Fronteiras da ciência

Programa do governo para estudantes brasileiros no exterior é ambicioso e bem-vindo, mas deixa algumas dúvidas importantes

No ano passado, mais de 150 mil chineses aperfeiçoavam-se em universidades americanas. O número de alunos brasileiros, nesse mesmo período, não chegava a 9.000.

Mesmo levando em conta a diferença populacional entre os dois países, a disparidade é flagrante. Para dar outro exemplo, a Coreia do Sul, com menos de 50 milhões de habitantes, encaminhou cerca de 70 mil estudantes para os EUA no período letivo de 2010-2011.

Anunciado como um projeto de iniciativa pessoal da presidente Dilma Rousseff, o programa Ciência sem Fronteiras tem a ambição de corrigir esse quadro em relativamente pouco tempo.

Em quatro anos, pretende multiplicar o número de brasileiros em universidades estrangeiras. Um total de 101 mil bolsas de graduação, pós-graduação e pesquisa será oferecido a brasileiros, em áreas como engenharia, biotecnologia e energias renováveis.

O programa ganhou destaque na recente visita de Dilma Rousseff aos EUA, que incluiu um encontro com autoridades do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), onde acordos de cooperação tecnológica foram assinados.

Há muita distância, todavia, entre as ambições do projeto e a realidade alcançada por enquanto. Nove meses depois de anunciado, o plano teve apenas 3% de suas bolsas concedidas. Outros 11% estavam em fase de seleção.

Em artigo publicado pela revista “Interesse Nacional”, especialistas como Claudio de Moura Castro e Simon Schwartzman enunciaram alguns pontos ainda a esclarecer quanto à viabilização do projeto, cujos méritos reconhecem.

O Ciência sem Fronteiras ainda não definiu, por exemplo, como se dará a seleção dos bolsistas financiados pelas entidades empresariais (26 mil das 101 mil bolsas). Se a experiência brasileira nessa área é bem-sucedida no mundo acadêmico (graças a instituições como Capes e CNPq), há incertezas quanto ao auxílio concedido para alunos em busca de formação técnica e profissional.

O risco de “evasão de cérebros”, asseguram os especialistas, é tradicionalmente pequeno no Brasil, se comparado ao que ocorre em outros países. Todavia, nunca se fez um programa tão amplo para universidades estrangeiras.

Fica no ar a questão de se, ao voltarem, os beneficiários do programa encontrarão um ambiente de pesquisa e de ensino suficientemente favorável para a aplicação de seus conhecimentos.

Apesar de expressivo, com previsão de R$ 3,2 bilhões até 2015, o investimento do Ciência sem Fronteiras é pequeno diante do que seria necessário para dotar as universidades brasileiras de real produtividade e capacidade de inovação. Esse objetivo, muito mais complexo, não será alcançado com a mera distribuição de bolsas