Pesquisas mostram que, mais do que por escolha errada, estudantes largam cursos por dificuldades de rendimento
Combater os altos índices de abandono dos cursos superiores é meta de instituições públicas e privadas. Para evitar que vagas financiadas pelo dinheiro público fiquem ociosas ou faculdades privadas deixem de receber, iniciativas pontuais ganharão apoio do Ministério da Educação, que ao mesmo tempo discute um plano para diminuir os índices de evasão no ensino superior brasileiro.
Independentemente do tipo de universidade, os números são considerados altos pela pasta. Em 2010, último dado do MEC, o índice nas públicas era de 13,2%. Nas privadas, 15,6%.
Uma das medidas, consideradas das mais importantes, é oferecer apoio aos estudantes no início dos cursos. Mais do que simples decepção com a carreira escolhida, a falta de condições – financeiras ou acadêmicas – para acompanhar o ritmo das aulas leva os universitários a desistirem do ensino superior.
“As causas são múltiplas. O importante é não deixar que um aluno pare de estudar por falta de condições. Precisamos ampliar a assistência e também criar programas de monitoria, especialmente no primeiro ano, quando muitos têm dificuldades nas disciplinas básicas”, afirma o ex-secretário de Educação Superior, Luiz Cláudio Costa, que recém assumiu a presidência do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep).
O projeto está em discussão com pró-reitores de universidades públicas e privadas, segundo Costa. A expectativa é que seja concluído até abril e apresentado às instituições até julho. As medidas definidas – como bolsas de assistência e monitorias – começariam a partir do segundo semestre.
Para o pesquisador Roberto Leal Lobo, do Instituto Lobo, as instituições têm de lembrar que se um aluno deixa de estudar é porque está insatisfeito ou com o curso ou com a instituição. Além de apoiar mais os estudantes, ele acredita que elas deveriam dar mais liberdade para que os universitários troquem de curso, por exemplo.
“É preciso fazer com o aluno o que gostaríamos que fizessem com nossos filhos. Acompanhar o aluno no primeiro ano; dar aula de reforço, se preciso, e garantir bom atendimento sempre”, comenta Lobo.
Apoio em disciplinas básicas
Na Universidade de Brasília (UnB), o acordo feito com o MEC para garantir a expansão da instituição pelo Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) incluiu a realização de um estudo minucioso sobre evasão. O pacto estabelecido com o ministério é ousado, como ressalta a diretora de Acompanhamento e Integração Acadêmica, Cláudia Garcia. Até 2017, a taxa de conclusão de cursos tem de chegar a 90%.
Cláudia liderou uma análise cuidadosa dos dados que mostram as causas dos “desligamentos” dos universitários. A repetência em uma mesma disciplina ou a falta de bom rendimento de modo geral foram as maiores responsáveis pela desistência dos alunos que ingressaram nesse período na universidade (cerca de 36% dos casos).
Nos casos dos cursos de Engenharia e licenciaturas, a média supera os 40%. Os altos índices e a percepção das causas levou a diretoria chefiada por Cláudia a montar um modelo de análise curso a curso. Sem a ideia de criar “rankings” internos, eles não foram divulgados, mas devem servir de apoio para medidas específicas.
Ela conta que, no curso de Agronomia, por exemplo, o desempenho em Química foi percebido como determinante. É uma disciplina na qual os alunos são reprovados muitas vezes e é pré-requisito para quase todo o restante da grade curricular. “Será que um candidato tem essa noção quando se inscreve no vestibular? Acredito que não e é o que queremos mudar”, diz.
Falta de informação
João Nascimento Neto, 29 anos, contribuiu, diversas vezes, para que os índices de evasão no País crescessem. Ele não abandonou a ideia de fazer uma faculdade, mas trocou de curso algumas vezes. Ainda na metade do 3º ano do ensino médio, João passou no vestibular da UnB para Relações Internacionais, curso bastante disputado.
“Eu adoro viajar. Tinha feito um teste vocacional que não surtiu nenhum efeito. Apontou que poderia ser um curso de exatas, humanas ou biológicas”, diverte-se. Depois de cinco semestres de curso, ele criou coragem para abandonar a graduação. Na época, já cursava Direito ao mesmo tempo em uma instituição privada.
Na opinião dele, é muito difícil escolher uma profissão tão cedo. “Ninguém está preparado quando sai do ensino médio. A gente escolhe muito cedo e falta orientação sobre cursos e trabalho também”, pondera. Do Direito, João pulou para Jornalismo, também na UnB. Um ano e meio depois, percebeu que o sonho de se tornar jornalista esportivo não iria adiante.
História e Medicina foram os próximos cursos “experimentados” por João, que, no final, voltou para o Direito e se formou em 2009. Os pais, mesmo preocupados com as mudanças, não criaram conflitos com João durante esse período de dúvidas. Ele conta que os processos de transferência entre cursos na UnB eram tão difíceis que ele fazia novo vestibular a cada troca.
A pressa em iniciar um curso superior fizeram com que Pedro Henrique Gonçalves Reis, 31 anos, cursasse odontologia por um ano e meio e criasse um conflito com a mãe para abandonar a carreira. Quando terminou o ensino médio, Pedro sonhava entrar na área da saúde. Medicina e odontologia estavam na mira. A vaga em odontologia veio primeiro.
Quando assistir às aulas ficou insuportável, Pedro avisou a mãe que queria voltar para o cursinho e insistir para ser aprovado em Medicina. “Não foi fácil. Minha mãe queria que eu fizesse cursinho e continuasse o curso. Foi bem difícil começar do zero de novo também, mas adquiri uma maturidade que eu precisava nesse período”, afirma.
Hoje, pediatra no Hospital da Criança José de Alencar em Brasília, Pedro se sente realizado. “Acho que a gente tem de ser persistente e não pensar em curto prazo. Mesmo que demore, é preciso fazer o que a gente gosta”, aconselha.
Índices mais altos
Até pouco tempo atrás, os números eram ainda mais inflados. De acordo Costa, havia duplicação no censo. “Antes, um estudante que trocava de curso era considerado evadido. Agora, a análise é feita por CPF. A evasão não é o que se achava, mas é maior do que deveria ser ”, admite.
O pesquisador ressalta que, no ensino privado, é preciso cuidar para não misturar a quantidade de vagas não-preenchidas todos os semestres com a evasão. “As duas são altas, mas a ociosidade é maior ainda”, diz. Ele acredita que é preciso investir ainda mais em financiamentos estudantis para mudar o cenário.