Empresas de educação se unem para se manter no mercado. Estimativa é de que nos próximos seis anos apenas 20 grupos detenham 70% dos alunos
A crise internacional que empurrou a economia brasileira para o buraco tornou-se um tormento para as empresas de educação de ensino superior, com mais de 5 milhões de alunos matriculados. Sem crédito na praça, atoladas em dívidas e enfrentando índices assustadores de inadimplência, muitas delas foram colocadas à venda para não fechar as portas. Resultado: a tendência é de 2009 ser marcado por uma consolidação enorme do setor, processo que começou a ganhar força em 2007, quando grupos privados importantes, como o Anhanguera, com 110 mil alunos, e o Estácio de Sá, com 190 mil, foram à bolsa de valores, emitiram ações e levantaram milhões de reais para se expandirem.
Na avaliação do economista Ruy Coutinho, presidente da LatinLink, que concluiu um vigoroso estudo sobre o setor educacional brasileiro, a velocidade de concentração no setor será tão grande que, até 2015, os 20 maiores grupos estarão respondendo por 70% dos alunos do ensino superior privado. Os 30% restantes estarão distribuídos por faculdades de menor porte, com atuação local ou regional. "As faculdades menores que tentam competir com os grandes grupos serão absorvidas, ou desaparecerão por total incapacidade de operar", destaca.
Em 2008, quando o crédito ainda era farto e o emprego estava em alta, foram 55 aquisições. "Daqui por diante, com a situação financeira das empresas se agravando, teremos anúncios cada vez mais frequentes de fusões e incorporações", diz Coutinho. Uma das mais recentes operações ocorreu em fevereiro. O grupo paranaense Campos Andrade arrematou o controle da Universidade Ibirapuera (Unib), de São Paulo. A Unib enfrentava um forte processo de deterioração financeira, deixou de pagar funcionários em dia e reduziu o quadro de alunos à metade, de 12 mil para 6 mil.
Nas contas do presidente da LatinLink, pelo menos 25 grupos de portes variados e de várias regiões do país estão sendo alvo de potenciais aquisições. "Não são apenas os grupos privados brasileiros, os interessados. Há estrangeiros averiguando oportunidades no Brasil", afirma Coutinho.
Também há os fundos de investimentos, chamados de private equity, que já detêm participações em grupos educacionais importantes. Coutinho cita como exemplos o GP Investimentos, que comprou 20% da Estácio de Sá; o Fundo Pátria, que participa do capital da Anhanguera, e o UBC Pactual, com 38% da Faculdades do Nordeste (Fanor), em Fortaleza. Entre os fundos estrangeiros que já fincaram os pés no Brasil estão o americano Capital Group, acionista do grupo Kroton Educacional, e o Cartesian Group, que adquiriu parte do grupo nordestino Maurício de Nassau. Já a Laureate Education, uma das maiores instituições privadas de ensino do mundo, tascou o controle da Faculdade Anhembi Morumbi.
Para Eduardo Wurzmann, presidente da Veris Educacional, holding que controla as faculdades Ibmec (Brasília, Minas Gerais e Rio de Janeiro) e IBTA, o movimento de consolidação do setor educacional privado é irreversível. "As fusões e incorporações vão ocorrer nos segmentos mais populares, com mensalidades até R$ 400, pois a palavra-chave do mercado passou a ser escala, escala, escala", diz.
Interesse em Brasília
Eduardo Wurzman, presidente da Veris Educacional, que controla as faculdades Ibmec, ressalta que a Veris está pronta para crescer, não apenas ampliando a estrutura própria, mas se aproveitando das boas oportunidades de aquisição que o mercado oferecer. "Mas queremos negócios que agreguem valor. Não somos aquisidores em série. Somos mais seletivos e reativos", ressalta. E acrescenta: "Em 2008, olhamos 50 faculdades, mas só fizemos duas aquisições", conta.
"Em Brasília, olhamos e não vimos nada de interessante. Então, optamos por entrar sozinhos no mercado com a marca Ibmec. E o negócio deu tão certo que estamos ampliando nosso raio de ação. Pedimos autorização do MEC (Ministério da Educação) para fazer vestibular para mais cinco cursos", afirma.
O Sistema Educacional Brasileiro (SEB), que aproveitou a onda favorável do mercado de ações, optou, por sua vez, pela compra do Instituto Dínatos, tradicional instituição de ensino básico do Distrito Federal. A operação foi fechada em setembro de 2008, uma semana depois do estouro da crise internacional, por R$ 2,4 milhões. Na opinião da empresa, tal aquisição está alinhada com sua estratégia de crescimento, consolidando as operações em Brasília como polo regional para a expansão dos negócios na Região Centro-Oeste.
Cortes
Diante de todo esse movimento de concentração, o advogado Roberto Mohamend, que acabou de assessorar a compra de grupos educacionais em São Paulo e em Belo Horizonte, é taxativo: "O tempo de uma faculdade em casa de esquina acabou. Uma das primeiras coisas que as famílias cortam em tempos de crise e de desemprego, como o atual, é o ensino superior dos filhos". Portanto, poucos grandes grupos vão dominar o setor.
Mas, a seu ver, apesar de o segmento ser regulado pelo governo – todos os negócios passam pelo crivo do Ministério da Educação – é preciso que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) reforce sua estrutura para também vigiar a concentração que está se vendo na educação. "É preciso preservar ao máximo a concorrência e as regras de acesso do mercado a outras empresas", frisa o advogado. (VN)
Correio Braziliense, 15/3