MEC vai incentivar centros de excelência a formarem gestores. Haverá bolsas para mestrandos em educação, diz o presidente da Capes.
O mestrado profissional, que é voltado para a solução de problemas, vai ganhar força a partir deste ano, informa Jorge Guimarães. É que a demanda por formação profissional levou o Ministério da Educação a rever o modelo anterior, centrado na pós-acadêmica.
Haverá mudanças na avaliação dos cursos, que é visto com desconfiança por alguns setores da academia, permissão para que profissionais do mercado deem aulas no lugar de doutores e a oferta de bolsas para alunos de mestrados profissionais na área de educação.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
– Qual é a diferença entre o mestrado profissional e o acadêmico?
Até o momento são duas diferenças básicas: o perfil do candidato e o foco. O mestrado profissional tem um foco específico de resolução de problemas. O acadêmico, não: nesse caso, é preciso fazer levantamento de literatura a respeito, acompanhar o que está acontecendo no mundo etc.
– E qual é o perfil do estudante do mestrado profissional?
De um modo geral, ele não vai seguir carreira acadêmica. No mestrado acadêmico, ao contrário, o aluno vai fazer um doutorado, seguir para o exterior, produzir conhecimento, formar outros doutores. E geralmente é mais novo. Já o do mestrado profissional é mais maduro, já tem emprego.
– Quando os mestrados profissionais começaram a ser oferecidos no Brasil?
No fim da década de 1990, ainda na gestão do professor Abílio (Baeta Neves), com a perspectiva de que muitos mestrados acadêmicos, na verdade, eram profissionais e só não tinham o nome. Recentemente saiu na revista “Science” uma enorme matéria sobre mestrado profissional nos Estados Unidos. É um fenômeno mundial. Aqui teve muita reação de algumas áreas, enquanto outras perceberam aquilo como um nicho.
– Reação contrária?
Teve. Tem área que torce o nariz e até hoje não tem nenhum (mestrado profissional).
– Que áreas aderiram aos mestrados profissionais?
A odontologia é uma das áreas que têm mais cursos profissionais. É um nicho muito importante, sobretudo em instituições privadas.
– O mestrado profissional seria um MBA melhorado?
Ele pode nem ser um curso melhorado em relação a um bom MBA. Mas tem o padrão Capes, o que significa acesso ao portal de periódicos (conjunto de publicações científicas de todo o mundo), avaliação, título reconhecido nacionalmente e a possibilidade de fazer doutorado depois.
– Qual é a duração de um mestrado profissional?
No mínimo, um ano, mas, de modo geral, dois anos, como o acadêmico. Requer envolvimento muito maior do estudante, que tem que fazer um trabalho de conclusão. No MBA, nem sempre tem.
– O senhor diria que os mestrados profissionais competem com os MBAs e cursos de especialização?
Vão competir agora. A avaliação (feita pela Capes nos mestrados profissionais) era muito criticada por ter um certo viés acadêmico. Apesar disso, nós já temos, se não me engano, 253 cursos de mestrado profissional no país. Se você compara só com mestrado acadêmico, isto é, mestrado que não está junto ao doutorado, os mestrados profissionais poderão chegar a 25% dos mestrados acadêmicos. Hoje estamos em 18%.
– De onde vem a demanda para o mestrado profissional?
Sobretudo do segmento privado. Queremos atrair para o sistema as universidades privadas que têm um bom nível. No contexto da pós-graduação acadêmica, 20% das instituições são não públicas. Quando eu comecei (há seis anos), eram 10% e passamos a 20%. Ou seja, não há preconceito, tem que ter qualidade. No mestrado profissional, porém, é meio a meio. E cresce mais no privado.
– Por que o governo tomou a decisão de investir nos mestrados profissionais?
Porque há uma demanda enorme. Este ano o ministro (Fernando Haddad) me chamou e disse: “Vamos transformar o mestrado profissional em política de Estado, fazer um modelo diferente.” Batemos o martelo: vamos transformar o mestrado profissional em modelo de indução.
– Como funcionará o novo modelo?
O mestrado profissional passa a ser por edital, aberto a todas as áreas que se sintam atraídas. Hoje temos um aplicativo na internet, mas muita gente não fica sabendo. Com a chamada pública, pode ser que um hospital excelente em ortopedia, como este aqui do Distrito Federal (Sarah Kubitschek), diga: “Nós temos cinco doutores nisso e temos dez dos melhores cirurgiões. Vamos montar um mestrado profissional, vamos ganhar dinheiro à beça.” Hoje precisa ser todo mundo doutor. Então, você atrai para o sistema grupos e atividades de excelência que estão fora porque não são tipicamente acadêmicos.
– Hoje todos os professores de um mestrado precisam ter doutorado?
Sim. Aliás, vai ser obrigado ter uma mescla de doutores com técnicos de alto padrão. Nós não botamos um número, mas, digamos, que 40% dos docentes sejam técnicos (sem doutorado).
– E o senhor acha que isso estimulará a oferta de cursos de mestrado profissional?
Vai facilitar muito. Em gestão hospitalar, por exemplo, há poucos profissionais com doutorado. Os caras aprenderam sozinhos. Vamos puxar essas pessoas para dentro do sistema. Tem muito disso nas áreas tecnológicas. Em direito, há juízes de altíssimo padrão que não têm doutorado e vão poder entrar.
– A Capes vai dar bolsas para alunos de mestrados profissionais, como já faz hoje nos cursos acadêmicos?
Sim, vamos ter exceções para as áreas de interesse do Estado. A educação, por exemplo, vai ter bolsa para professor de escola pública.
– Qual o valor da bolsa?
Estamos discutindo o seguinte: se o curso for na mesma cidade, o valor será um pouco menor. Se for a mais de tantos quilômetros, o mestrando terá bolsa integral. O valor da bolsa de mestrado acadêmico hoje é R$ 1.200 por mês.
– Que outras medidas serão tomadas?
Outra coisa é que a avaliação será totalmente diferente. Incluirá o desempenho acadêmico, mas abrindo um leque de possibilidades. Vai entrar uma série de outros indicadores de desempenho.
– Dê um exemplo.
O camarada passa um período numa empresa, como consultor. Ele está fazendo mestrado profissional e nem é empregado daquela empresa. Essa consultoria contará (pontos). A empresa vai dizer se valeu a pena. Contará pontos e até pode ser a própria defesa final (em vez de dissertação). Se for assunto de sigilo industrial, pode ser uma defesa sigilosa. Tem que ter um trabalho final, só que o trabalho não precisa ser a tese clássica. Pode ser uma patente, uma consultoria, um conjunto de artigos na imprensa.
O Globo, 21/6