A menos de um mês para o encerramento da sua segunda gestão à frente da Universidade Federal de Alagoas, a reitora Ana Dayse Dorea recebe, desde esta quarta-feira (2), os participantes do III Seminário Internacional e da IV Assembléia Geral do Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras. O evento, que acontece imediatamente após o encerramento de outra grande realização da Ufal – a V Bienal Internacional do Livro de Alagoas – segundo Ana Dayse, fecha “com chave de ouro” as comemorações dos 50 anos da Ufal.
Feliz com o crescimento da universidade onde se formou em Medicina, em 1972; ingressou como professora em, 1973, e foi, democraticamente eleita, por duas vezes (2003/2007 e 2007/2011) para ocupar o cargo de reitora, na entrevista, a seguir, Ana Dayse diz que, a partir de janeiro de 2012, vai descansar um pouco e curtir os netos.Ela fala ainda dos resultados da Bienal, das suas expectativas com relação ao evento internacional que a Ufal sedia, das dificuldades e dos avanços de sua gestão.
Ascom – Qual a avaliação a senhora faz desta quinta edição da Bienal?
Ana Dayse – Eu digo que o sucesso da Bienal se repete mais uma vez, o que é muito bom. Nós estamos muito felizes, porque é uma equipe pequena, a professora Sheila (Sheila Maluf- diretora da Edufal) trabalha com a equipe da Edufal e é um grupo relativamente pequeno para o tamanho do evento, mas que tem contado muito com as parcerias a nível estadual e nacional, no sistema público e privado. Sozinho ninguém faz nada, mas se tivermos uma mobilização, somarmos cérebros e mãos é possível. Nós fazemos um evento com vontade e decisão política. A Bienal conseguiu alcançar sua meta, registrando uma circulação de quase 190 mil pessoas. E, o mais importante: consolidamos a presença das escolas públicas e privadas, registrando a participação de quase 80 mil alunos, de 785 instituições, além de 7.775 pessoas capacitadas em oficinas e palestras ocorridas durante o evento. Para nós, esses números indicam o quanto a Bienal é importante não só do ponto de vista da produção e troca de conhecimentos, mas, sobretudo, para o acesso à cultura e inclusão social num estado com um grande índice de analfabetismo e com 70% da população de baixa renda.
Ascom – Por que, mesmo tendo se consolidado como o grande evento cultural, ainda não há uma inserção prioritária da Bienal no calendário de turismo do estado de Alagoas, assim como ocorre em outros estados, a exemplo do Rio de Janeiro? O que falta?
Ana Dayse – Falta decisão de priorizar a Bienal. A Ufal é a única universidade do país que assumiu a organização de um evento desse porte. O empenho da professora Sheila, é importante que se reconheça, para captação de recursos na iniciativa pública e privada, por meio do excelente instrumento legal, que é a Lei Rouanet, aliado à credibilidade da Ufal, vem possibilitando a continuidade do evento. Mal termina uma Bienal, a próxima já começa a ser planejada. No entanto, é preciso que todos os segmentos façam sua parte para que a Bienal entre no calendário de eventos de Alagoas e possamos mostrar ao mundo outra face do Estado. Sabemos que Alagoas não tem só belezas naturais, que é rica em valores culturais. A Bienal já demonstra que pode ser uma grande porta-voz da cultura alagoana.
Ascom – É bem emblemático que a senhora termine sua gestão quando a universidade comemora 50 anos e ainda mais com ume evento de grande porte como a Bienal?
Eu agradeço sempre a Deus pela oportunidade. Neste momento me sinto privilegiada. Foi uma vida acadêmica, profissional, de uma riqueza enorme, na minha avaliação pessoal. Iniciei como aluna, cresci na universidade com todas as oportunidades que ela me deu. Tive a oportunidade de ser professora e de ser eleita pela comunidade universitária em dois períodos. Tem essa grande coincidência de eu encerrar a gestão em ano de Bienal e tudo isso acontecendo dentro dor jubileu de ouro da universidade. Eu só tenho a agradecer à comunidade acadêmica e à população que entendeu esse projeto.
