaginarem como parte dos problemas da América Latina e do Caribe e passarem a contribuir com maior ênfase para o oferecimento de espaços regionais e estruturas de cooperação Sul-Sul.

Reflexos de Córdoba – Na sequência das atividades, ocorreu a mesa “O significado do manifesto da CRES 2018 para a Educação Superior na América Latina e no Caribe”, coordenada pelo secretário de Relações Internacionais da UFRGS Nicolas Maillard, e com a presença da consultora acadêmica para redes universitárias da IESALC, Débora Ramos, e dos reitores da Unila, Gustavo Vieira, e da UFSM, Paulo Burmann. Débora apresentou a metodologia de construção do plano de ação, que é resultado de Córdoba. O plano está em fase de desenvolvimento e as decisões passaram por amplas rodadas de discussão como a que ocorre neste dia na UFRGS. A ideia é que ele apresente um conjunto de tarefas e ações estratégicas que possam nortear as políticas de Ensino Superior na Região nos próximos anos.

O reitor da Unila, Gustavo Vieira, disse que a CRES propôs pensar a geopolítica do conhecimento e configura-se como uma oportunidade de avaliar as universidades a partir de uma identidade própria. Para ele, essa perspectiva coloca para as universidades questões como a horizontalização das relações acadêmicas; a criação de metodologias próprias para ler o potencial transformador das instituições, em substituição aos rankings internacionais; e assumir pautas mais engajadas, em vista a uma estratégia de desenvolvimento regional.

Paulo Burmann apresentou o entendimento de que as universidades sozinhas não vão conseguir resolver os problemas dos países e da região. Tampouco, segundo ele, os governos têm essa capacidade isolados. O reitor da UFSM argumentou que a Educação Superior tem de ser tratada como direito humano universal, e sustentou que as universidades precisam descer do pedestal protegido em que estão, por vezes, por conivência, e precisam compreender as demandas sociais como sua responsabilidade. “Educação, Ciência e Tecnologia não podem, jamais, sair da pauta das Universidades”, afirmou.

Abertura – Antes da conferência com Tamarit e da primeira mesa, o reitor Rui Vicente Oppermann fez a abertura do evento, juntamente com a diretora de Relações Institucionais do Conif (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica) Carla Comerlato, reitora do Instituto Federal Farroupilha; o presidente da ABRUEM (Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais), Haroldo Reimer, reitor da Universidade Estadual de Goiás; e do presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), Reinaldo Centoducatte, reitor da Universidade Federal do Espírito Santo.

A representante do Conif enfatizou a necessidade de os debates reforçarem o caráter da Educação Superior defendido em Córdoba: um dever do Estado e um direito da sociedade. Reimer ressaltou a unidade das três organizações que representam as instituições públicas de Ensino Superior, e reforçou o papel das universidades estaduais e municipais como vetores de desenvolvimento, como políticas de enfrentamento das assimetrias regionais. O dirigente lembrou que as universidades cumprem o papel de possibilitar aos cidadãos exercer com dignidade sua cidadania e que, portanto, devem ser encaradas como bem públicos e defendidas com toda a força. Centoducatte sublinhou o compromisso da Andifes de lutar pela educação superior pública, gratuita e de qualidade. “São muitos os desafios considerando as profundas mudanças que temos vivido”, disse ele, citando os choques ideológicos que atacam as políticas públicas dos países da região, incluindo as políticas de Ensino Superior. O reitor da UFES disse que o papel do encontro de hoje é trabalhar para expressar e confirmar o que foi discutido e decidido na Conferência Regional.

Mesa de abertura contou com dirigentes da ABRUEM (E), da Andifes (C) e do CONIF (D), além do reitor Rui Oppermann (2.º da direita pra esquerda) – Foto: Gustavo Diehl/UFRGS

O evento tem continuidade à tarde, quando ocorrem as mesas: “O significado do manifesto da CRES-2018 para a Educação Superior no Brasil”, às 13h30min, e “O que fazer com o manifesto CRES-2018 nos próximos 10 anos”, às 15h30min. Ao final do encontro, será aprovada uma carta com as deliberações do dia de debates.