Protótipo criado na UFSC pode ser utilizado diretamente na indústria e propõe a redução do consumo de combustíveis fósseis.
Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis, uma estrutura com uma área total de espelhos de 54m² e um absorvedor de 12 metros de comprimento e uma altura estimada de 5 metros da base se destaca entre os centros de estudo e pesquisa. Trata-se de um protótipo de um Concentrador Solar do tipo Fresnel Linear (CFL), que parte do esforço para produzir vapor utilizando a energia térmica do sol. O sistema pode ser utilizado tanto para geração de energia elétrica, quanto vapor para processos industriais.
A pesquisa, coordenada pelo professor Júlio César Passos, do Departamento de Engenharia Mecânica, está em andamento na universidade desde 2014 e propõe a redução do consumo de combustíveis fósseis, como o petróleo, o gás natural e o carvão. Um dos desafios encarados é desenvolver um concentrador com tecnologia nacional e de baixo custo, que pode ser utilizado em indústrias da área têxtil, alimentos e celulose.
No Brasil, a bancada do CFL da UFSC é uma das únicas em operação. Há outros concentradores solares do tipo funcionando no exterior, como na Espanha e na França.
Como funciona
Segundo um dos pesquisadores do protótipo Alexandre Bittencourt de Sá, doutor em Engenharia Mecânica, as fileiras de espelho operam de forma automatizada, acompanhando a movimentação do sol de modo a refletir radiação concentrada em um absorvedor, localizado acima dos espelhos.
“Isso é feito concentrando a radiação solar em tubos que vão esquentar a água e gerar vapor. Este tipo de tecnologia é chamado de geração direta de vapor. A radiação concentrada permite atingir temperaturas mais elevadas, assim como quando se utiliza uma lupa para colocar fogo em um papel”, explica.
O sistema é projetado para atingir temperaturas de vapor saturado de até 230°C. “Essa abordagem da energia solar tem grande aplicabilidade para geração de calor para processos industriais, tais como secagem, destilação e cozimento. Ao invés de queimar um combustível fóssil, nós estamos utilizando a energia térmica do sol para gerar vapor”, afirma.
Um dos destaques do protótipo foi a tecnologia de prensas desenvolvida para curvar levemente os espelhos, permitindo uma maior concentração no absorvedor. Para tanto se utilizou peças chamadas de “espinhas de peixe”, feitas de chapas de aço galvanizado cortadas a laser.
“O sistema de fixação foi capaz de gerar curvaturas satisfatórias e mantidas há quase dois anos com espelhos expostos às intempéries, entretanto a montagem dos espelhos através dele ainda é muito artesanal e trabalhosa. Isto não se apresentou grande problema para o caso de um módulo de CFL para teste, entretanto este sistema de fixação e curvatura necessitará de melhorias para expandir sua aplicação para a indústria”, destaca o pesquisador Victor César Pigozzo Filho, doutor em Engenharia Mecânica.
Riscos para os pássaros
Diferentemente de outras tecnologias de concentração utilizando os raios de sol como a torre solar, que mantém a radiação em um ponto, no alto de uma torre (com alturas em torno de 200 metros), os concentradores de calhas parabólicas e os Fresnel lineares são de concentração linear, com absorvedores em alturas menores, de até 30 metros.
“A concentração linear significa concentram a radiação ao longo de uma linha comprida, o que faz com que eles apresentem uma menor taxa de concentração de radiação, atingindo temperaturas mais reduzidas. As torres solares entretanto, são mais caras de fabricar e podem apresentar problemas ambientais como a morte de pássaros que são atraídos pelo grande brilho em seu topo, e ao passar pela radiação concentrada são incinerados”, explica Bittencourt de Sá.
Meio ambiente e indústrias
Para o pesquisador Bittencourt de Sá, o maior impacto ambiental desse tipo de tecnologia está na quantidade de água utilizada para lavar os espelhos, na produção dos tubos e nos materiais utilizados na construção do concentrador e equipamentos.
Embora a contribuição do CFL para o setor industrial nacional ainda seja pequena se comparada como cenário internacional, já que atualmente a maior parte dos processos utiliza óleos térmicos, a pesquisa indica uma expectativa de maior viabilidade nos próximos anos, principalmente no setor industrial que visa conciliar desenvolvimento econômico e preservação do meio ambiente.
Entre as indústrias catarinenses que podem ser beneficiadas com esse tipo de tecnologia desenvolvida na UFSC estão a têxtil, no Vale do Itajaí, e de alimentos, concentrada no Oeste catarinense.
“Cada vez mais a indústria busca o uso de tecnologias mais limpas e menos poluentes como soluções sustentáveis de captação de energia. Em Santa Catarina, existe uma preocupação que privilegie o uso de iniciativas que tenham eficácia e também levam em consideração às necessidades envolvendo até mesmo o posicionamento geográfico das indústrias por causa da importância do sol no processo”, disse o presidente da Câmara de Assuntos de Energia da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), Otmar Müller.