Na tentativa de contornar o deficit de professores de medicina, os novos cursos previstos no programa federal Mais Médicos aceitarão mais docentes que não fizeram mestrado ou doutorado.
O novo formato de concurso valerá para as universidades federais. Segundo o projeto recém-finalizado pelo governo, esses novos professores farão a pós-graduação ao mesmo tempo em que dão aulas aos alunos da graduação.
O Ministério da Educação afirma que os cursos com esses docentes terão qualidade, pois os professores sem pós-graduação estarão ao lado de outros mais experientes e sob supervisão.
Já o Conselho Federal de Medicina diz que há o risco de esse corpo docente formar médicos “desqualificados”.
O governo Dilma Rousseff (PT) pretende aumentar em 65% o número de vagas em medicina até 2017, sob o argumento de que faltam profissionais formados na área.
Antes dessa expansão, a regra geral nas universidades federais era contratar docentes com mestrado ou doutorado –80% dos professores de medicina possuem hoje uma dessas pós-graduações.
O mestrado e o doutorado visam dar base ao professor para que ele saiba como ensinar e fazer pesquisa.
Ainda não está definida qual será a proporção de docentes com formação em pós-graduação nos novos concursos, mas o próprio Ministério da Educação dá como certo que será menor.
A explicação é que as novas vagas estarão concentradas onde não há cursos de medicina, ou seja, com poucos médicos para lecionar.
E que mesmo antes da expansão já há dificuldade de contratar esses docentes, mesmo em regiões desenvolvidas (cinco dos nove últimos concursos docentes nas federais em São Paulo terminaram sem aprovados).
Secretário de Educação Superior do ministério, Paulo Speller afirma que os cursos começarão com “alguns poucos mestres e doutores”.
Com a formação simultânea dada aos docentes sem pós-graduação, diz o representante do governo, “vai se formando massa docente ao longo do tempo”. Um mestrado dura, em média, dois anos.
A formação desses professores será em instituições de ensino superior próximas que possuam mestrado ou doutorado, por meio de atividades presenciais e a distância.
“Precisamos considerar que esse novo professor é um médico, que talvez continue com suas atividades e ainda precisa lecionar”, diz Speller. Inicialmente haverá centros de formação dos docentes em PE, BA, MA, RS e MG.
Medida visa fixar médicos em regiões carentes, afirma governo
Ao mesmo tempo em que busca aumentar o número de professores universitários, o governo federal visa fixar médicos em regiões carentes.
Essa fixação ocorrerá justamente porque os concursos para docentes das novas vagas de medicina não exigirão títulos de pós-graduação, afirma o Ministério da Educação.
Nesses novos cursos, localizados em áreas carentes, médicos que atuam na região (e que não se formaram mestres ou doutores) poderão entrar como docentes.
Esse médico, além de passar a ser um professor universitário, poderá também fazer uma pós-graduação. Os cursos serão gratuitos ou haverá bolsas federais.
“Você traz médicos da região, que conhecem a região, que têm interesse na docência, e vai fazendo a formação na própria região”, afirmou o secretário da Educação Superior do Ministério da Educação, Paulo Speller.
A fixação de médicos em áreas carentes é o principal objetivo do programa federal Mais Médicos.
Segundo dados do governo, o país tem menos médicos por habitantes do que a Argentina e o Uruguai. E 22 Estados estão abaixo da média brasileira. Amapá, Maranhão, Pará e Piauí têm menos da metade dessa média.
Estão acima do patamar brasileiro apenas São Paulo, Rio, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Distrito Federal.
CRÍTICAS
O Conselho Federal de Medicina discorda de todo o programa do governo federal. Contesta, primeiro, que seja necessário aumentar o número de cursos na área.
A entidade se baseia em estimativas que apontam que o número atual de médicos é suficiente, pois o crescimento populacional no país tem desacelerado nos últimos anos –o que reduz a demanda por médicos.
“A abertura de cursos visa apenas a satisfação dos empresários”, disse Carlos Vidal, vice-presidente do conselho. Parte da expansão será em faculdades privadas.
Especificamente sobre a decisão de aceitar mais professores sem mestrado ou doutorado nas federais, Vidal afirma que a medida acarretará a formação de “médicos desqualificados”.
Ele ressalta que o próprio Ministério da Educação aumenta em suas avaliações a pontuação dos cursos que possuem mais doutores e mestres. “Eles mesmos consideram importantes esses títulos. Por que a lógica não valeria para os novos cursos?”
Para Vidal, “o título de mestre e de doutor é a garantia de que aquele professor sabe lecionar e pesquisar”.
ÁREAS CARENTES
O conselho também vê como ineficaz a estratégia do governo para fixar médicos em regiões carentes.
Uma das principais ações da presidente Dilma Rousseff é abrir cursos nas áreas com poucos profissionais. Também contratou profissionais estrangeiros.
“O que fixará médicos nessas regiões é boa carreira e condições de trabalho”, disse o vice-presidente do conselho.
FÁBIO TAKAHASHI – Folha de São Paulo
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