Alunos da escola Canarinho, que vai realizar reuniões com os pais para explicar as mudanças: instituições públicas já se adequaram, mas as particulares começam agora a fazer a transição
A aplicação de uma resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) vai mudar a vida escolar de crianças que fazem aniversário entre 1º de abril e 30 de junho. Pela regra anterior, o aluno ingressava na educação infantil (1ª ano) no ano em que completava 6 anos, desde que fizesse aniversário até 30 de junho. Agora, a data-limite passa a ser 31 de março. Nas escolas particulares, a mudança valerá para o ano letivo de 2012, mas muitos pais ainda não conhecem ou entendem a restrição do limite e se preocupam com a situação dos filhos. A rede pública implementou a nova data já neste ano.
No Distrito Federal, antes da resolução, podiam ser matriculadas no primeiro ano do ensino fundamental as crianças com 6 anos completos ou que completariam a idade até 30 de junho. O problema ocorreu quando o ensino fundamental de nove anos foi instituído. O texto dizia que poderia se matricular o aluno que fizesse 6 anos no início do ano, sem definir uma data. A partir de então, cada governo estadual definiu o próprio limite, interpretando a lei a seu modo. Nesse caso, uma criança que mudasse de estado poderia sair da cidade original no ensino fundamental e ter que voltar para a educação infantil se a data definida pelo novo estado fosse anterior.
Para que os sistemas de ensino pudessem se adaptar às novas regras, foi concedido um prazo de um ano. A lei passa a valer, de fato, a partir de 2012. “A mudança não é de agora. É antiga, já. Quando o texto dizia ‘em início do ano’ e alguns sistemas de ensino interpretaram como primeiro semestre, foi uma interpretação excessivamente larga. Os países que integram o Mercosul já definem 31 de março. Para evitar a confusão, definimos com eles. Mas é claro que toda data de corte sempre traz problemas para quem fica além dela”, explica o presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE), Francisco Cordão.
Motivação
A contadora Patrícia Santos de Albuquerque é uma das mães pegas de surpresa com a mudança. A filha Stella Santos de Albuquerque completa 6 anos em 28 de abril de 2012. Pela regra antiga, poderia entrar no ensino fundamental a partir de 2013. Mas, com a mudança, terá que esperar mais um ano. “Estamos na expectativa de que seja feita uma leitura menos restritiva da lei. A escola particular tem uma perspectiva diferente da escola pública. A Stellinha já tem dois anos de percurso educacional cumprido e a lei tem que ser sensível a esse percurso”, diz Patrícia.
Ela se preocupa com a motivação da filha se não puder prosseguir nos estudos. “A criança nessa idade quer novidades. Os colegas estão indo, mas ela não. Como vou explicar? Não é a idade que deve ser considerada, mas a resposta que a criança dá ao estímulo educacional. É prejuízo de tempo, financeiro, psíquico. Se a escola der a negatória da matrícula, me sinto no direito de em entrar na Justiça e pedir um mandado de segurança.”
Para o presidente da CNE, entretanto, a educação infantil não significa escolarização. “Aos 5 anos a criança tem o direito de ser criança, ir para a escola brincar. É o espaço que ela tem para desenvolvimento social.
A alfabetização começa aos seis”, defende. Com posição diversa, o vice-presidente do Conselho de Educação do DF (CEDF), Nilton Alves Ferreira, acredita que existe um problema em reter as crianças.
“Os alunos matriculados em 2010 têm direito à progressão, independentemente da idade. Eu, particularmente, não concordo, apesar de concordar com a definição da idade. Progredir precocemente pode desencadear um processo de retrocesso pedagógico no futuro”, pondera o educador.
Interpretação
Presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF, Amábile Tacios concorda com a posição de Nilton. “Para o país como um todo, pode ser positivo aumentar o tempo de escola das crianças. A escola tem autonomia e é responsável pelo processo educacional da criança, mas a lei é muito clara: 31 de março é o máximo. Não é opcional, mesmo que alguns pais não entendam”, diz. Ainda assim, ela acredita que a decisão é mais importante tendo em vista a rede pública de ensino. “É questão de política pública padronizar a entrada (dos alunos no ensino fundamental).”
A CEDF soltou uma circular em 20 de maio deste ano para informar as escolas sobre a nova data. Com o intuito de resolver o impasse, algumas instituições criaram estratégias, como as turmas intermediárias da Escola Canarinho. Segundo a diretora, Solange de Azevedo Cianni, vão ser necessárias reuniões com grupos de pais para explicar as mudanças. “Nós reorganizamos nossas turmas. Estamos em processo de mudança e reestruturamos nosso conteúdo programático para as crianças. Vamos precisar de dois anos para nos organizar”, afirma. Os alunos que completarem a idade até a nova data seguem para a próxima turma normalmente. Os outros vão ficar em uma outra turma, com conteúdo diferente do visto no ano anterior. De acordo com a diretora, alguns pais ainda estão assustados. “Em geral, eles não estão sabendo de nada.”
A diretora de Organização do Sistema de Ensino, Raphaella Rosinha Camparino, explica que, no caso da rede pública de ensino, a data já foi usada para a matrícula deste ano. “Só tem uma excepcionalidade: este ano nós matriculamos crianças de 5 anos com dois anos de escola. Mas eu respondi alguns questionamentos da Promotoria de pais que entraram na Justiça porque os filhos fazem aniversário em 1° de abril. Não temos o que fazer, a não ser cumprir a resolução”, afirma.
O que diz a lei
O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva alterou em 2006 a redação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, definindo, pela Lei nº 11.274, “o ensino fundamental obrigatório, com duração de nove anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 anos de idade”. O documento não define até quando o aluno pode completar a idade para se matricular. O Conselho Nacional de Educação (CNE) normatizou o ingresso dos alunos na alfabetização aos 6 anos completos até 31 de março do ano em que for realizada matrícula por meio de parecer aprovado em 7 de julho de 2010 e da resolução publicada em dezembro do mesmo ano. Para que os sistemas de ensino pudessem se adaptar às novas regras, foi concedido o prazo até 2012. O Conselho de Educação do DF publicou resolução em 31 de dezembro do ano passado se adequando à determinação do CNE. Os documentos são de cumprimento obrigatório, e não de caráter orientador. Dessa forma, a escola que matricular um aluno fora da idade vai infringir a lei.