SÃO PAULO – Lançada em 2008 como uma solução inovadora e meritocrática para melhorar a qualidade do ensino público, a política de pagamento de bônus salarial para os professores da rede estadual fracassou e levou o governo de São Paulo a repensar suas propostas educacionais. O incentivo, que pode chegar a quase três salários extras, é calculado a partir do desempenho dos alunos, baseado nos dados do fluxo escolar e das notas do Saresp, o “provão” paulista de português e matemática dos ensinos fundamental e médio.
O resultado de 2010 causou constrangimento ao revelar um recuo na habilidade dos estudantes, que já estava em patamares baixos. E o pagamento de bônus baixou de R$ 655 milhões em 2010 para R$ 340 milhões em 2011.
Depois de pagar R$ 1,4 bilhão em “prêmios” em 2009 e 2010 para professores, o governo de São Paulo viu as notas dos alunos que terminam os ensinos fundamental e médio recuarem para o nível de dois anos atrás, já bastante defasado. Esperavam uma melhora gradual e sistêmica, baseada principalmente no incentivo, conforme dita o Plano de Qualidade na Educação (PQE), lançado em maio de 2008. Por meio de gráficos, o governo explicou que metas diferenciadas por colégio poderiam levar à convergência de qualidade em 2030, em níveis compatíveis com os dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
– O resultado do Saresp mostra que a política de bônus de São Paulo foi um fracasso – afirmou Romualdo Portela de Oliveira, da Faculdade de Educação da USP. – Existem pressupostos complicados na política de bônus, a começar pela motivação financeira. O que motiva uma pessoa a ser professor, hoje, no Brasil, muito poucas vezes é dinheiro. Há uma parcela grande que atua com um grau de altruísmo.
Há anos que os incentivos monetários na educação são alvo de estudo e controvérsia, principalmente pelo uso de notas dos alunos e por prazos, fatores estruturais e desigualdades locais – todos podem causar distorções. Porém a evidência acumulada – em São Paulo e em experimentos científicos – é de que o bônus, sozinho, não melhora o desempenho dos alunos. Nos Estados Unidos, a mais completa pesquisa sobre esse tipo de incentivo ao professor revelou resultados indiferentes na melhoria das notas de alunos do 5 ao 8 anos em teste padronizado de matemática.
Para Oliveira, os problemas educacionais em São Paulo têm forte componente estrutural. E, já na largada, há três anos, a política de bônus foi recebida com antipatia pelos professores, que se sentiram “acusados” pelo fraco desempenho dos alunos.
– O bônus cria uma atitude de desresponsabilização do gestor público e cria uma cultura de discussão da culpa, que também acontece do lado dos sindicatos dos professores, que culpam os pais dos alunos e o sistema – completou Oliveira.
Procurada, Secretaria de Educação não comenta
A Secretaria de Educação de São Paulo não atendeu aos pedidos do GLOBO por dados, entrevista e esclarecimentos. Na nota à imprensa divulgada no mês passado, o secretário de Educação reconheceu que é preciso fazer mais pela valorização do professor. “Não há como dissociar essa variação negativa do Saresp de 2009 e 2010 da necessidade de mais professores efetivos na rede estadual”, disse o secretário Herman Voorwald, que conta com a simpatia do Ministério da Educação.
“Não há educação de qualidade sem professor motivado e preparado. Nossa prioridade é valorizar o professor e ganhar o seu compromisso com a qualidade da educação”, completou Voorwald, sinalizando mudanças na nova gestão tucana, que sempre enfrentou oposição do sindicato dos professores da rede estadual, ligado ao PT. Os professores querem aumento linear e mais investimentos.
De acordo com Oliveira, porém, a falha de um modelo de bonificação não inviabiliza o conceito. Além de faltar o engajamento da categoria, o professor considera que as notas dos alunos em duas matérias é uma medida “simplista” que pode até gerar um efeito negativo, como o direcionamento do ensino.
– O movimento de integração dos professores passa também por medidas duras contra a negligência extrema e o absenteísmo sistemático. Quando se bonifica o professor que vai bem, precisamos perguntar que culpa tem a criança de estar na sala do professor que vai mal? Além do desempenho do aluno, podemos considerar outros itens, como o engajamento do professor na instituição e sua própria proficiência na matéria – completou Oliveira