A geração de rejeitos pela exploração do minério de ferro é inevitável, e, em muitas minas, eles são dispostos em barragens, como a do Fundão, em Mariana, e a do Córrego do Feijão, em Brumadinho, cujo rompimento resultou em desastres de grandes proporções socioambientais. Mas já há tecnologias que possibilitam o aproveitamento de 100% desses rejeitos e sua transformação em coprodutos que podem ser aplicados em diversas áreas. Apesar de não implicarem custos elevados, especialistas da UFMG defendem investimentos contínuos em pesquisas interdisciplinares, que possam consolidar o conhecimento nacional sobre essas tecnologias.
Segundo o chefe do Departamento de Engenharia de Minas, Roberto Galèry, a UFMG mantém várias linhas de pesquisa relacionadas ao aproveitamento desses rejeitos e ao monitoramento das barragens. “Não são tecnologias caras, mas que ainda precisam ser mais bem compreendidas, especialmente em relação ao custo-benefício”, argumenta.
Seu colega de Departamento, Evandro Moraes da Gama, também defende financiamento contínuo das pesquisas, para que tecnologias como as desenvolvidas no Laboratório de Geotecnologias e Geomateriais, do Centro de Produção Sustentável da UFMG, em Pedro Leopoldo (MG), “possam integrar o processo de economia circular na área da mineração”. Segundo ele, o conceito de aproveitamento total de rejeitos já é adotado em vários países, como a China, que tem como meta aproveitar 22% de seu volume de rejeito mineral até 2022.
Queima controlada
O laboratório em Pedro Leopoldo conta com um equipamento de ponta, o forno flash para calcinação (queima controlada), que possibilita calcinar microparticulados. Evandro Gama explica que os rejeitos da barragem de lama, quando levados ao forno, passam pelo processo de secagem e calcinação, que separa a areia da pozolana e do pigmento.
Esses coprodutos podem ser empregados na produção de concreto, argamassa, cerâmica, tijolos e blocos, com aproveitamento em obras de infraestrutura e construção civil. Uma casa construída em Pedro Leopoldo demonstra a viabilidade dos materiais.
Outro estudo desenvolvido no laboratório da UFMG em Pedro Leopoldo e liderado pelo professor Gama é a secagem e pelotização a frio do rejeito das barragens. “Esse agregado artificial tem a grande vantagem de não exigir novos investimentos em maquinário, porque pode ser obtido nos mesmos equipamentos utilizados pelas mineradoras na pelotização do minério de ferro”, afirma ele, que também investiga a viabilidade das pelotas na agricultura, para drenagem e enriquecimento do solo.
Em entrevista à TV UFMG, o professor Evandro Moraes da Gama detalha as possibilidades de aplicação dos rejeitos da mineração.
Pesquisador da UFMG mostra possíveis usos para os rejeitos da mineração
Essa linha de investigação, que propõe aproveitamento dos rejeitos com ativação a frio e ainda apresenta a vantagem de não emitir dióxido de carbono, tem participação de pesquisadores das áreas de engenharia, química e do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN).
Roberto Galèry cita outras possibilidades de destinação da lama das barragens, com a metodologia de deposição a seco, que propõe a filtragem e deposição do rejeito para ser compactado, e a tecnologia da pasta mineral, que propõe adensamento de material muito fino, especialmente lama, com drenagem da parte líquida e consequente aumento da estabilidade dos depósitos de rejeitos.
Associação de tecnologias
Barragens de rejeitos construídas com o método de alteamento a montante não chegam a ser condenadas pela Sociedade Internacional de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica, mas exigem controle muito maior, exatamente no que se refere à segurança. “Por isso, esse modelo de barragem já não é mais aceito em países como Canadá e Chile”, exemplifica Roberto Galèry.
Pesquisas desenvolvidas no Departamento de Engenharia de Minas indicam que a associação de tecnologias pode contribuir para aumentar a eficiência do monitoramento das barragens. Segundo Galèry, a chamada medição piezométrica, que controla o nível de água nessas estruturas, deve ser instalada em todo barramento e associada a sistemas de monitoramento de tremores, como o acelerômetro, que possibilita o estudo georreferenciado da barragem e a localização de possível abalo estrutural.
“Esses sistemas deveriam ainda ser ligados a sistemas de radares, contribuindo para a comunicação rápida e direta com os responsáveis pelo monitoramento das barragens”, defende o pesquisador Galèry.