Texto de Medida Provisória apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva propõe criação de regime jurídico especial para instituições de ciência e tecnologia, facilitando o repasse de recursos públicos
Os presidentes da SBPC, Marco Antonio Raupp, e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis Jr., entregaram nesta quarta-feira (26/5) um anteprojeto de Medida Provisória ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A proposta cria um regime jurídico especial para a realização de licitações e estabelecimento de contratos por instituições de ciência e tecnologia (ICTs) e agências de fomento.
A MP seria uma solução para o impasse criado por Acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que, em reação a escândalos envolvendo a Universidade de Brasília (UnB), proibiu o repasse de verbas públicas de fomento a fundações científicas de apoio das ICTs. As fundações são usadas sobretudo para agilizar o recebimento de recursos aprovados em editais.
A ideia da MP é autorizar as instituições a efetuar suas compras e contratações com base em regulamento próprio, elaborado de acordo com as normas da administração pública, e não mais pela lei 8.666/93 (Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos), considerada um entrave à pesquisa no Brasil.
A proposta preceitua que as ICTs e agências deveriam submeter regulamento à instituição colegiada máxima das instituições e homologá-lo junto ao órgão superior a que são subordinadas ou vinculadas. As instituições teriam ainda que seguir uma série de medidas complementares aos mecanismos oficiais de controle, a fim de garantir transparência em todas as etapas das licitações e contratos.
O anteprojeto de MP foi entregue ao presidente Lula na noite desta quarta-feira, antes da solenidade de abertura da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), em Brasília.
De acordo com Raupp, Lula recebeu bem a proposta e mostrou-se aberto a enviá-la ao Congresso Nacional. Pediu, no entanto, mobilização por parte da comunidade científica para que a MP seja bem recebida pelos congressistas. O presidente da SBPC informou que serão pedidas audiências com os presidentes da Câmara dos Deputados, Michel Temer, e do Senado, José Sarney.
Na visão do presidente da Academia Brasileira de Ciências, Jacob Palis Jr., a edição de uma MP se justifica pela extrema necessidade de mudanças. “As peculiaridades do ambiente em que atuam, as atividades que realizam e o papel estratégico que as instituições de ciência e tecnologia têm para o desenvolvimento do país justificam que elas recebam um tratamento diferenciado”, afirmou. “E essa mudança de tratamento precisa ser feita em caráter de urgência”, ressaltou.
A mudança do regime de compras é uma antiga demanda dos cientistas. A Lei de Licitações exige, por exemplo, que os contratos administrativos estabeleçam “prazos de início de etapas de execução, conclusão, entrega, observação e recebimento definitivo”, vedando a pactuação por prazo indeterminado e limitando a vigência contratual a 60 meses.
“A morosidade resultante da observação dos ritos, prazos e formalidades dessa lei acaba ameaçando o andamento de projetos de pesquisa prioritários, como a prevenção e combate ao câncer, a produção de vacinas e a construção e operação de satélites para monitorar alterações climáticas e desmatamentos no país”, afirmou Raupp.
Para o coordenador do debate sobre marco regulatório que aconteceu durante a 4ª CNCTI nesta quarta-feira e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Paulo Sergio Beirão, a lei é absurda. “É impossível o cientista que trabalha na fronteira do conhecimento prever o que vai precisar”, garantiu. Isso porque diversos projetos envolvem riscos e mudanças de rumo, situações que envolvem mudanças nos projetos e respostas rápidas, de acordo com o professor.
No debate, o representante da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Renato Fernandes, também criticou o ambiente jurídico nacional. “Há insegurança jurídica para obter patentes, além de problemas econômicos e de conhecimento das leis”, afirmou. Segundo ele, é necessário ainda capacitar os organismos de fomento e jurídicos para que a lei tenha interpretações menos díspares.
O texto da medida provisória proposta pela SBPC e ABC está disponível no seguinte link: www.jornaldaciencia.org.br/links/propostaMedidaProvisoria.pdf
(Marcelo Medeiros e Vinicius Neder, do Jornal da Ciência, com informações da Assessoria de Imprensa da SBPC)