Uma análise cuidadosa sobre os gastos previstos em iniciativas de pesquisa nos EUA mostra que nunca tanto dinheiro havia sido repassado a cientistas. Na agenda do presidente Barack Obama para revitalizar a economia está a maior aposta em ciência e tecnologia já feita na história de um país.
A atual tentativa americana de fazer frente aos problemas do país é um pedido de Orçamento recorde de US$ 3,6 trilhões para 2010. Este número se soma ao pacote de estímulo de US$ 787 bilhões que visa dar uma injeção vital na economia americana. O Orçamento e o pacote estão repletos de verbas para empreendimentos na área de ciência e tecnologia.
Só o pacote de estímulo prevê gastos de mais de US$ 100 bilhões para pesquisa científica em áreas diversas. As verbas deverão ser gastas em dois anos, mas em alguns casos isso pode levar mais tempo. Em termos de dólares por ano, pode-se afirmar que é o maior volume de dinheiro jamais investido em pesquisas científicas.
Esse fluxo de verba é maior que o dos anos do programa Apollo (viagem tripulada à Lua) e do projeto Manhattan (construção da bomba atômica). Essas empreitadas custaram US$ 200 bilhões e US$ 35 bilhões, em valores reajustados, mas foram espalhadas ao longo de 11 anos e 6 anos, respectivamente.
"Ele [Obama] está comprometido com a meta de investir seu dinheiro em suas ideias – ou de investir nosso dinheiro em suas ideias", diz Lesley Stone, da ONG Cientistas e Engenheiros pela América.
Nos detalhes do pacote de estímulo de Obama estão os elementos chaves de uma agenda mais ampla, aspectos que poderiam ter sido alvo de disputa interna, se o plano não tivesse sido apresentado tão às pressas.
Tomemos o caso da saúde: o pacote de estímulo inclui US$ 1,1 bilhão para pesquisas sobre a eficácia comparativa de tratamentos. É uma iniciativa ousada, em vista das organizações poderosas que lucram com o status quo, como as grandes empresas farmacêuticas.
É crucial para o plano mais amplo de Obama poupar dinheiro ao abandonar tratamentos ineficazes e gastar muito estendendo a cobertura do seguro-saúde para dezenas de milhões de pessoas que não o possuem.
Para garantir a eficiência prometida, porém, será preciso mudar o sistema que recompensa médicos e hospitais pela quantidade do atendimento prestado, e não sua qualidade.
O pacote e o Orçamento também incluem grandes valores para agências que financiam pesquisa básica. Essas instituições terão, porém, de estudar as maneiras mais eficazes de gastar suas verbas. Os Institutos Nacionais de Saúde estão revendo toda sua carga passada de pedidos de verba negados.
Essa corrida preocupa alguns. "Não acho que seja possível gastar tanto dinheiro assim, em tão pouco tempo, de modo correto e bem pensado", diz Gail Wilensky, do Projeto Hope, ONG do setor de saúde. E uma aposta tão grande na ciência certamente trará cobrança por resultados.
"Será importante que os cientistas entendam que essa é uma oportunidade que não pode ser desperdiçada", diz Rita Colwell, ex-diretora da Fundação Nacional de Ciências dos EUA. A ciência é uma das peças da política de Obama de "apostar tudo, em todas as frentes".
"Teremos uma chance só de realizar tudo isso", diz Glenn Ruskin, da Sociedade Química Americana. "É algo sem precedentes, mas precisa ser feito."
(Peter Aldhous, da "New Scientist". Tradução de Clara Allain)
(Folha de SP, 7/3)