Atraso em leis para regulamentar o setor faz tribunal começar a aplicar penas
Recebedoras de grande parte dos recursos para pesquisa científica no país, as fundações de apoio às universidades públicas estão novamente na mira do TCU (Tribunal de Contas da União). Ministros do tribunal se irritaram com a demora na produção de um conjunto de leis para regular o setor, determinado em 2008, e começaram a votar processos de irregularidades nas contas destas entidades, com a aplicação de penalidades como devolução de dinheiro e aplicação de multa.
No início do mês, o ministro Raimundo Carreiro apresentou relatório de irregularidades nas contas da Fundepes, ligada à Universidade Federal de Alagoas. Professores da entidade estavam recebendo adicionais do salário além do permitido via fundação, entre outros problemas. O plenário multou os responsáveis pela fundação.
Outro ministro, Walton Alencar, afirmou que colocaria em votação todos os processos sobre fundação que estavam sob sua responsabilidade porque, segundo ele, as fundações continuavam a praticar as irregularidades identificadas pelo TCU e o conjunto de regulamentos determinados pelo órgão não havia ficado pronto.
A situação aflige pesquisadores e reitores. Eles afirmam que as entidades são fundamentais para o encaminhamento das verbas de pesquisa, uma vez que têm mais estrutura e flexibilidade para lidar com processos como compra de equipamentos e contratação de pessoal para projetos.
Para Álvaro Prata, reitor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e membro da diretoria da associação que reúne os reitores das federais, o fim dessa relação com as entidades pode ter o significado de um “freio” para a pesquisa. “No ano passado, houve um esforço muito grande [para regularizar a situação], fizemos inúmeras reuniões, mas infelizmente não houve um desfecho”, diz.
Reação
Diante das manifestações do TCU, o Ministério da Ciência e Tecnologia tentou contornar o tema por duas vias. No próprio tribunal, entrou com um pedido, ainda não respondido, para que o prazo para análise de contas fosse estendido em relação ao financiamento via fundações para pesquisas e infraestrutura para laboratórios.
Enquanto isso, no Congresso, articulou com parlamentares da base aliada a inclusão de mudanças na lei de fundações por meio de emendas a uma medida provisória que já está sob análise da Câmara. A iniciativa, contudo, foi vetada porque o tema da MP não tinha relação com as fundações. O ministério afirma que continua trabalhando em nova via legislativa para solucionar a questão.
No Ministério da Educação, a secretária de Educação Superior, Maria Paula Dallari Bucci, afirma que “muito em breve” será anunciado um conjunto de medidas para fortalecer a estrutura das universidades para que elas tenham mais agilidade para gerir recursos de pesquisa.
No Maranhão, docente recebeu “aúxílio de retorno das férias”
Irregularidades nas contas das fundações de apoio são quase rotineiras. Na da Universidade Federal do Maranhão, professores receberam pela fundação até mesmo “auxílio de retorno das férias”, segundo o ministro do TCU José Jorge. “Eu queria saber como o sujeito vai gastar o dinheiro das férias depois que retornar ao trabalho”, ironizou o ministro.
Em 2007 o tribunal iniciou um procedimento para regulamentar a relação entre fundações e universidades. Criadas para facilitar a pesquisa, as fundações estavam cada vez mais sendo desvirtuadas para tornarem-se contratadoras de mão de obra para a universidade. Com isso, administradores se livraram de processos.
O tribunal acabou atropelado pelo escândalo da Finatec, a fundação da Universidade de Brasília (UnB). Em fevereiro de 2008, o MP do Distrito Federal apontou diversas irregularidades em compras da fundação, que financiaram uma reforma de R$ 500 mil no apartamento do então reitor, Timothy Mulholland. Ainda há 14 investigações sobre a Finatec no TCU.
Após o escândalo, o TCU determinou que os ministérios da Educação e Ciência e Tecnologia teriam um ano para deixar de enviar recursos diretos para as Fundações. Eles teriam que ser enviados primeiro às universidades. E deu ainda um prazo até novembro de 2009 para que fosse feito o conjunto de leis para regular o setor.
Os recursos continuam sendo enviados direto às fundações. Ainda assim, o ministro Augusto Cedraz reconhece que universidades e governo vêm tentando se adequar.
(Dimmi Amora e Angela Pinho – Folha de SP, 3/5)