Em entrevista ao Jornal O Globo, o presidente da Andifes, reitor Reinaldo Centoducatte (UFES), falou sobre o anúncio de bloqueio de recursos em três universidades federais. Confira a entrevista na íntegra:
RIO- O presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Reinaldo Centoducatte, que também é reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), disse que a entidade, representante oficial das universidades federais na interlocução com o governo federal, as associações de professores, funcionários e estudantes, foi pega de surpresa com a decisão do Ministério da Educação (MEC) de “punir financeiramente as instituições por ‘balbúrdia’ e baixo desempenho acadêmico.” A informação de que 30% da dotação orçamentária da UFF, UnB e UFBA já teriam sido bloqueadas foi dada pelo ministro da Educação, Abraham Weintreaub, em entrevista publicada na edição desta terça-feira de “O Estado de S.Paulo”. Em conversa com O GLOBO, Centoducatte questiona os critérios usados pelo MEC para determinar cortes que podem afetar recursos básicos das universidades, como luz e água.
Vocês foram informados pelo MEC sobre o corte?
Só soubemos pela imprensa. Temos um orçamento aprovado pelo Congresso, que inclui despesas obrigatórias e discricionárias.Até agora, das despesas se custeio só foram liberadas 40% do limite e das verbas de capital, 10%. Tivemos a informação do bloqueio de recursos de emenda parlamentar. Estamos solicitando a liberação de mais limite e também conversaremos sobre a liberação das emendas dos parlamentares. Essa é a informação que tínhamos até agora e com o que estamos trabalhando.
Mas então já não eram esperados cortes?
A surpresa é a possibilidade de bloqueios fora de um critério que abranja todas universidades. Até então, quando as universidades tinham contingenciamentos eles eram feitos dentro de determinados critérios que atingiam, ou não, todas as universidades simultaneamente. É estranho o anúncio de hoje. Aliás, ainda não recebemos posicionamento oficial por parte do MEC.
Você encara esse corte como algum tipo de perseguição às universidades?
As universidades não realizam qualquer tipo de ação contra ou a favor de qualquer posição política ou ideológica. São um espaço que permite a livre manifestação, então grupos podem realizar atividades a favor ou contra, inclusive das próprias administrações e políticas internas. Jamais proibimos qualquer tipo de manifestação. É preciso entender que existe isso dentro da sociedade, estamos em uma sociedade democrática e o direito de se manifestar é garantido constitucionalmente. Se há uma relativização sobre o direito de se manifestar dentro das universidades, é preciso verificar se essa vai ser a tática a ser adotada, porque isso fere o entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal (STF).
É possível se adaptar a esses cortes?
Vamos ter de ponderar com o MEC que não temos como sustentar qualquer tipo de corte. Já vivemos um revés orçamentário há anos e em um sistema em expansão. Qualquer corte extra, como o anunciado pela imprensa hoje, irá afetar o funcionamento das nossas instituições. E se a justificativa incluir baixa produtividade, isso tem que ser explicado. Onde baixou a qualidade da instituição? Em que sentido? Queremos servir a sociedade brasileira. É impensável desprezar ou desconsiderar o papel das universidades federais em qualquer projeto de desenvolvimento para o nosso país. Não existe como. Há pouco tivemos, por exemplo, manifestações do governo federal questionando a quantidade e qualidade da produção científica das federais. Nos produzimos mais de 95% da Ciência, está comprovado, a própria Capes mostra que são as universidades públicas que fazem Ciência nesse país. Se determinada universidade baixou sua qualidade, temos de analisar, é fato? Aparentemente, não. As universidades citadas pelo ministro, de acordo com a imprensa, estão todas bem posicionadas nos rankings, inclusive internacionais, mostra que têm sim qualidade. Então, qual a justificativa? E, de qualquer modo, se ela tivesse sido detectada, seria a punição orçamentária a melhor maneira de se resolver a questão, sem mergulhar nas causas? Não estaríamos aprofundando o problema com esta medida?
Mas, na prática, se os cortes forem inevitáveis, como afetarão a vida dos estudantes?
Vai gerar déficit orçamentário e atividades do próximo ano serão suprimidas. Também temos que pagar pela limpeza, energia, vigilância, conta de telefone. Há um consumo que as universidades têm que arcar, hoje as terceirizações elevam o custeio. É importante frisar que as universidades federais não têm deixado de crescer mesmo com a restrição orçamentária atual. Inclusive com ofertas de novos cursos, ampliação de vagas, melhoria de instalações, equipamentos, laboratórios. Tudo isso tem um custo.