Existem diversos equipamentos que monitoram e avaliam a qualidade do ar em regiões urbanas. Agora a novidade é a utilização de passarinhos como ferramenta nesse tipo de análise. É o caso da pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), câmpus Rondonópolis, intitulada “As consequências da falta de planejamento de transporte no Brasil estão escritas no sangue de pardais”, publicada na revista britânica “Urban Geography”.
Com base na metodologia proposta pelo professor José Ignacio Aguirre, da Universidade Complutense de Madrid, o estudo, desenvolvido pelo estudante do Programa de Pós-graduação em Geografia Deleon da Silva Leandro, detectou que regiões da cidade de Rondonópolis são mais afetadas pela poluição, a partir da coleta de sangue dos pardais. A pesquisa contou com a participação dos professores Fabio Angeoletto, da UFMT, e Mark Fellowes, da Universidade de Reading, da Inglaterra.
Ao todo, foram analisadas cerca de 240 aves em três pontos extremos: zonas mais industrializadas da cidade, localidades com intenso fluxo de veículos e em lugares com baixa atividade industrial.
Como os pardais não costumam voar tão longe, foi possível observar os impactos pontuais da poluição urbana e, assim, desenvolver um diagnóstico em conjunto com as autoridades locais competentes. A metodologia, contudo, não é capaz de substituir as tradicionais estações de monitoramento atmosférico, mas pode ser empregada como um complemento.
Em comparação com outras técnicas de análise da qualidade do ar, esta tem a vantagem de ter um baixo custo financeiro. As facilidades, no entanto, vão além do bolso. O treinamento para aprender esse método também é simples para os profissionais da área e pode ser realizado em um curto período de tempo. “Várias pessoas de ciências naturais podem realizá-lo. Inclusive fazer diagnósticos com os resultados”, detalhou o estudante.
Como funciona
Depois de capturar os animais com uma rede, é realizado o processo de triagem, na qual as aves são separadas conforme sua saúde. Caso o animal esteja doente ou em gestação, não poderá ser usado no estudo. Feito isso, o sangue é coletado e a ave é liberada de volta à natureza. Com as amostras, analisa-se em laboratório a relação de algumas moléculas importantes, como hemoglobina e heterófilos, dois glóbulos que, respectivamente, atuam no transporte de oxigênio e nas células de defesa.
“Os pardais capturados no bairro Vila Salmen, uma área urbana de extrema pobreza ao longo da rodovia BR-364, tinham em média 24% mais hemoglobina e quase 50% mais heterófilos do que as aves capturadas no ponto de controle”, afirmou o professor Fabio, indicando que essas mudanças fisiológicas são indicadores claros de poluição do ar, porque a hemoglobina também se liga quimicamente ao CO2 (Dióxido de carbono), perdendo sua capacidade de transportar oxigênio pelo organismo do pardal.
Assim que as amostras do laboratório ficam prontas, o próximo passo é correlacionar os resultados com o lugar onde o passarinho foi capturado e comprovar o impacto da poluição naquela região. “Nosso estudo demonstra que a poluição atmosférica não se limita a megalópoles como São Paulo”, esclarece Fabio.
Com isso, não são apenas os pardais que são afetados. A saúde de toda a população também fica em alerta. “Evidentemente a poluição do ar não afeta apenas os pardais, mas também tem efeitos deletérios na flora, nas pessoas e nas espécies de animais silvestres que habitam ou se deslocam pela área urbana do município”, concluiu ele.