Atual ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, deve assumir o comando do Ministério da Educação (MEC) ainda neste mês com o desafio de priorizar a educação básica brasileira, que atende a mais de 50 milhões de crianças e jovens e soma 2 milhões de professores da educação infantil ao ensino médio. Essa é a principal expectativa e cobrança de dirigentes, trabalhadores e especialistas do setor ouvidos pelo Valor.
A lista de necessidades na Pasta é extensa: melhoria da gestão do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que apresentou problemas nas últimas três edições; esforço efetivo do MEC para que Estados e municípios cumpram a Lei Nacional do Piso Salarial dos Professores, que motivou 17 greves em redes estaduais em 2011 e novas políticas de formação inicial de docentes, com maior influência do ministério na reformulação dos cursos de pedagogia e licenciaturas. Especialistas destacam também o aumento da participação da Pasta no financiamento da educação básica; maior transparência e rapidez na divulgação dos resultados das avaliações educacionais. Outro desafio do novo ministro será fazer deslanchar o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).
Além disso, o nome de Mercadante é usualmente associado à aceleração das políticas de aplicação da tecnologia no ensino, com distribuição de laptops e tablets para alunos e professores. “Isso com certeza deve ser uma marca positiva de sua gestão”, afirma Cleuza Repulho, presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e titular do ensino em São Bernardo do Campo. “É uma expectativa geral, mas não acho que ele tenha o pensamento simplista de achar que o computador vai resolver o problema da educação brasileira”, complementa Priscila Cruz, diretora executiva do movimento Todos pela Educação.
Embora os desafios elencados sejam encarados no longo prazo, a questão salarial dos professores é uma “bomba-relógio que precisa ser desarmada já”, afirma Roberto Franklin Leão, presidente da Confederação Nacional de Trabalhadores na Educação (CNTE). “O não cumprimento da lei do piso, aprovada em 2008, ainda gera muita tensão. Foram 17 greves nas redes estaduais e dezenas nos sistemas municipais em 2011. É uma pressão com o qual o novo ministro vai ter que lidar já. O MEC precisa se impor mais diante de Estados e municípios para que o piso salarial seja respeitado”, diz Leão. Atualmente o piso salarial dos professores da educação básica brasileira está em R$ 1.187. A CNTE defende R$ 1.932.
Outro desafio de primeira hora é melhorar a gestão do Enem. As falhas recentes na prova são consideradas naturais pelo atual ministro, Fernando Haddad, que considera o exame consolidado dada a adesão de cada vez mais universidades para utilizá-lo como seleção de ingresso. “Mas o Enem continuará tendo problemas se continuar com vários objetivos: de ser uma prova de ingresso para o ensino superior e de avaliação da rede e dos alunos do ensino médio. É preciso escolher um caminho”, opina Priscila Cruz, do Todos pela Educação. Ela acrescenta: “Mas a primeira medida em relação ao Enem deve ser a ampliação do número de edições por ano, só assim para melhorar a logística do exame, é o que se vê em outros países.”
Para Denis Carvalho, diretor executivo da Fundação Lemann, o MEC deveria ampliar seu orçamento destinado à educação básica, tirando o foco do ensino superior, que recebeu mais de 30% dos recursos do ministério no ano passado – uma quantia que supera os R$ 20 bilhões. “Mesmo com o Fundeb, o grosso do financiamento da educação básica fica nas costas de Estados e municípios. Proporcionalmente, a atenção do MEC à educação superior é muito grande. Trata-se de um ciclo que beneficia muito pouca gente”, avalia Carvalho.
Com passagens por governos tucanos nos planos federal e estadual de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro analisa que os principais desafios do sucessor de Haddad estão relacionados ao ensino básico. Para ela, apesar de os Estados e municípios serem os responsáveis pelos ensinos infantil, fundamental e médio, os problema só serão minimizados com a ação do Ministério da Educação. “A orientação do governo federal é extremamente importante. O papel do MEC é fundamental”, diz Maria Helena, que foi secretária-executiva do MEC no governo de Fernando Henrique Cardoso e secretária estadual de Educação na gestão de José Serra.
“O grande desafio será melhorar a educação básica, que é predominantemente pública: 88% dos alunos estão em escola pública”, afirma a ex-secretária. Maria Helena considera que o ensino médio “está muito mal”. “Pouco adianta investir no ensino superior enquanto não enfrentar os problemas de formação e carreira do ensino médio”, diz.
A nomeação de Mercadante para o MEC é tida como certa no governo, mas o ministro ainda é cauteloso ao falar sobre sua provável a mudança de cargo. “Tenho visto todas essas informações na imprensa, mas vamos aguardar a reforma ministerial. E prometo que se isso acontecer – e é possível que aconteça – estarei à disposição e poderemos discutir a Pasta da Educação”, afirmou ontem, ao participar do programa de rádio “Bom Dia, Ministro”. “Essa coisa só vale depois que estiver no Diário Oficial. Quem indica ministro é a presidenta da República”, disse.
À frente do MEC, Mercadante terá visibilidade política para construir sua eventual candidatura ao governo paulista em 2014. O petista disputou para governador em 2006 e 2010. Dentro do partido, outros dois nomes já são cotados para a disputa estadual: o prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. (Colaborou Daniela Martins, de Brasília)