Há mais de uma década, professor da Ufopa estuda e acompanha o crescimento de plantios de castanheiras na região do rio Trombetas, município de Oriximiná (PA).
Quanto tempo uma castanheira leva para dar seus primeiros frutos? Dez, vinte ou cinquenta anos? Qual a melhor área para o plantio? Sombreada ou com muita luz? Qual a altura ideal da muda? Estas e outras perguntas norteiam estudos que vêm sendo realizados, há mais de dez anos, nas unidades de conservação da região do rio Trombetas – Floresta Nacional de Saracá-Taquera (FLONAST) e Reserva Biológica (REBIO) do rio Trombetas, situadas no município de Oriximiná, no noroeste do Pará.
Desde 2007, Ricardo Scoles, professor do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) da Ufopa, pesquisa o plantio, a ecologia e o manejo de castanhais nas unidades de conservação da região. O trabalho envolve tanto o estudo e o monitoramento de plantios experimentais de castanheira em diferentes condições ambientais na FLONAST, quanto a investigação da dinâmica populacional e da regeneração da castanheira nativa nos castanhais da REBIO e seu entorno.
A pesquisa começou durante o doutorado de Scoles no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus, que teve como objetivo avaliar o impacto do extrativismo na regeneração da castanheira. “Durante o doutorado, planejamos uma plantação experimental para ver o desempenho da castanheira jovem em três ambientes diferentes: roçado, capoeira e floresta”, lembra.
Para facilitar o monitoramento, os plantios foram feitos em áreas próximas entre si, dentro da Floresta Nacional de Saracá-Taquera. “É uma área de uso dos quilombolas da comunidade da Tapagem”, explica Scoles. Com o consentimento da comunidade, foram plantadas 48 mudas de castanheiras, com mais de 80 centímetros de altura, em cada ambiente. “Plantamos em roçados abandonados, em uma área de capoeira e em um castanhal próximo, de acesso por igarapé. Com a ajuda da comunidade, também acompanhamos, ano após ano, a plantação nesses três ambientes”.
No plantio, foram utilizadas 144 mudas doadas pelo projeto do Banco de Germoplasma (INPA/MRN), coordenado pelo pesquisador Rogério Gríbel, do INPA, e financiado pela Mineração Rio do Norte (MRN). Situada em Porto Trombetas, a empresa possui um viveiro próprio, com matrizes oriundas de diferentes regiões da Amazônia. As mudas são utilizadas para o reflorestamento de áreas desmatadas pela extração da bauxita. “Utilizamos mudas selecionadas, que vieram de Trombetas, Amapá e Rondônia. As de Trombetas foram as que tiveram um desempenho melhor, seguramente porque estavam mais adaptadas ao clima local”.
Situada no noroeste do estado do Pará, a Floresta Nacional de Saracá-Taquera (FLONAST) possui 441.152 hectares de área. Localizada entre os municípios de Terra Santa, Oriximiná e Faro, na fronteira com o estado do Amazonas, a FLONAST é adjacente à Reserva Biológica do Rio Trombetas. O acesso principal é feito pelo distrito de Porto Trombetas, na margem esquerda do rio Trombetas, e pelos municípios de Faro e Terra Santa, pelo rio Nhamundá.
Resultados – Após uma década de monitoramento das mudas plantadas, o pesquisador observou que a mortalidade foi maior nos ambientes de floresta e de capoeira, respectivamente. Segundo Scoles, na floresta apenas oito mudas sobreviveram em dez anos. “Por ser mais sombreada, é onde tivemos a maior taxa de mortalidade e baixíssimo desempenho. As árvores são muito baixas e ainda não chegaram na parte alta da floresta”, explica. Na capoeira, o desempenho das mudas vem aumentando nos últimos anos, devido ao manejo e limpeza das plantas, reduzindo assim a concorrência com outras espécies.