Ascom – Faltando pouco menos de um mês para a senhora deixar o cargo, ainda há algum compromisso importante na sua agenda de reitora?
Ana Dayse – A Ufal vai ser a sede do III Seminário e Internacional e da IV Assembléia Geral do Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras (no período de 2 a 4 de novembro). Trata-se de um evento importantíssimo que deve reunir cerca de 200 reitores de instituições de ensino superior de Portugal e do Brasil, tendo como tema “Universidade, Universalização e Responsabilidade Social”. Será, portanto, uma oportunidade imensa para estreitar os laços de cooperação entre as universidades participantes desse grupo.
Ascom – Qual a importância desse Grupo para a Ufal?
Ana Dayse – O Grupo Coimbra foi criado há cinco anos, com o objetivo de promover a integração interinstitucional e internacional, mediante programas de intercâmbio para professores e alunos. A Ufal é uma das 50 universidades fundadoras e está engajada com as demais no processo de internacionalização soberana da rede universitária nacional com suas contrapartes estrangeiras. Até porque, num mundo globalizado, discutir a internacionalização do ensino é mais do que necessário.
Ascom – Em termos práticos, o que o engajamento da Ufal no Grupo Coimbra já resultou de positivo para a universidade?
Ana Dayse – Um evento como este abre portas para nós conseguirmos discutir pesquisa e cooperação internacional. Nós temos hoje vários alunos nossos apoiados com bolsa do Governo Federal e instituições parceiras particulares, como banco Santander e a oportunidade de intercâmbio de professores. Esse setor de cooperação internacional vem crescendo bastante. É o reflexo da necessidade da internacionalização.
Ascom – No começo da sua gestão quais eram os grandes desafios da Universidade?
Ana Dayse – O investimento para manter a universidade era mínimo. A Ufal estava sucateada, com poucos professores. Era difícil fazer um projeto de crescimento. Em 2003, no primeiro ano do Governo Lula, os reitores das universidades federais entregaram ao presidente um documento mostrando as dificuldades do sistema e mostrando que se tivesse investimento era possível mudar o quadro da educação superior no Brasil. Em 2004 surge o primeiro momento de expansão das universidades. O Conselho Universitário apoiou a expansão, nós fizemos um projeto para a interiorização. Pesquisamos o Estado inteiro, conhecendo as demandas. A partir de 2004 com o apoio do Ministério da Educação, a universidade vai para o interior, nasce o Campus Arapiraca, c0m Penedo, Palmeira dos Índios, Viçosa, Delmiro Gouveia e fomos crescendo.
Ascom – Com o surgimento do Prouni, algumas críticas foram feitas levantando dúvidas se o governo não estaria deixando de investir nas universidades públicas para investir nas faculdades privadas. Isso chegou a acontecer?
Ana Dayse – Nós, das universidades, por mais que tenhamos crescido nos últimos cinco anos, não daríamos conta de atender a demanda da educação superior no Brasil. Eu acho que, hoje, o Prouni faz a parte dele e a gente faz a nossa. Nesse período, a gente teve bastante recurso para as universidades, mas nós precisamos vencer alguns problemas difíceis da burocracia. Dinheiro tem, mas ainda temos alguns entraves. É preciso que se dê um jeito nisso, se for o caso, mexendo na legislação. Eu acho que o Prouni veio em boa hora e é bom que ele continue. Nós dobramos as vagas da universidade e mesmo assim ainda fica muita gente de fora. É preciso que de oportunidade a quem precisa.
Ascom – Quais são hoje os maiores desafios da interiorização da universidade?
