Análise
Quando bem torturados, números confessam qualquer coisa. O clichê pode ser dos mais batidos, mas se aplica perfeitamente à análise dos resultados do programa de inclusão da USP.
Quem quiser enxergar nos dados divulgados pela universidade um sucesso incontestável da política de bônus dirá que, de 2006 a 2010, o percentual de alunos da rede pública que passaram no vestibular da universidade mais que dobrou, saltando de 3,6% para 8,2%.
Ou seja, oito em cada cem estudantes dessas escolas que se inscreveram no concurso foram aprovados.
Os mesmos números, no entanto, contam outra história. Eles mostram que, com exceção do pico registrado em 2009, a proporção de oriundos da rede pública em relação ao total de aprovados -incluindo aqui também os alunos da rede privada- está praticamente congelada em torno de 25% desde 2001.
A política de inclusão da USP, por esse critério, foi incapaz de alterar o perfil do ingressante em seus cursos.
Para entender a discrepância entre as duas leituras, é preciso considerar que houve uma queda brutal (de 69 mil para 33 mil) no total de inscritos de escolas públicas entre 2006 e 2010.
Talvez esses estudantes estejam optando por vestibulares com acesso mais facilitado à rede pública, casos de Unifesp, UFSCar e UFABC, que trabalham com cotas, em vez de apenas dar bônus na pontuação.
Outros alunos podem estar migrando para instituições privadas com vagas gratuitas no ProUni (programa federal para facilitar o acesso ao ensino superior).
Diante desse quadro, tende a crescer a pressão para que a USP faça mais do que tem feito para tornar seu vestibular novamente atrativo aos alunos da rede pública.
A dúvida é até onde a universidade estaria disposta a ir sem recorrer a medidas pelas quais nunca demonstrou simpatia, como o estabelecimento de cotas.