Uma das maiores frustrações de quem elabora políticas de educação é a demora para que os resultados comecem a aparecer. Com a presidente Dilma Rousseff não será diferente: a petista deve terminar o mandato sem saber se uma das principais bandeiras da sua gestão –o programa Ciência sem Fronteiras– funcionou para valer.
A ideia era enviar 100 mil estudantes brasileiros de ensino superior, de graduação e de pós, para passar um tempo em universidades estrangeiras. A proposta é que esses estudantes, ao retornarem ao Brasil, consigam trazer um pouco do que aprenderam lá fora entre os melhores e, assim, promovam algumas mudanças. O problema é que os impactos desse tipo de intercâmbio internacional em massa só começam a ser sentidos um tempão depois do retorno desses estudantes.
O programa federal já consumiu mais de R$ 3 bilhões do orçamento público de dois ministérios (de Ciência, Tecnologia e Inovação e de Educação). É muito dinheiro. Hoje, está bem perto das metas: 70 mil brasileiros já foram estudar lá fora e voltaram desde que o programa foi lançado, há quatro anos. Ainda há 30 mil deles no exterior.
De quem participou do CsF, um em cada três bolsistas foi para os Estados Unidos, onde estão as melhores universidades que existem.
Entre as escolas preferidas pelos brasileiros nos EUA estão a Universidade da Califórnia, a Universidade do Estado da Califórnia e a Universidade do Estado de Nova Iorque –instituições que figuram entre as 40 melhores do mundo, de acordo com o último ranking britânico de universidades “THE”. Para se ter uma ideia do que isso significa, a melhor do Brasil, a USP, não está nem entre as 200 melhores do mundo nesse mesmo ranking.
“Esses meninos vão transformar a ciência nacional”, diz a bióloga Helena Nader, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência). Ela é tão entusiasta do programa que acabou criando uma espécie de tradição: desde 2012, a reunião anual da SBPC sempre traz uma sessão especial com relatos de ex-bolsistas do programa federal. Todos animados, cheios de ideia. Sim, dá gosto de ver.
MODELO CHINÊS
O projeto, no entanto, não é exatamente novo: o que o Brasil está fazendo agora é mais ou menos o que a China começou a fazer há alguns anos com o objetivo único de desenvolver o país.
Hoje, um em cada três estudantes estrangeiros nos Estados Unidos, adivinhe, é chinês! São mais de 300 mil chineses circulando agora em universidades de ponta dos EUA. A maioria deles está matriculada em áreas como administração, engenharias e computação –que são justamente algumas das prioridades do programa de intercâmbio brasileiro (para o desgosto e chororô de quem é de Humanas).
Quem está nos EUA, seja pelo CsF ou por outro tipo de apoio, relata uma espécie de mudança de comportamento nas universidades de elite: “A presença de brasileiros nas universidades dos EUA fez com que os americanos tivessem contato com um Brasil que eles desconheciam”, explica Eduardo Rubini, 19, que estuda economia na Universidade de Chicago. “Eles viram que não somos apenas uma república das bananas.”
Sim, a presença de brasileiros “top” em escolas igualmente “top” mundo afora pode estimular a colaboração entre o Brasil e países mais desenvolvidos. Esse é outro resultado do programa bem difícil de mensurar. Coincidência ou não, o número de estudantes dos EUA no Brasil mais do que dobrou de 2003 a 2013, passando de 1.554 para 4.223 –e ainda deve aumentar, se der certo a versão estadunidense do Ciência sem Fronteiras, encabeçado pelo presidente Obama (leia aqui).
Por aqui, no Brasil, há quem diga que corremos o risco de que alguns dos beneficiados pelo intercâmbio acabem ficando em território estrangeiro, fenômeno conhecido como “fuga de cérebros”. Sim, é um risco maior no Brasil do que na China, país ditatorial. Mas, afinal, o que será de um país que não pretende correr riscos?
Sabine Rihght – Folha de S. Paulo