Ana Dayse – Eu acho que nós temos um grande desafio pela frente que é fixar o docente no interior. A maioria dos nossos docentes ainda está em Maceió e viaja para dar aula. Falta lazer, falta cultura, as pessoas não vão pro interior só para trabalhar. Nós temos conversado com as prefeituras, para que elas ajudem com oportunidades e a gente consiga manter o professor na cidade. Nós temos sido exigentes, só contratamos professores com mestrado e doutorado para que o aluno do interior tenha a mesma qualidade de ensino da capital.
Ascom – Qual a importância das parcerias com as intuições privadas para o crescimento da universidade?
Ana Dayse- Nós temos que ter parcerias tanto com o público como com o privado. Nós formamos pesquisadores com qualidade através destas parcerias. Eu sou uma defensora das parcerias. Nós temos convênios com Brasken desde quando ela ainda era Salgema, temos o Laboratório de Computação Científica e Visualização (LCCV), em parceira com a Petrobrás. Pouca gente sabe, mas 60% da cana produzida nesse país sai do Programa de Melhoramento Genético da Cana-de-Açúcar do qual a Ufal faz parte produzindo variedades. Temos também parcerias na área da saúde, nós temos o Hospital Universitário totalmente voltado para o SUS, além das parcerias com universidades do país inteiro. A gente tem priorizado a pesquisa aplicada.
Ascom – No período da sua gestão houve um crescimento de cursos de graduação, de alguns departamentos, mas ainda existem cursos sem programas de pós-graduação sricto sensu, com projetos de mestrado recusados. Qual a avaliação que a senhora faz disso?
Ana Dayse – Na graduação nos tínhamos 45 cursos e fomos para 86. A pós desenvolve a pesquisa. Algumas áreas têm dificuldades ainda. São poucos os projetos que nós temos mandado que não têm sido recomendados, porque nós temos tido uma exigência muito grande com os quadros de professores. Por exigência da universidade, nós só contratamos mestres e doutores. Precisamos fazer muito mais, precisamos criar condições de apoiar esses laboratórios de pesquisa com infraestrutura. Por outro lado, nós temos uma produção de pesquisa elevada, temos grandes projetos e o lado positivo dos professores que são pesquisadores é que eles conseguem captar recursos com seus projetos. O professor doutor precisa ter seu laboratório, seu espaço de pesquisa garantido, mas não dá pra ficar só na pesquisa ou só nos cursos de pós-graduação, é preciso trabalhar a formação desde o começo, na graduação. Isso motiva o alunado.
Ascom – A senhora encerra sua gestão com uma mudança no processo seletivo de entrada na universidade que passa a adotar o Enem a partir desse ano. Qual o futuro disso?
Ana Dayse – O ideal era que não existisse processo seletivo nenhum, que existisse a garantia de quem saiu do ensino médio tivesse sua vaga garantida na universidade, como eu tive a oportunidade de ver em muitos países da Europa, onde sobram vagas nas universidades. Mas o Brasil é um país jovem, ainda não há espaço para você ter um bom desempenho no ensino médio e automaticamente ter acesso à educação superior, então tem que ter uma seleção. Quando eu assumi, nós tínhamos o PSS, antes disso era o vestibular e há um tempo nós vínhamos levantando a possibilidade da utilização do Enem como seleção. Os colégios só estavam preocupados com o PSS, as pessoas saiam do ensino médio sem ler, sem estudar as matérias necessárias, era aquele ensino só para passar no vestibular. Eu acredito que com o Enem isso vai mudar. Não será preciso sair do seu Estado para tentar entrar em uma universidade de outro lugar, será possível, claro, desde que o aluno tenha condições. Essa é uma das grandes vantagens. As cotas continuarão sendo aplicadas. Eu acho que a gente vai passar a enxergar esse processo como uma grande solução.
Ascom – Em alguns dias a senhora estará fazendo a transmissão do cargo para o professor Eurico Lôbo. Quais são os seus planos para depois da entrega do cargo?
Ana Dayse- Eu preciso descansar. Quero ter a mente descansada para curtir os meus netos. Minha neta mais velha é da idade da gestão, ela tem oito anos. Agora é a hora de curti-los!