Já no ambiente de roçado, em virtude da alta luminosidade da área, as mudas apresentaram baixa taxa de mortalidade e um excelente desempenho, com crescimento de 1,50 metros de altura por ano. “A castanheira é uma espécie que, quando jovem, apresenta comportamento heliófito, ou seja, que responde bem à luz do sol, com alto desempenho. Por isso, após dez anos, já observamos, nas áreas de roçado, florações em algumas mudas, que já são árvores, e frutificação”, comemora Scoles.
“Esse plantio experimental dá algumas leituras interessantes. Primeiramente, que as mudas apresentam um desempenho maior quando tem luz. Por isso, a castanheira é uma planta que pode ser usada para a restauração de áreas degradadas, porque responde bem a uma situação de alta luminosidade, apresentando bom desempenho”, explica o pesquisador.
Segundo Scoles, outras pesquisas também apontam que a castanheira é uma espécie com estreita relação com humanos, porque é uma planta que se beneficia de pequenas perturbações, como clareiras e aberturas, que os humanos, historicamente, sempre fizeram para plantar ou manejar a floresta. “O ser humano também pode dispersar as sementes que coleta. São dispersores involuntários, que podem promover a proliferação de castanheiras em áreas abertas e longe da planta-mãe”, explica.
Esses fatores, aliados ao caráter heliófito da castanheira, pode ajudar a entender por que, em áreas próximas das comunidades tradicionais, os castanhais são mais jovens ou mais adensados do que em áreas mais afastadas, pois haveria uma influência humana na distribuição e na ocorrência das castanheiras. “Isso poderia explicar o surgimento de florestas com predomínio de castanheiras em áreas com histórico de uso por parte de comunidades tradicionais ou povos da floresta. Em alguns casos, pode haver uma correlação espacial entre áreas com histórico de uso por parte de comunidades tradicionais e indígenas em castanhais”.
Plantio – Segundo o pesquisador, nas áreas abertas de roçado, cerca de 90% das mudas sobreviveram. “Dos quatro roçados onde realizamos o plantio experimental, dois já produziram frutos. Os outros ainda não apresentaram frutos porque foram queimados, mais de uma vez, por imprudência de um morador que tinha um roçado próximo. Mesmo assim, essas plantas tiveram um bom desempenho, melhor do que as plantadas em áreas da capoeira e da floresta”, afirma. “Essas mudas que queimaram rebrotaram com força e sobreviveram. Estariam com um desempenho muito alto se não tivessem sido queimadas. Mesmo assim, estão altas, com mais de dez metros de altura, mas como foram queimadas várias vezes ainda não produziram frutos”, explica.
Segundo Scoles, quando a castanheira é cortada ou queimada, ela rebrota com diferentes caules, formando uma touceira. “Há um rebrotamento, mas não com um único caule, e nós associamos isso ao fogo”, explica. “Quando a gente vê castanhais próximos a comunidades, com três ou quatro caules, ou bifurcações, supomos que provavelmente são castanheiras que sofreram algum episódio de fogo”.
Outro resultado apontado pelo estudo indica que a sobrevivência das mudas é maior quando elas são plantadas com mais de 80 centímetros de altura; quando ainda não possuem altura maior do que essa, a semente é atrativa aos roedores e outros mamíferos. “Na área de floresta temos muitas dificuldades de encontrar plântulas e há uma alta mortalidade de regenerantes no primeiro ano de vida, provavelmente porque essas mudas pequenas são atacadas pelos animais que gostam da castanha. Eles acabam roendo a castanha, que é o reservatório nutricional no primeiro ano de vida da planta. Por isso, recomendamos o plantio de mudas mais altas, com 80 a 120 centímetros, para assegurar que a semente já foi lignificada ou absorvida”.
