Apesar da gradual entrada do negro no mercado de trabalho e na educação, o caminho para a superação do racismo ainda é longo
A luta pela valorização do povo afro-brasileiro, relembrada nesta quarta-feira, no Dia da Consciência Negra, ainda encontra obstáculos dentro da universidade. Mesmo que as cotas tenham representado um significativo avanço na inserção do negro no ensino superior, especialistas ainda percebem um forte racismo dentro das instituições.
A questão é muito maior que a própria universidade. O preconceito racial está incrustado na sociedade brasileira, por mais velado que esteja. Apesar da gradual entrada do negro no mercado de trabalho e na educação, o caminho para a superação do racismo ainda é longo, acredita a professora e pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Maria José Cordeiro, a Maju.
“O negro não é mais só consumidor, mas gerador. Agora ele está do outro lado. As cotas colocaram negros qualificados no mercado de trabalho”, afirma Maju. Em agosto, celebrando um ano da política de cotas nas universidades e institutos federais, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, afirmou que o Programa Universidade para Todos (Prouni) mudou a história dos negros no ensino superior. “Em 1997, somente 2,2% de negros frequentavam o ensino superior. Atualmente, são mais de 10%. Com o ProUni, de 1,2 milhão de contratos, mais de 630 mil são bolsistas negros”, disse.
O último levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), de 2012, aponta que 35% dos matriculados em cursos de graduação no País são pretos ou pardos, enquanto 62% são brancos – mesmo índice de 2011. O Norte e o Nordeste são as regiões com maior percentual de universitários negros: 63% entre os nortistas e 57% entre os nordestinos. Na região Sul, apenas 10% é preto ou pardo, contra 89% de brancos. Já no Sudeste, 27% dos que frequentam o ensino superior são negros, e no Centro-Oeste, 40%.
Jocélio Teles, professor do departamento de antropologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), ressalta o crescimento da participação de negros em cursos que tradicionalmente formam brancos, como medicina, arquitetura ou administração. Nas graduações em que já havia uma significativa participação de afro-brasileiros o crescimento foi menor.
A entrada do negro em ambientes que foram historicamente de brancos traz também o choque e o preconceito como consequências. “O racismo institucional é muito mais difícil de ser combatido, é inerente ao próprio dia a dia das instituições. Tem muita gente trabalhando junto e isso acaba existindo”, diz Maju.
A pesquisadora do Núcleo de Estudos Negros da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Joana Passos diz que o racismo segue desafiando negros e indígenas. “O racismo não desapareceu da sociedade brasileira, sendo assim, também não desapareceu da universidade”, afirma. Para ela, a estratégia para se superar esse problema é falar sobre o tema e fazer com que as pessoas percebam que ele, junto a questões econômicas e de gênero, estrutura as desigualdades do Brasil. Joana aponta a devida punição, a instituição de programas anti-racismo e a implementação da Lei 10639/03, que obriga o ensino da história e da cultura afro-brasileira na educação básica e ensino superior, como medidas necessárias para um avanço na área.
Pesquisa
Muitos cotistas procuram se integrar a grupos e núcleos de pesquisa para se apropriarem melhor das questões raciais na sociedade brasileira. Mas é preciso que as próprias universidades propiciem isso, afirma a professora. Teles ressalta que é mais comum estudantes negros organizarem eventos e ações pontuais para a conscientização sobre o assunto. De toda forma, não há cobrança de que cotistas se voltem às suas comunidades ou questões étnico-raciais com suas pesquisas. São muitos alunos e bolsas de pesquisa e, naturalmente, não é todo orientador que trabalha com racismo.
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