Brasília – A presidenta Dilma Rousseff prometeu para o segundo semestre o lançamento do programa que pretende levar 75 mil estudantes brasileiros ao exterior com bolsas de mestrado, doutorado e graduação. Diante desse cenário de expansão da internacionalização do ensino superior, o Conselho Nacional de Educação (CNE) começa a discutir a revisão das regras para revalidação de diplomas estrangeiros no Brasil. Hoje, o processo é burocrático e longo e, muitas vezes, quem retorna ao país depois de uma temporada de estudos no exterior não consegue ter o documento reconhecido, o que dificulta a atuação profissional em algumas áreas.
Atualmente o processo ocorre de forma descentralizada: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) determina que cabe às universidades públicas a tarefa de validar os diplomas obtidos em instituição estrangeira, seja de graduação, mestrado ou doutorado. Cada uma delas estabelece critérios próprios que podem incluir análise do currículo, prova ou mesmo a exigência de que o aluno curse disciplinas extras no Brasil. Em alguns casos, o estudante dá entrada no processo em mais de uma instituição para aumentar a chance de obter o diploma.
De acordo com o professor Paulo Barone, membro da Câmara de Educação Superior do CNE, as discussões ainda estão no começo, mas há o entendimento de que a revisão dessas regras é necessária. “Por um lado há uma necessidade de pautar o processo por critérios de qualidade, por outro, uma dispersão de atividades, com critérios e concepções completamente diferentes dentro das instituições, o que torna o processo de revalidação excessivamente ineficaz”, avalia.
Entre as possibilidades que estão em discussão está a de um reconhecimento mais facilitado no caso de estudantes que vão ao exterior com bolsas cedidas por órgãos do governo como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ou a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), já que, nesses casos, a qualidade do curso e das instituições estrangeiras já foi certificada para a concessão da bolsa. Há ainda a possibilidade de criar critérios comuns ou diretrizes gerais para que não haja tanta discrepância nos processos. Barone aponta que será necessário convocar todos os organismos e as instituições envolvidas no processo para articular a mudança.
“Hoje esse serviço é quase personalizado porque cada instituição tem sua regra e cada departamento dentro dela tem as suas. Se houvesse uma orientação geral, preservando a lógica da autonomia universitária, o processo poderia ser melhorado”, avalia Edward Brasil, reitor da Universidade Federal do Goiás (UFG) que acaba de cumprir seu mandato como presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
Além de demorado, os trâmites podem pesar no bolso do estudante. Em geral, as universidades cobram uma taxa administrativa para custear o processo. Não existe um valor pré-estabelecido: na Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, é cobrado R$ 1.530, já na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) a taxa é R$ 315 no caso da pós-graduação.
Saulo Chaves, 30 anos, cursou medicina no Instituto Superior de Ciências Médicas de Havana, em Cuba, e, ao retornar ao Brasil, em 2006, se surpreendeu com o processo que teria de enfrentar para poder revalidar o diploma e exercer a profissão no Brasil. Ele calcula que gastou cerca de R$ 4 mil com o pagamento de taxas e viagens para concluir o processo.
Todos os trâmites duraram quase dois anos até que ele foi aprovado em uma prova aplicada pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) para conceder a revalidação. “É muito desagradável. Na época, era permitido fazer a residência médica antes da revalidação e nesse período eu não podia assinar nenhum documento porque não era reconhecido como médico. É muito frustrante, do ponto de vista profissional, não poder exercer [a medicina] vendo a carência do povo por atendimento”, conta.
Hoje, Chaves trabalha no interior da Bahia. Ele foi morador de um acampamento de assentados da reforma agrária e viajou para Cuba com apoio do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O curso de medicina cubano tem o foco no atendimento preventivo comunitário, com princípios semelhantes ao Programa Saúde da Família, do governo brasileiro. Ele ressalta que faltam médicos com esse perfil para trabalhar nas zonas rurais do país e lamenta que o reconhecimento do diploma de brasileiros que estudam em Cuba seja tão difícil. “Quando você coloca tudo em um caldeirão, a questão da qualidade do ensino é um problema e você precisa distinguir a formação recebida. Mas, no caso de Cuba, o sistema [educacional] é muito próximo”, defende.
Edição: Lílian Beraldo