Desenvolvido no Laboratório de Currículo Funcional do Departamento de Psicologia (Dpsi) da Universidade, o “KitFis” tem como principal característica permitir a construção das figuras simultaneamente à explicação do professor
Pesquisadoras da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) produziram um kit que auxilia estudantes cegos do ensino médio no aprendizado de física, contribuindo para a inclusão escolar desses alunos. O KitFis, um conjunto formado por uma mesa magnética e peças em metal com diversos formatos e tamanhos, possibilita reproduzir em alto relevo algumas ilustrações disponíveis em livros de física ou construídas no quadro pelo professor, de forma que as imagens consigam ser identificadas por meio do tato.
Desenvolvido no Laboratório de Currículo Funcional do Departamento de Psicologia (DPsi) da Universidade pela docente Enicéia Gonçalves Mendes e pela mestra Josiane Pereira Torres, o KitFis tem como principal característica permitir a construção das figuras simultaneamente à explicação do professor, possibilitando aos estudantes com cegueira acompanharem a aula juntamente com os seus colegas. Além disso, por conter um número variado de elementos, ele pode ser aplicado no ensino de vários conteúdos, como formação de imagens em espelho, eletricidade e tópicos da termodinâmica.
A ideia de criar o produto surgiu quando Josiane ainda estava na graduação em física, ao realizar estágio supervisionado com uma aluna de ensino médio cega. Como a disciplina depende muito das representações disponíveis nos materiais didáticos, ela realizou pesquisas para descobrir como torná-las acessíveis à estudante, constatando que geralmente são utilizados recursos de baixa durabilidade, como colagens com barbante. A dificuldade, no entanto, era que, além de ser perecível, esse material demanda uma preparação prévia do professor, que nem sempre dispõe de tempo para isso.
Em seguida foi feita a proposta de elaborar em um mestrado um material que fosse portátil, permitindo a sua incorporação em um contexto de sala de aula; flexível, com a possibilidade de montar e manipular as figuras ao longo da própria aula e durável. “Então foram feitas pesquisas em livros didáticos de física, colecionando várias ilustrações, para determinar quantas peças, quais dimensões e formatos seriam necessários para representar um número grande de ilustrações”, relata Enicéia.
Ao todo, o KitFis conta com 83 peças confeccionadas em aço 1020, entre círculos, triângulos, elipses, arcos, quadrados e retângulos. As imagens devem ser criadas em uma mesa formada por um molde, também em aço 1020, pintado com uma tinta preta própria que aumenta a sua durabilidade, e uma placa de aço inox magnetizada com imãs circulares, o que faz com que as peças sejam atraídas e fixadas mais facilmente sobre mesa. Sua funcionalidade foi avaliada por um estudante cego de ensino médio, convidado a assistir aulas ministradas por três profissionais licenciados em física. As lições foram gravadas em vídeo, tornando possível verificar o manuseio do kit pelos educadores ao longo da explicação, enquanto o aluno informou que conseguiu compreender as ilustrações construídas pelos professores.
Enicéia destaca que o produto desenvolvido favorece as estratégias de aprendizagem ativa na medida em que os próprios alunos podem ir construindo a ilustração ao longo da aula, o que incentiva o engajamento, atenção, permanência na tarefa e acesso ao currículo. “Aprender física é difícil para qualquer um mas, para uma pessoa com deficiência, que não enxerga as ilustrações, fica muito mais difícil ter acesso ao currículo de física se não houver uma adaptação do material pedagógico”, defende.
Atualmente, o estudante cego necessita da ajuda de um professor, tutor ou colega para manusear o KitFis, mas o objetivo é desenvolver novas funcionalidades, como audiodescrição, para que ele possa estudar sozinho. Também há a perspectiva de elaborar peças tridimensionais, ampliando as possibilidades de aplicação do kit, assim como criar em cima desta plataforma materiais didáticos para outras disciplinas, como química e biologia.
Ascom UFSCar