Em meio à crise financeira ocasionada por cortes e contingenciamento de verbas, as universidades públicas têm outro problema para administrar. As vagas ociosas indicam uso aquém da infraestrutura dos cursos. Apesar de parecer um contrassenso quando se olha o número de candidatos por vaga nos processos seletivos, no meio dos semestres, as carteiras das salas de aulas têm perdido ocupantes. Há vagas em aberto até em cursos como medicina. Além de desistências eventuais, algumas mudanças tornam a evasão uma realidade com a qual as universidades precisam lidar.
As causas vão desde o aumento na mobilidade dos estudantes – tanto internamente quanto entre universidades -, devido à implementação do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), passam pelo desinteresse dos estudantes nas áreas escolhidas e vão até a abertura de cursos pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) sem um estudo adequado das demandas. O Estado de Minas identificou ociosidade de vagas Universidade Federal de Viçosa (UFV), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Universidade Federal de Itajubá e na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Desde que o curso de medicina foi implantado na UFV, em 2010, a média é de 25% de vagas ociosas a cada turma, que tem entrada anual. Na avaliação do pró-reitor de Ensino, Frederico Passos, essa é uma realidade que as instituições do interior tem lidado desde quando a UFMG passou a usar o Sisu como porta de entrada dos estudantes. Na UFV são ofertadas 50 vagas no início do ano. “Não é uma questão só de Viçosa, as universidades federais de Minas lidam com essa questão. A mobilidade não tem uma causa única. É difícil avaliar esse impacto, pois ainda temos pouco tempo de Sisu.” A UFJF enfrenta o mesmo problema com a turma de 2015 de medicina. Entraram 90 estudantes, mas 15 mudaram de instituição, o que fará com que haja a necessidade de abertura de edital para o preenchimento dessas vagas.
Natural de Itabuna, na Bahia, o estudante Jonathas Blohem Souza, de 20 anos, se mudou para Juiz de Fora para cursar medicina. E agora deixa a UFJF para iniciar o curso em Belo Horizonte, na UFMG. Para ele, o Sisu cria distorções que deveriam ser evitadas. “Muita gente quer fazer medicina. Quem tem a nota muito alta passa em várias. Alguém que merecia passar não consegue por causa de uma falha do sistema. O governo investe muito no curso de medicina e temos muitas vagas perdidas. Certamente na UFJF teremos carteiras vazias neste semestre”, diz.
O jovem foi aprovado em sete universidades: as federais de Minas, Amapá, Sergipe, Rondônia e Juiz de Fora. Também passou em uma faculdade particular, em Alfenas (Sul do estado), e na Universidade Estadual de Pernambuco. Como a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não foi suficiente para a primeira entrada na UFMG, Jonathas começou o curso em Juiz de Fora. “A estrutura de UFJF é muito boa. Aconselho todos a estudarem lá, mas a UFMG é uma das universidades mais importantes do país e da América Latina”, pondera. Depois de um semestre em Juiz de Fora, o jovem desembarcou esta semana com os pais em BH. “Milhares de pessoas dariam qualquer coisa para estar naquele lugar”, diz ele, se referindo à UFJF. “O sistema é muito errado e poderia ser melhorado com uma medida simples”, avalia.
PROCESSO LENTO
O pró-reitor de Ensino da UFV ressalta que não é possível ocupar essas vagas rapidamente. Assim como ocorreu com Jonathas, muitos estudantes optam pelo curso de medicina na primeira entrada nas universidades do interior. Como a UFMG oferece duas entradas, muitos preferem trocar. Como é possível usar a mesma nota do Enem do ano anterior, eles tentam vaga no segundo semestre. “Isso poderia ser resolvido se as inscrições da primeira e segunda entrada fossem anunciadas no início do ano. Já foi feito dessa forma”, avalia Frederico Passos.
Márcia Maria Cruz /Estado de Minas