No plantio experimental, o distanciamento entre as mudas foi de dez metros, mas pode-se fazer de até 20 metros de distância uma da outra, segundo o pesquisador. “Se você prever, nessa plantação, uma outra árvore ou frutífera, consorciada com as castanheiras que dão muita sombra, você pode plantar entre elas o cacau, o cupuaçu e o café, plantas que também são produtivas e que gostam de sombra. Isso pode ser feito nos sistemas agroflorestais”. Segundo Scoles, a castanheira cresce melhor em solo argiloso, mas também são encontradas em solos arenosos, porque são plantas rústicas, que aguentam bem solos pobres e ácidos.
Outros desafios – Com relação ao plantio experimental na comunidade de Tapagem, o desafio agora é confirmar a produção das castanheiras jovens, principalmente na capoeira, que é o segundo ambiente com melhor desempenho. “Pretendemos também continuar a pesquisa nos castanhais, para ver o que acontece com as mudas que sobreviveram em áreas de florestas. Se elas vão manter a mesma altura ou vão desenvolver mais, quem sabe, depois de uma abertura natural de clareira”.
Atualmente a pesquisa em Oriximiná conta com a participação dos cientistas Rogério Gríbel Neto, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), e Susan Aragón, pós-doutora do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da Amazônia (PPGRNA) da Ufopa, que está estudando a relação de espaçamento e plantio de castanheiras em áreas de terra-preta. O projeto tem a parceria do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e financiamento do Programa de Áreas Protegidas (ARPA) da Fundação Brasileira da Biodiversidade (FUNBIO), da Fundação Amazônica Defesa da Biosfera (FDB) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
“Também comparamos atividades de castanhais em diferentes regiões, próximas e afastadas das comunidades no lago Sapucá, já com alunos de pós-graduação. De fato, após dez anos, nós voltamos aos castanhais que tínhamos ido anteriormente, para observar a mortalidade e o crescimento das árvores adultas, dos castanhais que foram inventariados há nove anos atrás”, conta.
Na FLONAST, o pesquisador orienta também uma dissertação de mestrado no âmbito do PPGRNA, que será defendida, ainda este ano, pelo mestrando Nicolas Zaslavsky de Lima. A pesquisa, que conta com o apoio do ICMBio, por meio da FUNBIO e CNPq, tem como foco o plantio experimental de 400 mudas de castanheiras, de pequeno porte (12 centímetros), em áreas de mata fechada e de clareiras resultantes da extração de madeira, nas proximidades da base de Patauá.
“O objetivo deste trabalho foi analisar o crescimento e sobrevivência de plântulas de castanheira de recente germinação em condições similares ao ambiente natural com diferentes disponibilidades de luz e de susceptibilidade à predação”, explica Nicolas Zaslavsky. Segundo o mestrando, até o momento, as plântulas de castanheira do plantio de Patauá apresentam bom desempenho e alta sobrevivência, confirmando que a espécie tem grande potencial para utilização em áreas de restauração e enriquecimento florestal.
“Além de avaliar a sobrevivência e o desempenho dessas mudas em áreas de clareira e em áreas mais fechadas, vamos poder entender também o que acontece na pós-germinação. Fazer uma plantação experimental com mudas pequenas, recém-germinadas, é muito interessante para avaliar a mortalidade e desempenho da castanheira quando é muito nova”, afirma Scoles.
Além das pesquisas realizadas em Oriximiná, o pesquisador da Ufopa também está acompanhando o plantio experimental de castanheiras no município de Canaã dos Carajás. A pesquisa, em parceria com o ICMBio, é parte da dissertação de mestrado de Rayana Gondin, do PPGRNA, que visa estabelecer o melhor preparo do solo para o plantio de mudas de castanheiras em áreas degradadas de pastagens. “São solos compactados, bastante degradados, com o agravante de seca prolongada durante o verão. Como essa região tem uma estação de seca bem definida, de três a quatro meses, a pesquisa pretende analisar o comportamento das mudas em diferentes tratamentos do solo durante o plantio”, explica Scoles.